quarta-feira, 25 de junho de 2014

SOBRE O INÍCIO DO PROCESSO ARTETERAPÊUTICO INDIVIDUAL (II)


Por Eliana Moraes


“Qualquer intenção do artista tem que abrir caminho através das malhas de uma rede apertada; Toda obra de arte é o resultado de uma tensão prolongada entre uma série de desejos e uma série de resistências à sua execução.” Arnold Hauser em História Social da Literatura e da Arte

            Dando continuidade às questões pensadas no grupo de estudos “A prática da arteterapia” sobre o início do processo arteterapêutico individual (ver texto anterior), a pergunta é: passada a primeira sessão, em que foi realizada uma técnica de coleta de dados (em geral uma colagem com figuras de revistas) como proceder na segunda, terceira, quarta sessão?
            Primeiramente é necessário ter em mente que apenas um trabalho de coleta de dados, assim como a primeira entrevista na psicoterapia verbal, não é suficiente para que o terapeuta de fato alcance as questões de seu paciente. Outros trabalhos de coleta de dados ainda são muito pertinentes nesta fase inicial. A partir destes trabalhos o terapeuta poderá formular hipóteses que serão confirmadas ou não nos próximos trabalhos realizados pelo paciente. As questões terapêuticas se presentificarão para o arteterapeuta a partir de uma “colcha de retalhos”: retalhos oferecidos pela fala e imagens produzidas pelo paciente que o terapeuta costurará e usará como base para sua atuação.
            A técnica da arteterapia é específica por trabalhar com a imagem, ou seja, a “expressão não verbal”, uma forma de comunicação muito legítima, em que aspectos inconscientes são acessados e materializados, muitas vezes burlando a racionalização e a resistência do paciente. Devido a isto, não é raro de acontecer que no(s) primeiro(s) trabalhos de coleta de dados, o paciente produza uma imagem que conte para o terapeuta boa parte do caminho a ser percorrido ou conteúdos muito profundos, mas que ele esteja completamente  inconsciente disto. O arteterapeuta deve estar atento a este fenômeno aguçando sua escuta e seu olhar para o paciente.
Penso que devemos reconhecer a responsabilidade e a ética que especificamente a técnica da arteterapia nos impõe neste momento. É o paciente  quem irá dizer aonde está seu foco, escolher onde quer (pode) se aprofundar, aonde quer (pode) mergulhar a cada momento, a cada etapa deste caminho. Ao terapeuta cabe buscar sempre estar consciente de si, de suas ansiedades em sua atuação como profissional, lembrando que o foco orientador não deve estar em si mas em seu paciente. Uma boa estratégia é o arteterapeuta elaborar possíveis propostas ou técnicas que sejam pertinentes ao que o paciente trouxe, e mantê-las como “cartas na manga” que serão acionadas uma a uma a partir do que o próprio paciente apresentar como gancho.
Esta é uma jornada que pertence a cada sujeito, e cada um tem o seu tempo próprio. O terapeuta deve acompanhar este ritmo respeitando os limites e as resistências naturais de seu paciente. Lembro de um fragmento do final do texto “Repetir, Recordar e Elaborar” de Freud que citei no texto “A resistência na arteterapia” neste blog. Nele Freud relata sobre médicos principiantes na psicanálise que vinham pedir conselhos à ele sobre como lidar com a resistência do paciente. Em suas palavras:
“O médico nada mais tem a fazer senão esperar e deixar as coisas seguirem seu curso, que não pode ser evitado nem continuamente apressado.”

“Esta elaboração das resistências pode, na prática, revelar-se uma tarefa árdua para o sujeito em análise e uma prova de paciência para o analista. Todavia, trata-se do trabalho que efetua as maiores mudanças no paciente..."

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