segunda-feira, 11 de novembro de 2013

ARTETERAPIA: HISTÓRIA DA ARTE PARA QUÊ?


Com frequência cito em meus textos minha parceira de estudo e trabalho, Flávia Hargreaves. Hoje o espaço do blog é cedido à ela.

Bem vinda Flávia!


                                     
Adaptação do "desenho automático" feito a seis mãos durante o grupo de estudos 
"Arteterapia e História da arte: Dada e Surrealismo".
Junho/2013.

Minhas indagações a respeito da contribuição da História da Arte para a Arteterapia iniciaram em 2009, quando, ao lado de Eliana Moraes, criamos nosso primeiro grupo de estudos sobre o tema. Na época selecionamos alguns artistas e estudamos suas biografias, assistimos a filmes e analisamos as imagens em função da personalidade dos mesmos e de acontecimentos marcantes em suas vidas, buscando identificar como estes episódios, traumas, etc. influenciaram a trajetória artística de cada um e de como e se a Arte teria contribuído no seu processo de individuação.
Em 2013, por sugestão de Eliana, voltamos o nosso olhar para o Surrealismo e seu interesse em acessar o inconsciente utilizando técnicas de automatismo inspiradas no método de associação livre, criado por Freud.
Logo de início, o Dadaísmo se impôs como uma matéria a ser estudada e experimentada. Identificamos muitas praticas comuns na Arteterapia nos processos dadaístas, o que se repetiu no estudo do Surrealismo. Observando as aproximações e diferenças entre as propostas artísticas e terapêuticas. O passo seguinte foi pensar em como transpor estes processos para o setting terapêutico mantendo o link com a sua origem.
Foi preciso estabelecer alguns critérios para deixar claras as semelhanças e diferenças entre os dois movimentos. Entre as semelhanças, que nos interessam diretamente, destacamos a busca da não-razão, do não-controle e da quebra de padrões estabelecidos e consagrados na História e Teoria da Arte (o que pra nós se converte em visão de mundo, comportamento, etc.). Porém, os dois movimentos tem olhares e propostas diversas sobre a Arte e procedimentos.
O Dadaísmo busca a não-razão através do acaso, do caos, do absurdo, não se interessando em teorias sobre o inconsciente ou em formular teorias sobre a Arte. O Surrealismo, movimento posterior ao Dada, o faz através de automatismos cuja origem se encontra na associação livre freudiana experimentada por Andre Breton, psiquiatra, poeta e o principal teórico do movimento. Tanto o acaso como o automatismo irão abrir espaço para o inconsciente, embora os dadaístas não se refiram a este termo.
Nossos estudos foram levados para a clínica por Eliana Moraes na Unidade Integrada de Prevenção / Hospital Adventista Silvestre e em atendimentos individuais em seu consultório, com resultados surpreendentes e levados por mim para as salas de aula em minicursos de História da Arte e em cursos de Formação em Arteterapia no Rio de Janeiro (Ligia Diniz e Integrare). Em outubro deste ano realizamos em conjunto a oficina “Artetreapia e História da Arte: Dada e Surrealismo” no evento “O Inconsciente e a Arte” promovido pela AARJ (Associação de Arteterapia do Rio de Janeiro).
Partimos de um processo, de um modo de fazer, de uma perspectiva. Todas as propostas obrigam o autor a se submeter ao não-controle, através do acaso, do automatismo ou de jogos coletivos. Seja deixando a tinta fluir sobre o papel, seja dando prosseguimento a um desenho iniciado por outro, seja buscando palavras às cegas ou imagens aleatórias. De qualquer modo, é importante ressaltar que na pratica, principalmente, da Arteterapia existe um segundo momento que é de elaboração que será mais ou menos consciente dependendo do caso. Por exemplo, no caso da colagem, diante de diversos fragmentos estranhos entre si o autor/cliente/paciente ao montar o trabalho irá estabelecer relações espaciais e de significado entre as partes criando uma obra/poema/imagem única. Ao construir estas relações o tema surge naturalmente e muitas vezes, ao final, estamos diante de um símbolo que surgiu espontaneamente.

Nossa proposta ao estabelecer um diálogo criativo entre a Hsitória da Arte e Arteterapia não significa transpor uma proposta artística do início do século XX para a terapia no século XXI, mas apropriar-se de determinados conhecimentos e técnicas propostas por estes artistas e recriá-los com objetivos terapêuticos, que em muitos aspectos irá se distanciar das intenções artísticas originais. Não teremos um livro de receitas à mão, mas uma diversidade magnífica de ingredientes e possibilidades.

Flávia Maciel Hargreaves
Arteterapeuta (AARJ 402)
Professora de Artes Visuais (UFRJ 2010)
Comunicadora Visual (UFRJ 1989)

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