Por Silvia Quaresma - SP
othila.arteterapia@gmail.com
A VIDA POR
UM FIO
A vida é um
fio
Vem do cordão
umbilical que nutre, quando cortado, ensina viver
A vida é um
fio
Que nos alinhavos
da infância a história começa tecer
A vida é um
fio
Que nos nós da
adolescência, ensina crescer
A vida é um
fio
Que nos
embaraços da juventude ensina amadurecer
A vida é um
fio.
Que na fluidez
da maturidade ensina o saber
A vida é um
fio
Que no limiar
da existência sabe como romper
O
ato de tecer, fiar e costurar pode ser observado desde a Pré História como
comprovam descobertas arqueológicas: agulhas de ossos, múmias revestidas de
tecidos, fragmentos de plantações de algodão.
O
homem construía seus abrigos entrelaçando vime em varas de madeira, assim como produzia
a cama que dormia. Este era o rudimentar começo da manufatura têxtil.
A origem do ato de tecer perde-se na noite dos tempos na memória humana. Surgiu da necessidade de cobrir e proteger o corpo das intempéries. A criatividade do ser humano cuidou de transformar a necessidade de sobrevivência em experiência e expressão artística. (PHILIPPINI, 2018, p.60).
As
fibras eram retiradas das plantas e animais e surgiu a necessidade de produzir outras
em laboratório: a fibra química artificial.
Com
o passar do tempo o uso de fibras mais macias como linho, algodão, lã e pelos
de animais contribuíram para a evolução do fio e consequente para uma fiação individualizada,
passada de geração para geração.
Apesar
do incontestável uso utilitário do fio, a relação entre ele e o individuo
começa a fazer sentido quando a beleza surge na produção de arte. E nesta relação,
o olhar para si mesmo convida Kairós a participar do processo e a Chronos para
envolver-se com outra tarefa.
Os trabalhos podem durar o momento do processo arteterapêutico, ou horas, ou às vezes dias, meses.
Usar fios nos processos arteterapêuticos é explicar a vida: ajuda a escolher o suporte, (costura, bordado), a tecer os vínculos onde laços e nós simbolicamente correspondem às conexões (tecelagem, crochê, tricô, macramê). Processos de atar e desatar nós, construir vínculos, tudo é aprendizagem contínua.
No processo arteterapêutico, tecer
equivale a ordenar, a articular, a entrelaçar, a organizar, a apropriar-se do
próprio fluxo criativo e existencial. (PHILIPPINI, 2018, p.61).
O
Bordado, técnica que traz a ancestralidade, transmitida de geração a
geração, ativa memórias afetivas e tem o poder de desinibir. Quantos conteúdos
observados a partir da conversa facilitada pelos pontos ordenados. É um
percurso demorado que tem insights em todas suas fases: a escolha do suporte,
dos fios, a necessidade ou não de gráficos. E para um momento reflexivo a
necessidade ou não do “avesso” perfeito.
A
costura traz sempre uma recordação (boa ou não): há sempre a lembrança
de uma pessoa próxima costurando, do barulho das máquinas, das conversas, do
uso do dedal para a costura a mão. Dos trabalhos com o fio, o que mais rápido
vincula o grupo é o costurar.
Dos trabalhos com o fio, o que mais rápido remete à ancestralidade é o crochê pois sempre é executado por uma avó, mãe, tia, vizinha, irmã, prima, alguém próximo e é lembrado. Sua execução permite uso de uma enorme variedade de fios, incluindo alguns inusitados (cobre, sacolas plásticas cortadas e tudo que possa ser transformado em fios). É mais rápido que outras técnicas (tricô, tear, por exemplo) mas em compensação o material “rende” menos e é feito com agulha com um gancho na ponta.
O tricô traz a figura da matriarca da família numa cadeira de balanço. Técnica onde são usadas além do fio, duas ou mais agulhas. Costuma ser mais demorado que o crochê, porém o material utilizado “rende” mais.
O macramê é a arte de fazer nós, e como
tal serve para estruturar. É preciso saber como apertá-los, como deixar espaços
vazios e como harmonizar o todo.
A tecelagem traz uma série de recursos, desde a escolha do suporte, das cores, dos diferentes fios, de como fazer, como finalizar:
No contexto arteterapêutico, a produtividade da tecelagem é grande: tecer, tramar, urdir, produzir tessituras, dominar o fio e com ele formar estruturas. (PHILIPPINI, 2018, p.61).
Em
minha experiência como arteterapeuta tenho trazido várias técnicas para usar
fios. E em cada processo este recurso mostra que o domínio sobre o fio
inexiste, assim o resultado esperado é sempre diferente do obtido.
O
fio desinibe, contribui, conduz, orienta, ata, desata, movimenta.
E parafraseando Jorge Vercillo, mostra o avesso:
“O mais
importante do bordado
É o avesso, é o avesso
O mais importante em mim
É o que eu não conheço
O que eu não conheço
Bibliografia
PHILIPPINI.
Linguagens e Materiaias Expressivos em Arteterapia: uso, indicações e
propriedades Rio de Janeiro: Wak.
2018.
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Sobre a autora: Silvia Quaresma
Arteterapeuta
AATESP 665/0720
Graduada em Letras,
pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Moema - SP
Pós-Graduada em
Finanças, Ibmec - SP
Pós-Graduada em
Arteterapia e Criatividade – Instituto Freedom – Faculdade Vicentina em
parceria com NAPE
Professora especialista
de artesanato
Idealizadora do Projeto
Customizando Emoções –Interface entre Artesanato e Arteterapia
Idealizadora Othila
Arteterapia em ação (@othila.arteterapia)
Idealizadora do Fio que
sente (@fioquesente)
Coordenadora de Grupos
de Arteterapia em Instituição para cuidadores e voluntários
Atendimento em
Arteterapia (individual e grupos)