Por Eliana Moraes
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Dando continuidade a série de textos iniciada na última semana, que se propõe a articular o movimento fauvista com a Arteterapia, hoje teremos como protagonista um dos artistas mais importantes do século XX: Henri Matisse. O artista é uma referência quando o assunto é o uso das cores na História da Arte, como nos diz Ferreira Gullar:
Hoje, um século depois do grande
cisma que mudou a história da arte... tendemos a não perceber esse dado
fundamental: a descoberta da cor como matéria autônoma da pintura.
Antes, a cor da pintura era a cor das coisas, das roupas, das casas, das
pessoas – e por isso ela aparecia no quadro conforme as características dos
objetos e da luz ambiente. A libertação começa com os impressionistas e
chega à sua plenitude com Matisse que, em alguns de seus quadros, a despoja
de toda e qualquer dependência naturalista. (GULLAR, 2012, p 39)
Henri
Matisse
Busco antes de tudo a expressão...
Não posso distinguir entre o sentimento que tenho da vida e a maneira como o
traduzo. (MATISSE in CHIPP, 1996, p 128)
Matisse nasceu na França em 1869. Era filho de um pai severo
que partia do princípio que o filho seguiria seus passos. Chegou a cursar dois
anos de direto, mas sua vocação apareceu ainda jovem, após uma apendicite em
1890, que o manteve acamado por quase um ano. Sua mãe ofereceu-lhe uma caixa de
tintas para passar o tempo. A partir de então fez vários cursos de desenho e
pintura enquanto estudava e trabalhava. Matisse casou-se e teve três
filhos.
O artista é conhecido como “o mestre da cor” por ter
desenvolvido uma pesquisa sobre o tema de extrema importância para a Arte
Moderna. Matisse não tinha medo de experimentar. Em suas obras as cores foram
usadas de forma subjetiva, provocativa, emocional e autônoma de sua
representação literal. Ele dizia que sentia através das cores. Em suas
palavras:
Afastando-nos da representação literal do movimento, obtemos
mais beleza e mais grandeza...
Vou pintar um interior: tenho diante
de mim um armário; ele me dá uma sensação de vermelho muito vivo, e coloco um
vermelho que me satisfaz. (MATISSE in CHIPP,
1996, p 129-130)
O lado expressivo das cores se impõe
a mim de modo puramente instintivo. Para pintar uma paisagem de outono, não
tentarei me lembrar das cores que convém a essa estação; inspirar-me-ei apenas
na sensação que ela me proporciona. (MATISSE in CHIPP, 1996, 131)
Hoje, pode parecer-nos um tanto natural pintar a partir das
cores relativas à nossas sensações e emoções, entretanto este estilo subversivo
de pintar não passou ileso aos olhares críticos de sua época:
Até os críticos mais perspicazes
achavam que Matisse havia exagerado... consideraram sua recém descoberta liberdade
da cor, e a livre interpretação de temas familiares, uma evidência
de excentricidade declarada. (WHITFIELD, 2000, 18)
Do
Fauvismo à Arteterapia
Na Arteterapia de nossos dias, podemos beber da fonte de
Matisse quando compreendemos que o artista fazia das cores o elemento principal
dos seus quadros por seu potencial expressivo. Através do uso exorbitante e
aparentemente aleatório das cores, ele constelava em imagem a efusão espontânea
e de suas emoções.
Inspiramo-nos em Matisse quando destacamos o elemento visual
da cor para que ela nos sirva de linguagem para sentimentos vivenciados como “não
palavra” mas que ainda necessitam de expressão .
Práticas
arteterapêuticas: "A família do pintor" e "Pintando a quem se ama"
Matisse tinha o hábito de pintar as pessoas amadas com as
cores das emoções envolvidas nestas relações, como no quadro acima pelo qual
retratou sua família.
O retrato é uma das formas mais
singulares da arte. Esta requer do artista qualidades especiais e uma
afinidade quase total com o modelo. (MATISSE in WALTHER)
Os meus modelos são figuras humanas e
não simplesmente figurantes de um interior. São o tema principal do meu
trabalho... As suas formas não são perfeitas, mas são sempre expressivas. O
interesse emocional que despertam em mim... .” (MATISSE in WALTHER)
Mas sem dúvida o retrato mais subversivo e supreendente de
Matisse se deu quando pintou sua esposa:
Ela é colorida? Eu diria que sim.
Precisa? Nem um pouco. Quando foi que você viu um nariz verde pela última vez?
Embaraçosa para madame Matisse? Muito. Se Matisse tivesse tratado uma paisagem
dessa maneira, isso teria causado um estardalhaço, mas retratar assim uma
mulher causou indignação. Para piorar ainda mais as coisas, diz-se que, quando
perguntaram ao artista o que sua mulher estava realmente usando, ele teria
respondido: ‘Preto, é claro.’... A viva explosão de cores de sua expressão
pictórica revelava a paixão que esse homem reservado sentia pela esposa.
(GOMPERTZ, 115-116)
Podemos nos inspirar em Matisse ao pedirmos que o experienciador
da Arteterapia produza um retrato de pessoas amadas, objetos das questões
terapêuticas, utilizando as cores de maneira autônoma e análoga aos seus
sentimentos. Ou até mesmo o retrato de sua família, de forma que não apenas a leitura
do desenho (já conhecida por nós que trabalhamos com essa técnica expressiva)
mas também as cores relacionadas às emoções acessadas pelo experienciador,
sirvam para a escuta terapêutica.
No próximo texto encerraremos esta série trazendo a última
fase de Matisse, também tão inspiradora para as práticas arteterapêuticas.
Bibliografia:
CHIPP, H.B.
(org) Teorias da Arte Moderna. Ed Martins Fontes, SP. 1996
GOMPERTZ,
Will. Isso é arte? 150 anos de arte moderna do Impressionismo até hoje. Rio de
Janeiro, Zahar, 2013.
GULLAR,
Ferreira. Arte Contemporânea Brasileira. Ed Lazuli, SP. 2012
WALTHER,
Ingo F. Matisse. Taschen, 1993.
WHITFIELD,
Sarah in STANGOS, Nikos (org). Conceitos da arte moderna, Jorge Zahar
Ed, RJ, 2000.
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Sobre a autora: Eliana Moraes
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