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Uma das alegrias de morar no Rio é me deparar
vez ou outra com a arte na rua. Uma arte que nem sempre foi “de rua”, mas que
com os desdobramentos políticos e sociais está cada vez mais presente nos
espaços públicos. Artistas que querem dar a voz, literalmente, ao seu talento e
não encontram espaço para expressá-lo. E essa falta de espaço vai sendo
observada inclusive nos pequenos espaços que eles ocupam e fazem destes,
grandes palcos e marcam seus lugares.
Nos trens dos metrôs isso fica visível e claro.
Fazer do pouco o muito, do pequeno o grandioso. E a arte não é mesmo trabalhar
com a criatividade, resiliência e adaptação? Quem teve a oportunidade de fazer
um curso de teatro sabe da importância da improvisação. Na arte e na vida.
E num desses dias, entre minhas idas e vindas
em vagões, me deparei com uma arte que não costumo enaltecer ou mesmo olhar com
mais demora, mas parei para observar. Uma arte hip hop de alguns jovens que
faziam barulho, mas em harmonia, e seus corpos dançavam como se tivessem
elástico e muito ritmo. Nossa que incrível! A energia que eles emanavam
contagiava os que estavam presentes e dispostos a presenciar. Tirou-me de um
estado de desligamento e me convidou a entrar no clima e na vida real para além
de meus próprios pensamentos e reflexões. Trouxe-me um sentimento de genuína
gratidão por estar ali, vivenciando a vida na arte.
Pausa no texto que se
iniciou em janeiro de 2019 e não foi concluído.
Interessante, não?
Chegamos em junho do mesmo ano de 2019 com uma
notícia de tirar o fôlego e nos depara no real da nossa política atual. “O Tribunal de Justiça do Rio (TJ-RJ) considerou inconstitucional a
Lei Estadual 8120/2018, que regulamentava performances artísticas
em estações de barcas, trem e metrô.” A decisão
foi divulgada após uma ação movida pelo então deputado estadual Flávio
Bolsonaro (PSL), hoje senador, como informado por vários meios de
comunicação.
"A cada um cabe escolher, de acordo com os
seus valores e convicções, que tipo de arte e em que momento pretende
assisti-la, não sendo razoável ou proporcional qualquer imposição, haja vista a
possibilidade de simplesmente pretender exercer seu direito ao sossego, o que
não é possível, diante da exposição a gritarias e ruídos estridentes de
aparelhos musicais", escreveu o desembargador relator Heleno Ribeiro
Pereira Nunes, do Órgão Especial do TJ-RJ.
Direito ao sossego... Essas palavras fizeram
eco em meus ouvidos perante a disparidade que encontramos nossos meios públicos
de transporte: que sossego? Desde quando andar em um transporte público na
cidade do Rio de Janeiro é exemplo de sossego? Não querendo entrar em questões
políticas, mas já entrando, pois arte é também um ato político, um ato de
conexão e transferência.
Inclusive
em arteterapia, como bem coloca Eliana
Moraes no texto “O manejo do
fenômeno da projeção em Arteterapia”, do livro Pensando a Arteterapia, o material utilizado na produção
arteterapêutica faz também um papel de contratransferência na relação
terapeuta-cliente, e acredito sim, que a arte de rua também tem esse papel a
nos tirar de nossas próprias projeções pessoais e sociais e conhecer o novo,
novos sons, novos movimentos e que sejam, novos ruídos, para além dos nossos
barulhos internos e das violências externas e medos cotidianos.
Fico pensando no que senti no metrô naquele dia
do hip hop que me convidou a sair de mim e ir a outros mundos e o quanto me fez
bem. Fico me lembrando das pessoas que também observo sendo espectadoras da
arte nos locais públicos e os quantos sorrisos de genuína gratidão a arte
desperta. Fico pensando em quantas vezes eu pude sentir alegria com a arte e em
quantos desdobramentos já vi meus clientes sentirem boas emoções também através
da arte, muitas vezes tendo sido convidados a experimentar pela primeira vez
materialidades que eles não tinham vivência ou conforto algum. Fico pensando o
quão potente a música é e nos desperta de estados de ânimos esvaziados nos
reportando a estados de alma cheios de vivacidade. Fico pensando se quando os
autores e executores das leis viajam para fora do país, se eles dão suas costas
às artes ou admiram como superficiais, mas genuínos espectadores.
Meu convite sempre será para a simplicidade,
genuinidade e sensibilidade. E existe caminho melhor que pela arte?
Com amor, Suzane Guedes.
MORAES, Eliana. Pensando a Arteterapia. Divino
de São Lourenço, ES: Semente Editorial, 2018.
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Sobre a autora: Suzane Guedes
Suzane
Guedes é Psicóloga (CES-JF), Especialista em Psicologia e Desenvolvimento
Humano (UFJF) e Arteterapeuta (POMAR).
Colunista
no blog O psicólogo Online, no qual escreve sobre Autoestima.
Atua
nas cidades do Rio de Janeiro e Três Rios-RJ com atendimento clínico presencial
a crianças, jovens, adultos e idosos; ministra grupos e oficinas terapêuticas.
Também trabalha como orientação psicológica online.
Suzane
acredita na psicoterapia e arteterapia como grande ferramenta de auxílio à
transformação e desenvolvimento pessoal e social.
Facebook: https://www.facebook.com/olharparasi/
Atendimento online: http://www.atendimento.opsicologoonline.com.br/suzane-guedes
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