crisilha@hotmail.com
Neste final de semana tive a
oportunidade de participar de um encontro entre mulheres. Fui convidada a facilitar
um Círculo de Mulheres e no dia seguinte uma Oficina sobre plantas e flores
medicinais também somente com mulheres, ambos em Miguel Pereira, RJ. São trabalhos que realizo há 7 anos na Ilha do Governador, onde tenho consultório de
Psicologia e Arteterapia, e pela primeira vez levei este trabalho para outras
terras.
Celebração das Fases da Lua, amplamente associada aos ciclos da mulher e da vida
Lá, tive a oportunidade de
experimentar um profundo encontro entre muitas mulheres experientes, sábias na
vida, com muitas histórias para contar, com muitas feridas para curar –
compreendendo cura como um reequilíbrio mental e emocional a partir da tomada
de consciência de si mesma – e eu me via ali, como a mais nova e aquela que
estaria levando esse trabalho para proporcionar tal movimento de cura e
reconexão para elas.
Em muitos momentos fiquei olhando
aquelas mulheres, com suas histórias, muitas vezes com a dor marcada na voz e
fiquei me vendo com elas, acolhendo e pensando: “Como posso ajudar este grupo?”.
Estamos na Primavera e quando buscamos
histórias para falar sobre esta estação chegamos a histórias como as de Coré e
Deméter, de Ostara, de deusas jovens, em seus aspectos de donzelas que ajudam o
inverno frio e gelado a florescer. O inverno por sua vez, é marcado pelas
deusas velhas, anciãs, como Deméter em seu caráter de velha e melancólica pela
perda de sua filha querida. A terra então se renova quando a força da jovem
chega à superfície e traz um sopro de calor, traz sementes brotando e flores se
abrindo, uma lufada de vida após um tempo de frio e escuridão.
O Retorno de Perséfone - Frederic Leighton, 1891
Para este momento de ciclos das
estações, na natureza e na nossa vida, penso que as forças invocadas são as do Puer e do Senex, uma dupla, ou melhor, uma sizígia[1]
arquetípica que nos ensina sobre o equilíbrio entre o velho e o novo, entre o
florescer e o recolher, entre o começar e o manter, entre a ação e o pensamento,
entre a coragem e o medo. E quando escutamos histórias de vidas que são cheias
de invernos e primaveras, cheias de atos de coragem e de medo, cheias de
momentos de ação e momentos de estagnação, penso que o próprio ato de contar
essas histórias numa roda já se torna terapêutico, já promove uma escuta de si
mesma e um ato de reflexão sobre sua caminhada.
Na Arteterapia temos um braço que
falamos pouco aqui no blog, mas que tem sua força, que são as Contações de Histórias,
as fábulas, os mitos, os contos e a partir dessas histórias desenvolve-se um
trabalho terapêutico, e depois desse final de semana me peguei pensando em como
trabalhar tantas histórias fortes, engraçadas, dolorosas e lindas que por si só
já nos oferecem muito material para trabalho.
Em um ateliê de Arteterapia temos
recursos diversos para amplificar e resignificar momentos dramáticos de uma
caminhada, como a linha do tempo, as técnicas com tecido e costura, a própria
contação de histórias, e outros tantos movimentos com uso de materiais
plásticos ou não. A Gestalt-terapia também nos oferece técnicas muito
interessantes para trabalhar esses momentos de difícil compreensão e
elaboração, que são as teatralizações feitas por outros participantes do grupo,
que encarnam as pessoas a serem trabalhadas e revivem a cena, dando possibilidades
criativas para a elaboração do problema.
Sendo assim, me vi dentro deste
grupo como aquela que talvez possa fornecer um espaço ritualístico e
terapêutico para mulheres que buscam um recontar de suas histórias, um espaço
onde falar sobre si já traz a força da cura e da consciência, uma lufada de
novos ares que proporcionam a todas nós caminhar sobre as estações, sobre as “deusas”
e todos os aspectos que elas nos têm a ensinar. E deixo a reflexão sobre esta
percepção nos grupos terapêuticos, onde ouvimos caminhadas às vezes muito mais
longas que a nossa e o quanto isso também nos é curador, enquanto terapeutas. O
quanto de respeito devemos dedicar a estas pessoas que chegam até nós e nos
confiam a alma mais profunda, compartilhando suas vivências e confiando na
nossa entrega e dedicação em ajudá-las. E para nós Arteterapeutas, antes mesmo
de sabermos o máximo possível sobre cada técnica e material, é preciso ouvir, é
preciso estar ali, estar junto, estar ao lado, como Nise da Silveira nos
ensinou tão lindamente, o estar ao lado por si só já tem seu potencial de cura.
Agradeço todas as mulheres que
fizeram parte dessa caminhada, como Fernanda R. R. da Rosa, Roberta Salgado, Sandra Carvalho, e aqui, neste espaço de leitura e reflexão,
agradeço a Eliana Moraes e Flavia Hargreaves por estarem ao lado construindo
este conhecimento que vai além da teoria, mas também de vida, pois partilhamos
o que nos afeta em nossa prática diária, o lidar com o outro, a dança da vida!
A Dança - Henri Matisse, 1909
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[1] Quando
usamos o termo sizígia, pegamos
emprestado da astrologia o termo de conjunção, ou seja, quando dois planetas
estão lado a lado no mapa natal, não são opostos trazendo energia complementar,
nem quadrados um ao outro trazendo energias conflitantes. Estão juntos, lado a
lado, atuando o tempo todo num entrelaçar de forças.