fmhartes@gmail.com
Fayga Ostrower (1920-20010. Paisagem. 1947.
Desenho a nanquim, bico de pena e aguada sobre papel.
FONTE: http://faygaostrower.org.br/acervo/desenhos
E estou aqui
novamente citando alguém, Fayga Ostrower, que não se refere à Arteterapia, mas
sim faz ressalvas sobre a clara distinção entre os territórios da Arte e da
Arteterapia. Fayga deixa claro que está tratando de Arte, enquanto Dra. Nise da
Silveira, citada em textos anteriores, deixa claro que não fala nem de Arte nem
de Arteterapia. Mas então porque estudá-las? Porque sim. Porque são autoras
importantes que trilharam cada uma na sua área de interesse os caminhos da
criatividade, seus processos, a leitura das imagens e o quanto tudo isto é
fundamental para o ser humano. Entre tantos encontros e desencontros nesta
jornada em busca de fundamentos para a Arteterapia, acredito que estas duas
mulheres ‘brasileiras” deixaram, mesmo sem querer, um importante legado para a
Arteterapia, tão próximo, tão acessível que me parece absurdo não nos
debruçarmos sobre ele, e, porque não, discordarmos tanto quanto quisermos.
Capa do livro: Criatividade e Processos de Criação, Fayga Ostrower.
Sincronicamente,
eu e minhas parceiras nos deparamos no mesmo momento lendo “Criatividade e
Processos de Criação”, publicado originalmente em 1977, tendo sido citado na
palestra do dia 12 de maio, “Criação e Expressão Espontânea” apresentada por
Maria Cristina de Resende, e dá o título ao texto de Eliana Moraes da semana
passada “A percepção de si dentro do agir”. Quando me sentei para
escrever, ainda sem saber sobre o quê, me deparei com o livro sobre a mesa. Pensei:
não há como escapar, vamos ver aonde ela pode nos levar.
Vou repetir
aqui as duas citações, a da palestra “Criação e Expressão Espontânea”:
“A tensão psíquica pode e deve ser elaborada. Assim, nos processos criativos, o essencial será poder concentrar-se e poder manter a tensão psíquica, não simplesmente descarregá-la.” (OSTROWER, 1997.p.28)
“Criar não representa um relaxamento ou um esvaziamento pessoal, nem uma substituição imaginativa da realidade; criar representa uma intensificação do viver, um vivenciar-se no fazer; e, em vez de substituir a realidade, é a realidade; é uma realidade nova que adquire dimensões novas pelo fato de nos articularmos, em nós e perante nós mesmos, em níveis de consciência mais elevados e mais complexos.” (OSTROWER, 1997.p.28)
E continuo citando:
“Daí o sentimento do essencial e necessário no criar, o sentimento de um crescimento interior, em que nos ampliamos em nossa abertura para a vida.” (OSTROWER, 1997.p.28)
Quando falo
sobre a autora fazer críticas à Arteterapia, me refiro a ressalvas que me
parecem ser um entendimento que a Arte com fins terapêuticos estaria baseada em
uma descarga e esvaziamento de potência, ao que ela contrapõe a ideia de que ao
criar fortalece, potencializa. Em nota de rodapé ela escreve “[...] a arte, REDUZIDA
à terapia [...] perde seu sentido artístico.” (OSTROWER, 1997.p.28, grifo meu).
Levando
estas citações para dialogar com a nossa prática da Arteterapia, gostaria de
trazer para este espaço uma discussão que têm mobilizado a mim e minhas
parceiras, Eliana e M. Cristina, acerca de um modelo vivencial em Arteterapia
trazido com freqüência por alunos e participantes de nossos grupos de estudo e
supervisão. Importante colocar que nós também aplicamos este modelo em algumas
de nossas práticas.
O modelo segue
um roteiro básico: 1) Relaxamento; 2) Apresentação de um disparador, que pode
ser um conto, um mito, uma imagem, uma palavra, uma poesia ... a partir do qual
se propõe uma atividade expressiva, na maioria das vezes, plástica; 3)
Fechamento, reflexão, que pode ser escrever, falar sobre a experiência,
compartilhar com o grupo.
Vou me ater
a questão do primeiro momento, RELAXAMENTO, muitas vezes uma meditação
acompanhada por uma música suave, relaxante como preparação para a entrada
neste espaço terapêutico. Momento de introspecção e silêncio como condição para
a expressão de conteúdos inconscientes. Neste ponto, Dra. Nise da Silveira irá
corroborar com a ideia de que o silêncio é fundamental para a expressão de
imagens do inconsciente.
Mas o que
fazer com a tensão, a angústia, o conflito que está mobilizando aquele
indivíduo ou grupo naquele encontro? Devemos abrandá-la, silenciá-la?
Permitiremos um momento de catarse como um esvaziamento destas tensões? Afinal
o que fazer com a potência criativa presente nesta tensão?
Não estamos
ocupados com as questões profissionais da Arte, mas estamos sim ocupados com as
questões da Arte que dizem respeito ao Homem em sua profundidade.
Poderíamos,
talvez, acolher esta tensão e usá-la como fazem os artistas. O artista não se
acalma, não aquieta o coração para produzir, muito pelo contrário. E o
esvaziamento que se dá na produção se renova em potência novamente, como diz
Fayga.
Me parece que o mais importante nesta reflexão é estar atento a questão de porque optar por um caminho ou outro diante do cliente. Quando silenciar a tensão para que ele possa entrar em contato com as suas questões profundas e quando partir da tensão, e do conflito que está gritando e necessitando de um espaço legítimo para serem expressos, percebidos e elaborados. E, que bom, neste momento voltar nossos olhos para o cliente, antes de seguir uma receita de modo automático acreditando que sempre funciona e que funciona para todos. E se não funciona é resitência do cliente, e nunca do terapeuta.
Como coloquei anteriormente, estas questões têm me mobilizado e transformado a minha prática na Arteterapia, e acredito que seja fundamental nos questionarmos sempre e buscarmos autores nas áreas afins à nossa tão recente profissão buscando novas possibilidades e nunca respostas finais.
Referências:
OSTROWER, Fayga. Criatividade e Processos de Criação. 12ª ed. Petrópolis, Editora Vozes, 1997.Para conhecer a obra de Fayga Ostrower: http://faygaostrower.org.br/
Caso tenha dificuldades em postar seu comentário, nos envie por e-mail que nós publicaremos no blog: naopalavra@gmail.com
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirConcordo com o artigo, quando entendo que, ao paciente seja dado o direito de escolha do material plástico que queira utilizar, e que, como arteterapeuta, eu não direcione a sessão. Assim percebo no paciente a possibilidade de sem estas interferências, que ele obtenha o quantum de energia necessária para acesso aos conteúdos inconscientes promovendo o auto conhecimento.
ResponderExcluir