segunda-feira, 14 de abril de 2014

ARTETERAPIA, ESCRITA E CLARICE


Por Eliana Moraes


“É na hora de escrever que muitas vezes fico consciente das coisas, das quais, sendo inconsciente, eu antes não sabia que sabia.” Pag 85


            Hoje gostaria de falar sobre uma linguagem da arte pouco explorada aqui no blog. Muito refletimos sobre as artes visuais, mas fato é que a arte literária e a escrita também são muito interessantes e muito ricas em recursos para a clínica da arteterapia.
            Estou fazendo um mergulho no livro “Crônicas para Jovens – de escrita e vida” de Clarice Lispector, inclusive autora que inspira o nome deste blog. Nele, em vários momentos Clarice fala sobre o potencial do ato de escrever, reflexões que confirmam os benefícios do uso desta linguagem da arte no processo terapêutico:

“Escrever é procurar entender, é procurar reproduzir o irreproduzível, é sentir até o último fim o sentimento que permaneceria apenas vago e sufocador.” Pag 91-92

            Estimular que o paciente faça registros sobre seus trabalhos de arteterapia, que escreva sobre seus sentimentos, pensamentos, memórias, opiniões, é uma técnica bastante organizadora e tem efeito estruturante no paciente. E Clarice via este efeito da escrita como uma necessidade para si:

“Minhas intuições se tornam mais claras ao esforço de transpô-las em palavras. É nesse sentido, pois, que escrever me é uma necessidade. De um lado, porque escrever é um modo de não mentir o sentimento... do outro lado, escrevo pela incapacidade de entender, sem ser através do processo de escrever.” Pag 103

            Mas talvez uma das formas de escrita mais férteis para o processo terapêutico, que proporciona grandes insights e contato com conteúdos pessoais profundos antes não percebidos, seja o que Freud chamou de associação livre, os surrealistas chamaram de escrita automática. Nós arteterapeutas chamamos de escrita criativa e Clarice chamou de “escrever distraidamente”  (pag 95):

“Ir me obedecendo -  é na verdade o que faço quando escrevo, e agora mesmo está sendo assim.  Vou me seguindo, mesmo sem saber ao que me levará.” Pag 73

“Escrevendo, tenho observações por assim dizer passivas, tão interiores que se escrevem ao mesmo tempo em que são sentidas, quase sem o que se chama de processo. É por isso que no escrever eu não escolho...” pag 77



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