segunda-feira, 2 de setembro de 2013

SUSTO



“O que eu sinto eu não ajo.
O que ajo não penso.
O que penso não sinto.
Do que sei sou ignorante.
Do que sinto não ignoro.
Não me entendo e ajo como se entendesse.”
Clarice Lispector


             É um fenômeno interessante (e não raro de acontecer) quando um paciente está falando em palavras algo sobre si e está convencido disto, porém a imagem que ele cria em uma sessão de arteterapia contradiz absolutamente aquilo que “conta”. Se a boca diz que o sentimento é desânimo mas a imagem nitidamente diz desespero. Se a boca diz pessimismo e depressão e a imagem diz os “coloridos do carnaval”. Se a boca diz que se está em um bom momento de vida, mas só foram escolhidas imagens de depreciação pessoal. Muitas situações de descompasso entre a mensagem verbal e a mensagem “atuada” pelo paciente.
Ao se trabalhar com imagens, cria-se um canal de expressão ao qual os conteúdos desprezados por repressão ou resistência se presentificam e são convocados à um diálogo entre as partes.
É importantíssimo ressaltar que é possível que, mesmo com este confronto “físico”, o paciente ainda sim recuse-se a encarar os conteúdos, deixando-os permanecer inconscientes e em uma atuação “irresponsável”. Se isto acontece, o terapeuta deve respeitar este limite do paciente pois se ele não o reconhece, não é por acaso, e tem direito a ter seu tempo próprio.
Porém, em muitos momentos, o que se dá é um susto. Quando o paciente percebe a discrepância entre o que ele está dizendo com a boca e o que ele está dizendo com as mãos, ele se depara com suas incoerências, sua não consciência e dá-se uma grande oportunidade para que ele se reconheça, se pense e se fale realmente. Nas palavras de Maria Cristina Urrutigaray:

“... pois fica um pouco mais difícil para alguém negar aquilo que acabou de fazer, bem como de perceber o quanto se posiciona... As possibilidades de se perceber nas suas dificuldades, dadas as imposições deferidas pelo próprio uso dos materiais plásticos, confere ao usuário as noções de limitação, aceitação e humildade diante de suas dificuldades, tonando-o mais humano, mais próximo de si mesmo e dos demais.”. (URRUTIGARAY)

URRUTIGARAY, Maria Cristina. Arteterapia: a transformação pessoal pelas imagens.  Ed Wak. Rio de Janeiro, RJ. 2011. 

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