segunda-feira, 8 de dezembro de 2025

A CORAGEM DE SER IMPERFEITO: QUANDO O "RIDÍCULO" REVELA O ESSENCIAL



 Por Cris Silva – RJ

 @arteterapia_crissilva

Dia desses estava atendendo uma pessoa no individual e ouvi a seguinte frase durante a partilha na sessão:

 "No começo, me senti ridículo fazendo isso (...)”.

Escutei com respeito. O sentimento de “ridículo” que muitas pessoas expressam em contextos terapêuticos costuma ser, na verdade, uma manifestação do medo de se expor em sua vulnerabilidade.

A partir da devolutiva, pudemos dialogar sobre como esse desconforto inicial revela não apenas uma resistência, mas também uma oportunidade. Conversamos sobre o valor de se permitir experimentar sem garantias, sobre o receio de julgamento e sobre como a expressão criativa pode abrir caminhos para ressignificar esse olhar, tanto o próprio quanto o do outro.

Vivemos em uma cultura que nos treina para a performance, para o resultado, para o aplauso. E quando entramos num espaço onde o convite é simplesmente sentir, experimentar, errar, brincar, algo dentro de nós se contrai. A criança interna, tantas vezes silenciada, quer pintar com os dedos, cantar desafinado, colar papel torto, mas o adulto racional diz: Isso não é sério, não é bonito, não é útil.”

A Arteterapia nos devolve o direito de não saber, de não dominar e de não agradar. É justamente nesse espaço de liberdade que reside a potência.

Quando alguém se permite atravessar o desconforto inicial, aquele sentimento que costuma dizer “isso é bobo”, e escolhe permanecer, algo começa a se transformar. O gesto ganha sentido, a forma revela conteúdo e o que antes parecia sem propósito aparente se torna símbolo.

A pesquisadora Brené Brown, autora de A Coragem de Ser Imperfeito, afirma:

“A vulnerabilidade é o berço da inovação, criatividade e mudança.”

Essa frase, presente em suas palestras e no livro, nos lembra que o desconforto de se expor é também o portal para o que há de mais genuíno em nós. Na Arteterapia, isso é visível: o que começa como hesitação pode se tornar expressão profunda.

O medo do ridículo nasce, muitas vezes, do olhar que imaginamos que o outro terá sobre nós. Mas quando esse olhar é acolhedor, como na Arteterapia, ele se torna espelho, não julgamento. E nesse espelho, podemos nos ver com mais compaixão.

Outro trecho marcante da obra diz:

“A coragem de ser imperfeito é aceitar e abraçar nossas fraquezas, deixar de lado a imagem de quem deveríamos ser e aceitar quem realmente somos.”

Essa aceitação não é passiva; é uma escolha ativa, transformadora. É o ponto de partida para uma expressão genuína, para vínculos mais profundos e para uma vida com mais autenticidade.

Na Arteterapia, o “ridículo” é bem-vindo. Porque ele carrega a chance de romper padrões, desafiar crenças limitantes e abrir espaço para o novo. E quando o novo chega, ele raramente vem com formas perfeitas, mas quase sempre vem como um processo. Um processo que não é linear, nem imediato, mas que vai se fazendo aos poucos, no ritmo de quem cria. É nesse percurso que mora a potência: na liberdade de experimentar sem saber o resultado, na coragem de permanecer mesmo diante do desconforto e na entrega ao gesto que revela mais do que a forma, revela sentido.

A coragem de ser imperfeito é, talvez, uma das maiores ousadias terapêuticas. E é também uma das mais libertadoras. Porque é nela que reencontramos o prazer de criar sem meta, de expressar sem filtro, de existir sem máscara.

Na arte, como na vida, não há erro quando há expressão genuína, apenas caminhos que revelam quem somos.

 

Referência:

BROWN, Brené. A coragem de ser imperfeito: como aceitar a própria vulnerabilidade, vencer a vergonha e ousar ser quem você é. Tradução de Fernanda Abreu. Rio de Janeiro: Sextante, 2016.

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Sobre a autora: Cristiane da Silva


Arteterapeuta: AARJ 1125 /08. Formada em Pedagogia (UERJ/RJ), tem trinta e três anos de regência em sala de aula – da Educação Infantil à Educação de Jovens e Adultos neurodivergentes na rede pública de ensino do Rio de Janeiro. Pós-graduada em Arteterapia em Educação e Saúde (UCAM/RJ) e formada em Arteterapia pelo Atelier de Artes e Terapias Eveline Carrano. É graduanda em Psicologia (UVA/RJ). Foi voluntária por 4 anos na ONG Anjos da Tia Stellinha, atuando no projeto CONSTRUINDO A MINHA HISTÓRIA – resgate de vínculos entre mães e filhos. Realiza oficinas e vivências em Arteterapia, é mediadora de Biblioterapia e Escrita terapêutica. Acredita que as artes, as leituras, a escrita e a cooperação mudam o sentido da vida e que, sempre, abrem caminhos para o desenvolvimento pessoal e social.

segunda-feira, 1 de dezembro de 2025

REGULAÇÃO EMOCIONAL EM ARTETERAPIA: CORES

 

“A cor é um meio de exercer influência direta sobre a alma: a cor é a tela, o olho é o martelo, e a alma é o piano com suas cordas”.

 – Wassily Kandiski –

 

Por Juliana Mello - RJ     

      Como mencionei anteriormente, além do elemento água, também podemos trabalhar a regulação emocional por meio das cores. Esse recurso expressivo costuma ser uma das formas mais confortáveis para que o paciente manifeste aquilo que, muitas vezes, as palavras não conseguem traduzir: o que está sentindo.

Sabemos que existe uma infinidade de emoções, muito mais do que as cores disponíveis na paleta. Por isso, é importante lembrar que cada cor pode “falar” sobre um sentimento diferente de acordo com a experiência e percepção de cada pessoa. Em outras palavras, a cor é subjetiva. Por exemplo: o vermelho pode representar amor, vitalidade, mas também sangue ou alerta; o preto pode remeter ao luto e à perda, mas também à elegância, sendo muito usado em roupas; o rosa pode estar associado ao feminino, mas também à delicadeza ou à infância. Eva Heller, especialista em teoria das cores, relata que:

 “Não existe cor destruída de significado. A impressão causada por cada cor é determinada por seu contexto, ou seja, pelo entrelaçamento de significados em que a percebemos”. (2013)

De acordo com Maria Cristina Urrutigaray, professora e psicóloga Junguiana:

 “O mundo constitui-se pelas cores. Quando acordamos e abrimos os olhos, a primeira coisa que vemos são as cores, através de tons e sombreados, que nos dão tons ou qualidades afetivas as nossas percepções em função da luminosidade existentes”. (2017)

 

            Trabalhadas no setting terapêutico, as cores podem dar contorno às emoções, especialmente quando estas se apresentam muito expansivas, intensas ou difíceis de regular. Isso pode acontecer por meio de imagens pré-estabelecidas, papéis com texturas mais “ásperas”, entre outros recursos que oferecem limites e estrutura. Da mesma forma, o inverso também é possível: quando as emoções estão muito contidas, retraídas ou parecem “presas”, as cores podem favorecer a expansão e a expressão, principalmente quando utilizadas junto a materiais que envolvem o elemento água, como guache, aquerela e nanquim. Neste contexto, a Arteterapia auxilia, de forma profunda e de acordo com a demanda de cada paciente, o trabalho com as cores, ocupando um papel central como mediadora simbólica das emoções.

No processo terapêutico, solicitamos que o paciente passe um tempo em contato com as cores, selecionando aquelas que melhor representam as emoções que está sentindo no momento, ou mesmo emoções vivenciadas anteriormente e trazidas para a sessão. Se houver dificuldade em nomear uma cor para cada emoção, o paciente pode simplesmente escolher a cor que “chama”, atrai ou convida, confiando na própria experiência interna.

Ao colorir a imagem, de modo simbólico, imagina-se que essas emoções estão sendo colocadas no papel, ganhando forma e concretude. Algumas perguntas que podem ajudar nesse processo são:

·         Que forma tem esse sentimento?

·         Qual é a sua intensidade?

·         Como ele deseja se expressar?

·         Tem forma concreta ou é mais abstrata?

            Alguns materiais que podem ser utilizados com foco nas cores: papéis coloridos, miçangas, botões, tecidos, lã, lápis de cor, giz de cera, canetinha, embalagens coloridas, etc.

            Integrada à Terapia Cognitivo-Comportamental, a exploração das cores pode favorecer insights para identificar pensamentos e comportamentos, além de trabalhar atenção, foco, escolhas e práticas de Atenção Plena. Frequentemente, os pacientes relatam um alívio emocional, contribuindo assim para a Regulação Emocional.

Seguem abaixo algumas práticas trabalhadas com foco nas cores:

 


Desenho com lápis pastel oleoso em papel  Kraft



                                                               Mandala com lápis de cor

 


                                                               Colagem em papel colorido



                                                              Frotagem e lápis de cor



                                                                 Lápis de cor na forma

Ao unir Arteterapia e TCC, ampliamos as possibilidades de compreensão, regulação e transformação emocional dentro do processo terapêutico.


Bibliografia:

COUTINHO, Vanessa. ARTETERAPIA COM CRIANÇAS. Rio de Janeiro: Wak editora, 4ª edição, 2013.

HELLER, Eva. A PSICOLOGIA DAS CORES: COMO AS CORES AFETAM A EMOÇÃO E A RAZÃO. São Paulo: Editora GG, 1ª edição, 2013.

URRUTIGARAY, Maria Cristina. INTERPRETANDO IMAGENS, TRANSFORMANDO EMOÇÕES. Rio de Janeiro: Wak Editora, 1ª edição, 2017.


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Sobre a autora: Juliana Mello



Psicóloga, Arteterapeuta e Coach

Atendimento clínico  individual e grupo om criança, adolescente, adulto e idoso.
Abordagem em Terapia Cognitivo- Comportamental e Arteterapia

Palestras e Workshop motivacionais.

GRUPO DE ESTUDOS: "TCC e técnicas expressivas"