segunda-feira, 25 de setembro de 2023

A IMPORTÂNCIA DO ATELIÊ NA FORMAÇÃO CONTINUADA DO ARTETERAPEUTA – PARTE 3

 


Ateliê Arteterapêutico no Venha Conosco, 22/09/23, turma da manhã

Por Eliana Moraes

naopalavra@gmail.com

@naopalavra 

 

Desde 2022, venho investindo na promoção de espaços de ateliês arteterapêuticos para estudantes e profissionais da Arteterapia, com o objetivo de apresentação dos materiais e criação de intimidade com suas diversidades, bem como a manutenção da chama da criatividade no pensar arteterapêutico. Esses espaços contam com as belas parcerias de Mariana Farcetta (online, pelo Instituto FACES) e de Vera de Freitas (pelo Não Palavra em palestras online e presencial no RJ e SP). Fragmentos desse percurso já foram registrados em dois textos anteriores desse blog: PARTE 1 e Parte 2 

O texto de hoje é escrito após dois eventos marcantes dentro de uma semana: o fechamento do ciclo de 4 meses de ateliê em parceria com Mariana, oferecido à uma turma de 25 alunas, e o encontro presencial do ateliê “Experimentação em Camadas 2”, em parceria com Vera no Instituto Venha Cosnosco – RJ, com um total de 11 participantes. 

Nesta segunda feira, retorno à minha rotina de trabalho acreditando cada vez mais na importância da manutenção de espaços de experimentação de materiais e desenvolvimento da criatividade para arteterapeutas e estudantes. De posse da confiança de que estamos em um caminho promissor, retomo uma reflexão anterior:

 

O caminho de contato pessoal com a prática criativa se inicia no curso de formação, mas na realidade se estende a todo o tempo da formação continuada do arteterapeuta, ou seja, enquanto este se mantiver ativo em seu estudo e práticas. É essencial que ele conheça e experimente por si mesmo os potenciais e as propriedades da grande variedade de materiais possíveis a serem usados em um setting arteterapêutico, em cada uma de suas singularidades. É importante que vivencie os processos de estímulos, resistências, enfrentamentos, desbloqueios, busca e encontro de soluções, encantamentos, mas sobretudo, a criação de intimidade com as materialidades para que possa dar a sustentação necessária para os futuros experienciadores da Arteterapia, que a seu tempo viverão estes enfrentamentos na condição de pacientes/clientes. (MORAES, 2022)

 

Nesse caminhar de estudo e prática, uma de nossas referências teóricas é Fayga Ostrower e seu clássico livro “Criatividade e Processos de Criação”. Sendo a autora uma  teórica da arte, nós arteterapeutas podemos lê-la fazendo constantes aplicações no dia a dia arteterapêutico. Em seu texto, Fayga já nos descreve como o processo criativo atravessa e alcança experiências de vida do criador:

 

Durante esse tempo [do processo criativo], nos diferentes planos do viver, talvez no trabalho profissional também, hão de ocorrer os incidentes mais variados, sucessos, fracassos, alegrias, tristezas, amor, nascimentos, mortes. Produzirão emoções e pensamentos diversos, possivelmente até contraditórios. Poderão afetar o indivíduo no cotidiano de vida ou até atingi-lo em regiões íntimas do vivenciar, nas aspirações e em sua identidade mesmo. Continuando a trabalhar, o indivíduo recolhe esses múltiplos momentos e os transforma em conteúdos psíquicos, nos conteúdos de sua experiência de vida. (OSTROWER, 73-74) 

Tal vivência é tão profunda que autora chega a caracterizar o processo criativo como uma experiência existencial (p. 69) do criador.

 

Compreendemos que todo os processos de criação... [são] onde o homem se descobre, onde ele próprio se articula à medida que passa a identificar-se com a matéria. São transferências simbólicas do homem à materialidade das coisas e que novamente são transferidas para si. (OSTROWER, 53)

 

Naturalmente compreendemos que Fayga, teorizando o fenômeno da criação, não utiliza a expressão “transferência” com a conotação psicoterapêutica quanto à relação projetiva entre paciente e terapeuta. Entretanto, articulando a teoria da arte com a teoria específica da Arteterapia – a tríade paciente/terapeuta/material -, poderíamos extrapolar suas palavras compreendendo que ao se identificar com a matéria, o paciente poderá fazer uma projeção transferencial de seus conteúdos psíquicos à um outro objeto externo participante da relação terapêutica, para além da figura do arteterapeuta. Eis aqui uma especificidade da Arteterapia como prática, teoria e profissão. 

Sobre as especificidades de cada matéria 


                              Ateliê Arteterapêutico no Venha Conosco, 22/09/23, turma da tarde

Outra especificidade da teoria arteterapêutica se dá no estudo das linguagens e materiais em suas propriedades. Naturalmente o estudo das propedêuticas dos materiais já é existente na teoria da arte. Entretanto ao arteterapeuta cabe o aprofundamento nos benefícios, potenciais de resistência e encaminhamentos terapêuticos para que possa promover o encontro entre o paciente/cliente e o material que será mais facilitador do seu processo de autoconhecimento. 

Segundo Fayga, cada materialidade apresenta possibilidades e impossibilidades que promovem “sugestões” a cada processo criativo:

 

Cada materialidade abrange, de início, certas possibilidades de ação e outras tantas impossibilidades. Se as vemos como limitadoras para o curso criador, devem ser reconhecidas também como orientadoras, pois dentro das delimitações, através delas, é que surgem sugestões para se prosseguir um trabalho e mesmo para se ampliá-lo em direções novas. De fato, só na medida em que o homem admita e respeite os determinantes da matéria com que lida como essência de um ser, poderá o seu espírito criar asas e levantar vôo, indagar o desconhecido. (OSTROWER, 32)

 

Assim, a maneira como o criador age e reage diante de cada matéria compõe a escuta arteterapêutica pois a ordenação da matéria exterior é um espelhamento da ordem interior do criador. Como nos diz Fayga:

 

Trata-se de potencialidades da matéria bem como de potencialidades nossas, pois na forma de ser dada configura-se todo um relacionamento nosso com os meios e conosco mesmo. Por tudo isso, o imaginar - esse experimentar imaginativamente com formas e meios - corresponde a um traduzir na mente certas disposições que estabeleçam uma ordem maior, da matéria, e ordem interior nossa. (OSTROWER, 34)

 

Considero que Fayga colabora em muito na construção do vocabulário do arteterapeuta ao apresentar sua proposta à um experiencador. Dentre outras expressões trazidas por Fayga, tenho estimulado a reflexão sobre a “imaginação criativa específica” que cada materialidade provoca no paciente/cliente:

 

Formulamos aqui a ideia de a imaginação criativa vincular-se à especificidade de uma matéria, de ser uma “imaginação específica” em cada campo de trabalho... Referida à atividade, a imaginação ocorreria em formas específicas porque adequadas ao caráter da matéria, nas ordenações em que a compreende a mente humana. (OSTROWER, 32)



Fechamento do ateliê 2023 do Instituto Faces

 

Nunca é demais ressaltar que a formação da “imaginação criativa” só é possível a partir da relação e intimidade constituída com a materialidade em questão. Na Arteterapia a criação dessa identificação com a matéria deve ser conduzida pelo arteterapeuta dentro do tempo e da necessidade do paciente/cliente – seja este um paciente leigo ou o que já tenha conhecimento técnico da materialidade, mas que necessita vivenciá-la em um registro espontâneo, intuitivo e emocional:

 

Reiteramos que a imaginação criativa nasce do interesse, do entusiasmo de um indivíduo pelas possibilidades maiores de certas matérias ou certas realidades. Provém da capacidade de se relacionar com elas... À afetividade [com a matéria] vinculam-se sentimentos e interesses que ultrapassam qualquer tipo de superespecialização.

... O que, portanto, se coloca aqui é que, para ser criativa, a imaginação necessita identificar-se com a materialidade. Criará afinidade e empatia com ela, na linguagem específica de cada fazer. (OSTROWER, 39)

 

Entretanto, ratificamos nesse texto que a construção da “imaginação criativa” do paciente/cliente com a materialidade, só poderá ser estimulada pelo arteterapeuta que vivenciá-la primeiramente em si mesmo. O processo de conhecimento dos materiais e desenvolvimento da criatividade deve iniciar-se antes no arteterapeuta para que, somente depois, ele se disponha a proporcionar esse caminho ao outro, pois:

 

O único caminho aberto para nós, seria conhecer bem uma dada materialidade no próprio fazer. Com este conhecimento e com a nossa sensibilidade tentaríamos acompanhar analogicamente o fazer dos outros.

 (OSTROWER, 35)

 

Agradeço aqui minhas parceiras de ateliês e cada participante desses espaços de potência criativa. Em 2024 seguimos nosso caminhar continuado em ateliês arteterapêuticos.


Referências Bibliográficas:

MORAES, Eliana. A importância do ateliê arteterapêutico. Blog Não Palavra.

OSTROWER, Fayga. Criatividade e processos de criação. 

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Sobre a autora: Eliana Moraes



Arteterapeuta e Psicóloga
Pós graduada em História da Arte
Especialista em Gerontologia e saúde do idoso.
Cursando MBA em Logoterapia e Desenvolvimento Humano
Fundadora e coordenadora do "Não Palavra Arteterapia".
Escreve e ministra cursos, palestras e supervisões sobre as teorias e práticas da Arteterapia. 
Faz parte do corpo docente de pós-graduações em Arteterapia: Instituto FACES - SP, CEFAS - Campinas, INSTED - Mato Grosso do Sul. 
Atendimentos clínicos individuais e grupais em Arteterapia online, sediada em Belo Horizonte, MG. 

Autora dos livros "Pensando a Arteterapia" Vol 1 e 2

Organizadora do livro "Escritos em Arteterapia - Coletivo Não Palavra

segunda-feira, 11 de setembro de 2023

LIBERDADE, RESPONSABILIDADE E O PROCESSO CRIATIVO: DIÁLOGOS ENTRE LOGOTERAPIA E ARTETERAPIA

 


Por Eliana Moraes – MG

naopalavra@gmail.com

 

Neste texto damos continuidade ao estudo sobre a articulação entre conceitos básicos da Logoterapia e Arteterapia. Essa pesquisa vem sendo compartilhada em palestras do Não Palavra (gravadas e disponíveis para aquisição) e em textos postados no blog que delas fazem um breve resumo. 

Em texto anterior (CLIQUE AQUI) concluímos  que beber da fonte da arte e a contínua prática criativa coopera para o desbloqueio da dimensão noética, sendo este o norte orientador do trabalho logoterapêutico. E que, conforme a proposta da Logoterapia, a Arteterapia acolhe o sujeito em sua integralidade alcançando suas dimensões física, psíquica e noética. 

Compreendemos que a Dimensão Noética é composta por aspectos como a Consciência, o Pensamento crítico, Liberdade e Responsabilidade, Escolhas e Atitudes, Ética e Valores, Espiritualidade e Sentido de vida, Religiosidade, Criatividade e experiências com a Arte. No presente texto nos aprofundaremos nos itens destacados. 

Em seu best seller “Em busca de sentido”, Viktor Frankl já nos chama a atenção sobre o imperativo da Liberdade, a liberdade interior:

 

“Onde fica a liberdade humana?” Não haveria ali um mínimo de liberdade espiritual no comportamento, na atitude frente às condições ambientais ali encontradas? Será que a pessoa nada mais é que um resultado de múltiplos determinantes e condicionamentos, sejam eles de ordem biológica, psicológica ou social? Seria a pessoa apenas o produto aleatório de sua constituição física, da sua disposição caracteriológica e da sua situação social?... A experiência da vida no campo de concentração mostrou-nos que a pessoa pode muito bem agir “fora do esquema”... e que continua existindo, portanto, um resquício de liberdade do espírito humano, de atitude livre do eu frente ao meio ambiente, mesmo nessa situação de coação aparentemente absoluta, tanto exterior como interior... E mesmo que tenham sido poucos, não deixou de construir prova de que no campo de concentração se pode privar a pessoa de tudo, menos da liberdade última de assumir uma atitude alternativa frente às condições dadas. (FRANKL, 2019, 87-88) 



Obra: Susano Correia

A retomada de minha leitura do livro “Em busca de sentido” se deu em 2020, ano de pandemia e não por acaso, ano em que a teoria da Logoterapia resgatou um destaque nos estudos em Psicologia. O texto de Frankl me serviu tanto de reflexão pessoal como em reflexões clínicas, demonstrando aos pacientes que ainda havia alguma liberdade individual para o enfrentamento da pandemia dentro de sua biografia. Dessa forma, vivenciamos na prática da vida algo que Frankl já nos apresentava em teoria: a relação entre a Liberdade e a Responsabilidade:

 

A liberdade, no entanto, não é a última palavra. Não é mais que parte da história e metade da verdade. Liberdade é apenas o aspecto negativo do fenômeno integral cujo aspecto positivo é responsabilidade. Na verdade, a liberdade está em perigo de degenerar, transformando-se em mera arbitrariedade, a menos que seja vivida em termos de responsabilidade. É por esse motivo que propus a construção de uma Estátua da Responsabilidade na Costa Oeste dos Estados Unidos, para complementar a Estátua da Liberdade na Costa Leste. (FRANKL, 2019, 154) 

As expressões “negativo” e “positivo” aqui não são utilizadas como juízo de valor, mas sim fazendo referência à relação de complementaridade entre esses dois aspectos. Teorizando sobre esse binômio, Viktor Frankl se posiciona radicalmente contra a possibilidade de determinismos e condicionamentos, considerando-os reducionistas do ser humano:

 

O autor se posiciona contra todo tipo de reducionismo – seja ele biológico, sociológico ou psicológico – que tolhe a responsabilidade e a liberdade humanas...

Apesar dos condicionamentos determinísticos da condição humana, os instintos, a hereditariedade e o meio ambiente constituem-se os meios pelo qual o indivíduo se afirma, mas ele não perderia sua liberdade de se posicionar ou seja, de se submeter ou transcender às determinações (FRANKL, 1990a).” (AQUINO, 2013, 50-51)

 

Viktor Frankl criticava o que chamou de “pandeterminismo”, a ideia de que o ser humano poderia ser totalmente condicionado e determinado por suas condições. Ele compreendia que apenas as dimensões psicofísicas podem ser condicionadas. Porém, a dimensão espiritual/noética – aquela que nos diferencia como seres humanos – seria incondicionada, uma vez que  “uma das principais características da existência humana está na capacidade de se elevar acima dessas condições, de crescer para além delas.” (FRANKL in AQUINO, 2013, 101). Neste sentido, a Logoterapia propõe uma reumanização do sujeito atendido, oferecendo-lhe uma psicoterapia a partir do espiritual, ou seja, da apropriação de sua dimensão noética e as propriedades que ela contém. 

Desta forma, a Logoterapia diferencia o que é ser “livre de” e “livre para”:

 

A Logoterapia reconhece que o ser humano não é livre de condições, mas livre para se posicionar “apesar das condições”. Afinal, a pessoa também é influenciada por forças ambientais, biológicas e psicológicas, mas, na dimensão noética possui posturas e ações. Não apenas reage, mas responde. (AQUINO, 2013, 52) 

Em síntese, “A Logoterapia procura criar no paciente uma consciência plena de sua própria responsabilidade.” (FRANKL, 2019,  134). E quanto à liberdade:

 

... seria compreendida como uma possibilidade de escolha na concretude das situações... Nesses termos, considerando os aspectos da consciência, responsabilidade e liberdade, o eu é construído de acordo com as decisões realizadas, configurando, dessa forma, o seu ser-no-mundo. Assim, ele afirma: “eu ajo não apenas em consonância com o que sou, como também me transformo em consonância com o que ajo” (FRANKL, 1990a, p 99)...

Assim, liberdade e responsabilidade constituem as duas faces de uma mesma situação.” (AQUINO, 2013, 52) 

Liberdade e Responsabilidade na Arteterapia 


Nas práticas psicoterapêuticas tradicionais, o convite subjetivo feito ao paciente é  “Fale sobre a sua questão”. Já em Arteterapia o convite é “Crie sobre a sua questão”, consequentemente, “Aja sobre a sua questão.”
 

Fayga Ostrower, que teoriza sobre o fenômeno da criação, diz que:

 

A criação exige do indivíduo criador que atue...

A atividade criativa consiste em transpor certas possibilidades latentes para o real. As várias ações, frutos recentes de opções anteriores, já vão ao encontro de novas opções, propostas sugeridas no trabalho, tanto assim que continuamente se recria no próprio trabalho uma mobilização interior, de considerável intensidade emocional. (OSTROWER, 71) 

Compreendemos assim a Arteterapia como uma modalidade terapêutica que convoca o paciente à ação, em oposição à dificuldade de realizações, comportamento queixoso do outro, posturas “preguiçosas” e “não responsáveis” por si.  No processo criativo o sujeito “trabalha” e ao trabalhar, uma série de mobilizações corporais, psíquicas, cognitivas e noéticas acontecem:

 

No trabalho o homem intui. Age, transforma, configura, intuindo... Ao criar... nesse processo configurador o indivíduo se vê diante de encruzilhadas. A todo instante, ele terá que se perguntar: sim ou não, falta algo, sigo, paro...

Nessa mobilização está inserido um senso de responsabilidade. As opções se propõem quase que em termos de princípios de “certo ou errado” e, no caso das artes, o quanto custa decidir uma pincelada, a exata tonalidade de uma cor, o peso de uma palavra, uma nota certa, todo artista bem o sabe dentro de si.

(OSTROWER, 70-71) 

A autora defende que cada uma dessas escolhas do artista será orientada por uma bússola interna. Compreendemos que a descrição dessa bússola pode ser associada às propriedades da Dimensão Noética e seus valores: 

Essa mesma busca, o indivíduo não sabe quanto poderá durar, nem exatamente aonde ela o levará. Conquanto exista uma predeterminação interior que o impulsiona e também o orienta, algo que ao iniciar o trabalho, o indivíduo mais ou menos pressupõe e imagina...

Propondo, optando, prosseguindo, ele parece impulsionado por alguma força interior a induzi-lo e a guiá-lo como se dentro dele existisse uma bússola. Essa lhe diz: vá adiante, revise, ajunte, tire, acentue, diminua, interrompa!...

A resolução refletirá em tudo seu equilíbrio interno pois a bússola não era senão ele mesmo. É um momento de entendimento de si. No processo de trabalho, entre a abertura e o fechamento da obra, o indivíduo se determinou e veio a reconhecer-se. (OSTROWER, 71-72) 

Viktor Frankl, autor da Logoterapia, afirma que: “eu ajo não apenas em consonância com o que sou, como também me transformo em consonância com o que ajo” (FRANKL in AQUINO, 2013, 52). Assim, podemos associar suas palavras com as de Fayga Ostrower, na teoria da criação:

 

Formar importa em transformar. Todo processo de elaboração e desenvolvimento abrange um processo dinâmico de transformação, em que a matéria orienta a ação criativa, é transformada pela mesma ação.

Transformando-se, a matéria não é destituída do seu caráter. Pelo contrário, ela é mais diferenciada, e ao mesmo tempo, é definida como um modo de ser. Transformando-se e adquirindo forma nova, a matéria adquire unicidade e é reafirmada em sua essência...

Daí se nos apresenta outro aspecto que tanto nos fascina no mistério da criação: ao fazer, isto é, ao seguir certos rumos afim de configurar uma matéria, o próprio homem com isso se configura. (OSTROWER, 51)

Desta forma, compreendemos que a Arteterapia é um procedimento terapêutico que faz um convite à transformação da matéria e de si mesmo através da matéria. Eis aqui uma especificidade da Arteterapia como procedimento terapêutico, a promoção do agir criativo dentro do setting arteterapêutico:

 

O agir amparado pelo continente do setting arteterapêutico através da criação é uma especificidade da Arteterapia dentre os procedimentos terapêuticos. Dessa forma, o setting configura-se como um ambiente suportado pela transferência com o arteterapeuta para que o cliente/paciente vivencie-se no fazer, articule-se em si e perante si, alcançando níveis de consciência mais elevados. Que, através da criação, ele se perceba em suas repetições, resistências, sintomas, e tenha a oportunidade de enfrentá-las. Que em meio a essa experiência tome decisões sobre esse enfrentamento (ou não) e que assim se responsabilize por si como autor e protagonista da sua obra/história, alcançando uma realidade nova em dimensões novas. (MORAES, 2018, 76-77) 

Diante do que foi exposto, concluímos que no diálogo entre Logoterapia e Arteterapia, o convite para o criar e o agir dentro do setting arteterapêutico coopera para que o sujeito vivencie o binômio Liberdade/Responsabilidade em si, em cada etapa do processo criativo, na transformação da matéria e de si mesmo, simultaneamente. Pois como sintetiza Fayga:

 

Ao transformarmos as matérias, agimos, fazemos. São experiências existenciais – processos de criação – que nos envolvem na globalidade, em nosso ser sensível, no ser pensante, no ser atuante. (OSTROWER, 69) 

 

Referências Bibliográficas:

AQUINO, Thiago. “Logoterapia e Análise Existencial: uma introdução ao pensamento de Viktor Frankl”

FRANKL, VIKTOR. “Em busca de sentido”

MORAES, Eliana. “Pensando a Arteterapia Volume 1”

OSTROWER, Fayga. “Criatividade e processos de criação”


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Sobre a autora: Eliana Moraes



Arteterapeuta e Psicóloga
Pós graduada em História da Arte
Especialista em Gerontologia e saúde do idoso.
Cursando MBA em Logoterapia e Desenvolvimento Humano
Fundadora e coordenadora do "Não Palavra Arteterapia".
Escreve e ministra cursos, palestras e supervisões sobre as teorias e práticas da Arteterapia. 
Faz parte do corpo docente de pós-graduações em Arteterapia: Instituto FACES - SP, CEFAS - Campinas, INSTED - Mato Grosso do Sul. 
Atendimentos clínicos individuais e grupais em Arteterapia online, sediada em Belo Horizonte, MG. 

Autora dos livros "Pensando a Arteterapia" Vol 1 e 2

Organizadora do livro "Escritos em Arteterapia - Coletivo Não Palavra