ou a necessidade faz
o sapo pular
Por Flávia Hargreaves
Sobre o provérbio do sapo, a questão é que quando colocado na água
fervente ele pula, porém se o colocarmos na água na temperatura ambiente e
começarmos a esquentá-la lentamente, ele se acomoda, fica estático e morre
inchado, fervido e feliz.
Muito bem, sou movida por incômodos, para o bem ou para o mal, “é o que
é” (1). No dia 22 de abril foi o Dia do Arteterapeuta e foi uma profusão de
posts nas redes sociais. Que maravilha!!!! Tudo muito bom a não ser pelo fato
dos posts serem predominantemente, citações de Jung. Belas citações, profundas,
poéticas, belas imagens, mas a pergunta que não quer calar: “Será que a
Arteterapia não tem nada a dizer?” Eis o meu incômodo, agora, confesso.
Pois bem, como não sou de me dar por vencida, estou buscando respostas. Encontrei
algumas respostas, mas o Rio de Janeiro parece uníssono na abordagem junguiana
da Arteterapia e não estou convencida de que seja o único caminho, embora
tenhamos notícias de diálogos tímidos com a Gestalt e TCC. Então sigo buscando
e acredito, talvez até junguianamente, que quando você está verdadeiramente
interessado em algo, os encontros acontecem.
Por isso, hoje não falarei de desencontros mas de encontros, mais
especificamente, de UM encontro. No feriado de Corpus Cristi (26/05/16) fui
recebida por Tania Netto, arteterapeuta e pós-doutora em
Neurociência, em um delicioso café-da-manhã, quando tivemos oportunidade de
conversar sobre os fundamentos da Arteterapia e suas diversas abordagens
desenvolvidas nos EUA. ARTETERAPIA como ARTETERAPIA em seu próprio território.
Sobre a história da nossa profissão, um nome já citado neste blog (2):
Margaret Naumurg, cuja pesquisa criou as bases da Arteterapia nos EUA, se
destacou na nossa conversa. Sobre a nossa prática e suas diversas abordagens destacaram-se
2 livros: Approaches to Art Therapy (1987,
rev. 2001) de Judith Aron Rubin e
Handbook of Art Therapy de Cathy A Malchiodi.
Pois bem, saio deste encontro com 13 edições do ART THERAPY: JOURNAL OF THE AMERICAN THERAPY ASSOCIATION para estudar e compartilhar com vocês
minhas novas descobertas, e ... livros encomendados, porque não existem no
Brasil e isto me parece dramático. Fica a dica pra quem vai viajar!!!!
Primeira Leitura
Ou o meu primeiro desafio, já que até aqui eu achava que não lia inglês,
e de novo o provérbio: “a necessidade faz o sapo pular”.
O artigo escolhido foi sobre a produção de imagens abstratas e seus
significados na Arteterapia: Abstract Imagery in
Art Therapy: What does it mean? Michael J. Hanes, 1998.
Gostaria de destacar
algumas questões que ele coloca (há quase 20 anos), e que não são o tema
principal do artigo mas que fazem eco com minhas considerações sobre a prática
da Arteterapia.
1) Sobre o método: os
participantes do grupo são introduzidos ao espaço do ateliê e orientados sobre os
materiais disponíveis. A abordagem utilizada foi não-diretiva, onde o
participante tem acesso à múltiplos materiais artísticos e são encorajados a
usá-los, experimentá-los de acordo com o seu desejo e necessidade.
2) Sobre o processo:
Em suas apresentações de caso, o autor descreve as etapas da produção das
imagens analisadas. Qual o material, quais os primeiros traços, a ordem e o
modo como as cores são adicionadas, etc., além do estado do cliente, o que
demonstra o olhar atento do arteterapeuta ao processo de construção da imagem.
Temos discutido estes
dois tópicos com frequência no blog e em nossas palestras e aulas. Os nossos
temas seriam o “ateliê de livre expressão e experimentação dos materiais” e
“expressão espontânea” buscando uma prática da Arteterapia não-diretiva; e a
discussão sobre a importância do
processo de construção da imagem, não a leitura da imagem final, mas
considerando todo o processo como imagem e sendo decisivo na compreensão da
mesma.
Sobre o foco do artigo, o significado das imagens abstratas e os fatores
que influenciam a escolha por esta expressão, o autor coloca que existem vários
fatores que ocorrem simultaneamente. Um deles seria “a insegurança com relação às práticas artísticas e o medo de críticas e
frustração, sentindo-se menos ameaçados pelas imagens abstratas que não
pretendem fazer referência visual aos objetos do ambiente, os protegendo de um
julgamento em termos de representação realista.” Outro fator seria trazer
conteúdos inconscientes ainda difíceis de lidar mas que necessitam ser vistos e
trabalhados. “[...] suas linhas, formas e cores ambíguas inicialmente sem nome
representam seu próprio sentido de incerteza e obscuridade” (HANES, 1998, p.
189, tradução livre da autora).
O autor enfatiza que
somente o cliente poderá decifrar suas imagens e alerta que: “Se o cliente não
estiver preparado para reconhecer o significado escondido, a imagem pode ser
guardada em segurança e reexaminada em outro momento. [...] Interpretações
feitas precocemente podem ser facilmente desperdiçadas, e intensificar seu uso
defensivo. A importância de se guardar o trabalho de arte é possibilitar que as
imagens sejam revisitadas posteriormente.[...] Somente o cliente poderá
finalmente entender o verdadeiro significado de suas linhas, configurações e
cores, portanto, interpretações prematuras podem facilmente impedir o
desdobramento natural do seu profundo significado." (HANES, 1998, p. 189, tradução livre da autora).
Por hoje é só!
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# Tania Maria Netto - Pós-doutorado em Neurociência (Faculdade de Medicina - UFRJ), PhD em Psicologia (PUC-RJ), Mestrado em Psiclogia (PUC - RJ), Graduação em Artes Plásticas e Psicologia com Especialização em Areteterapia (Universidade de Utah, Salt Lake City, EUA).
(1) Esta frase ouvi em um post de Erico Rocha, empreendedor digital, nas redes sociais.
(2) <http://nao-palavra.blogspot.com.br/2015/11/arteterapia-pelo-mundo-margarete.html> publicado em 10 de novembro de 2015.
Referências:
HANES,
Michael J. Abstract Imagery in Art Therapy: What does it mean? in: ART THERAPY:
JOURNAL OF THE AMERICAN THERAPY ASSOCIATION, 15(3), 1998. Vol. 15, Nº 3, 1998.
185-190
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Caso tenha dificuldades em postar seu comentário, nos envie por e-mail que nós publicaremos no blog: naopalavra@gmail.com
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Muito bom... quem disse que um café e conversa não dão um artigo maravilhoso e varios pulinhos de sapo... Bora pular bastante!!!
ResponderExcluirQue venham muitos cafés pela frente!!!!! Estamos estudando o material e iremos postar aqui nossos comentários, resenhas... muito material!!! Obrigada Tania
ExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirLuciana Pellegrini Baptista1 de junho de 2016 18:11
ResponderExcluirO artigo ficou muito bom. A busca da arteterapia com base na Psicanálise é instigante. As referências utilizadas, bem como a profissional entrevistada delimitaram o papel do arteterapeuta no consultório. Como disse a Tânia, "Pulando como o sapo" vamos fundamentando a prática, tornando este saber acessível à todos, no que diz respeito também aos benefícios e progressos alcançados na profissão. Parabéns grupo Eliana-"Não Palavra".
Luciana, É importante que todos nós que amamos esta profissão estejamos enpenhados no estudo e pesquisa e, claro, em compartilhar nossas experiências para crescermos juntos. Obrigada. Flavia.
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