segunda-feira, 7 de julho de 2014

ARTETERAPIA: PRELÚDIO DE VIDA – Um relato

            
         O texto de hoje é um relato escrito por uma paciente de grupo terapêutico em arteterapia para 3ª idade (com sua autorização de publicação). Estas palavras dão sentido ao nosso trabalho e nos motivam a continuar produzindo, teorizando e tentando contribuir para que este saber e técnica se estabeleça e tenha seu lugar.


“O dia 02 de fevereiro registrou na minha vida uma grande perda.
Ali, encerrou-se a página de uma trajetória de emoções, esperanças, alegrias, renúncias, expectativas, encontros e desencontros.
Abalada com a perda e a falta da magia de alguém que amava, procurei a todo custo apoiar-me em Deus. Mas, não era fácil controlar a tristeza. Algumas pessoas do meu pequeno círculo de amizade, diziam-me: ‘dá tempo, tudo vai passar...’ Mas enquanto não passava, a dor maltratava, mais e mais.
Foi então que, na busca constante por algo que me preenchesse o vazio da alma, encontrei a Arteterapia – prelúdio de vida, cujos ensaios semanais de improvisação de pensamento, busquei, através de instrumentos não musicais, tais como lápis de cor, pincéis, telas, colas, cortes e recortes, música, etc... a transformação das ideias e emoções contidas – uma nova forma de viver.
Esta metamorfose, por mais volátil que pareça, contribuiu para renovar o físico, o intelectual, o emocional e o espiritual – efeito positivo dessa catarse natural.
Este processo de transformação não se esgota aqui, ele é contínuo e efetivo, exige de cada um de nós paciência, determinação e humildade para alcançar autoconhecimento.
Foi aqui que encontrei a fórmula para a superação. Foi aqui, que com a força do grupo, descobri o gosto pela pintura, inspiração para as ideias, um tempo para escrever e falar do abstrato. Foi aqui, que conquistei maior conhecimento de mim mesma. Foi aqui, que exercitei a resignação, a paciência, a compreensão, a humildade, a identificação com o simples e o natural, maior convivência com Deus.
É aqui que, em cada encontro, assimilo a explicação para o verdadeiro sentido da vida, mesmo quando o vento sopra contra, e que o sofrimento abre caminho para a evolução espiritual.”

quarta-feira, 25 de junho de 2014

SOBRE O INÍCIO DO PROCESSO ARTETERAPÊUTICO INDIVIDUAL (II)


Por Eliana Moraes


“Qualquer intenção do artista tem que abrir caminho através das malhas de uma rede apertada; Toda obra de arte é o resultado de uma tensão prolongada entre uma série de desejos e uma série de resistências à sua execução.” Arnold Hauser em História Social da Literatura e da Arte

            Dando continuidade às questões pensadas no grupo de estudos “A prática da arteterapia” sobre o início do processo arteterapêutico individual (ver texto anterior), a pergunta é: passada a primeira sessão, em que foi realizada uma técnica de coleta de dados (em geral uma colagem com figuras de revistas) como proceder na segunda, terceira, quarta sessão?
            Primeiramente é necessário ter em mente que apenas um trabalho de coleta de dados, assim como a primeira entrevista na psicoterapia verbal, não é suficiente para que o terapeuta de fato alcance as questões de seu paciente. Outros trabalhos de coleta de dados ainda são muito pertinentes nesta fase inicial. A partir destes trabalhos o terapeuta poderá formular hipóteses que serão confirmadas ou não nos próximos trabalhos realizados pelo paciente. As questões terapêuticas se presentificarão para o arteterapeuta a partir de uma “colcha de retalhos”: retalhos oferecidos pela fala e imagens produzidas pelo paciente que o terapeuta costurará e usará como base para sua atuação.
            A técnica da arteterapia é específica por trabalhar com a imagem, ou seja, a “expressão não verbal”, uma forma de comunicação muito legítima, em que aspectos inconscientes são acessados e materializados, muitas vezes burlando a racionalização e a resistência do paciente. Devido a isto, não é raro de acontecer que no(s) primeiro(s) trabalhos de coleta de dados, o paciente produza uma imagem que conte para o terapeuta boa parte do caminho a ser percorrido ou conteúdos muito profundos, mas que ele esteja completamente  inconsciente disto. O arteterapeuta deve estar atento a este fenômeno aguçando sua escuta e seu olhar para o paciente.
Penso que devemos reconhecer a responsabilidade e a ética que especificamente a técnica da arteterapia nos impõe neste momento. É o paciente  quem irá dizer aonde está seu foco, escolher onde quer (pode) se aprofundar, aonde quer (pode) mergulhar a cada momento, a cada etapa deste caminho. Ao terapeuta cabe buscar sempre estar consciente de si, de suas ansiedades em sua atuação como profissional, lembrando que o foco orientador não deve estar em si mas em seu paciente. Uma boa estratégia é o arteterapeuta elaborar possíveis propostas ou técnicas que sejam pertinentes ao que o paciente trouxe, e mantê-las como “cartas na manga” que serão acionadas uma a uma a partir do que o próprio paciente apresentar como gancho.
Esta é uma jornada que pertence a cada sujeito, e cada um tem o seu tempo próprio. O terapeuta deve acompanhar este ritmo respeitando os limites e as resistências naturais de seu paciente. Lembro de um fragmento do final do texto “Repetir, Recordar e Elaborar” de Freud que citei no texto “A resistência na arteterapia” neste blog. Nele Freud relata sobre médicos principiantes na psicanálise que vinham pedir conselhos à ele sobre como lidar com a resistência do paciente. Em suas palavras:
“O médico nada mais tem a fazer senão esperar e deixar as coisas seguirem seu curso, que não pode ser evitado nem continuamente apressado.”

“Esta elaboração das resistências pode, na prática, revelar-se uma tarefa árdua para o sujeito em análise e uma prova de paciência para o analista. Todavia, trata-se do trabalho que efetua as maiores mudanças no paciente..."

segunda-feira, 9 de junho de 2014

SOBRE O INÍCIO DO PROCESSO ARTETERAPÊUTICO INDIVIDUAL (I)


Por Eliana Moraes

            Um arteterapeuta e um paciente (cliente). Primeira sessão. O que fazer? Como proceder? Que técnica utilizar? Como começar? Estas são questões surgidas no grupo de estudos “A prática da arteterapia” e estão sendo discutidas por nós. O arteterapeuta que chega com sua “bagagem” cheia de técnicas e propostas, como saber o que utilizar agora, no início do processo arteterapêutico individual?
            Sim, o trabalho individual se diferencia do que é realizado em aulas, vivências, workshops e grupos terapêuticos. Estes possuem uma proposta chamada semi-estruturada, ao qual o terapeuta apresenta um tema e/ou um disparador e os participantes se propõem a se pensar diante deste estímulo. É um trabalho mais diretivo, em que o arteterapeuta se presentifica mais no setting terapêutico.
            No processo individual o movimento é inverso. As questões e o ritmo devem ser dados pelo paciente. Ao terapeuta cabe ouvir (com tudo o que este termo contém), acolher, acompanhar e atuar com sua técnica e técnicas no passo a passo de seu paciente.
            Neste momento, não cabe qualquer proposta senão aquelas que tem como objetivo a coleta de dados. Uma excelente proposta para este início é a colagem com imagens de revista. Propostas como: “Escolha imagens que me contem um pouco sobre você.”, “Imagens que representam como você está chegando para este espaço.” Ou apenas “imagens que lhe chamem a atenção por algum motivo.”. Desta forma o paciente se apresentará e começará a falar de si e suas questões. Do que é dito em palavras e em imagens, o arteterapeuta receberá como “fios a serem puxados” no processo de seu paciente e são eles que orientarão o caminho à frente.
            De extrema importância é lembrar que este não é o momento de interpretações ou grandes devolutivas. Primeiramente porque o terapeuta não tem dados suficientes para tal em apenas uma sessão. Mas essencialmente porque o início de um processo terapêutico não é fácil para o paciente. Tomar esta decisão e estar ali já foi um grande trabalho. Além disto, o paciente ainda não conhece o terapeuta, não criou um vínculo, a transferência. Não pode se sentir invadido, desnudo. Antes disto, deve desenvolver uma confiança para que aceite a companhia do seu terapeuta no seu processo de auto-conhecimento.
            Isto me faz lembrar quando há algum tempo minha supervisora me disse: “o paciente chega para a terapia cheio de feridas e dores. Tem o desejo de tratá-las, por isto está ali. Mas elas doem, e por isso ele se defende com suas roupas, casaco, luvas, cachecol... Para tratá-las é necessário que se retirem todas estas proteções, mas quem deve retirá-las é o paciente a medida que se sente seguro e confiante para isto. Passo a passo, no seu tempo. Nunca passe a frente e arranque a roupa (as proteções) de seu paciente! Nunca o desnude! Caso contrário (o mínimo que pode acontecer) você o perderá.”

terça-feira, 3 de junho de 2014

Olhares Possíveis |Lições Singulares

Por Flávia Hargreaves


No último sábado, dia 31 de maio de 2014, tive a oportunidade de participar do ciclo de palestras Olhares, promovido pela Casa das Palmeiras (RJ), resgatando e compartilhando lições e emoções vividas 5 anos antes no ateliê de pintura como arteterapeuta recém formada, em clínica de apoio à saúde mental de linha lacaniana, no Rio de Janeiro.

Olhares Possíveis, título que dei à minha fala, trata da busca de novos olhares e caminhos possíveis, no âmbito da expressão plástica dentro deste recorte de apoio à saúde mental, utilizando como ferramentas o desenho e a pintura.

Minha atuação neste espaço buscou (1) estimular a expressão individual e espontânea em detrimento da produção de objetos utilitários de pouco valor expressivo; (2) valorizar o sujeito e o material produzido no ateliê, “olhando”, organizando e arquivando as imagens/obras; (3) estimular a autonomia com relação aos processos inerentes ao ateliê, como o acesso aos materiais, sua utilização e cuidados.

Descobri a importância do afeto catalisador a partir do estudo de textos e documentários de Nise da Silveira e na minha experiência de estar em contato com indivíduos tão singulares, termo que adotei recentemente a partir de conversas com Martha Pires, coordenadora de artes plásticas da Casa das Palmeiras.

Pois bem, lidar com pessoas tão singulares nos levam inevitavelmente a lições singulares. Afetam o nosso olhar, que precisa ser “limpo” para podermos voltá-lo para cada (série) imagem e cada autor. Sim, autor, as imagens falam de alguém, de um modo particular de estar no mundo, mundo este muitas vezes inacessível para o outro. Mas as imagens são poderosas e profundas, e por isso capazes de traduzir, em parte, este mistério que é o humano.

Entre as lições aprendidas estão (1) o reconhecimento do desafio de estar diante de um papel em branco, diante do vazio por vezes paralisante; (2) a importância do processo de construção da imagem que se sobrepõe à análise da imagem final; (3) como a imagem pode se manifestar na realidade concreta, se confundindo com a mesma.

Hoje, inicio uma nova jornada de aprendizado. Desta vez na Casa das Palmeiras, de linha junguiana, como colaboradora no ateliê de desenho e pintura.  Em meio a semelhanças e diferenças entre minha experiência passada e o contato direto com o método de Nise da Silveira, espero encontrar novos olhares e novos caminhos para trilhar.

Muito obrigada a todos os que colaboraram e colaboram para este novo desafio.


terça-feira, 27 de maio de 2014

Olhares: Casa das Palmeiras

por Flávia Hargreaves



Para os amantes da imagem, em especial aquelas criadas livremente, sem as amarras da Arte e seus discursos, imagens capazes de tornar visíveis as imagens do inconsciente, não podem perder esta oportunidade que a Casa das Palmeiras oferece abrindo suas portas todos os sábados até o dia 7 de junho para a exposição Olhares.

Além da exposição, o visitante poderá acompanhar o ciclo de palestras Olhares 2014, sempre aos sábados às 17 horas, promovendo a discussão sobre os diversos olhares sobre o tema.

"A Casa das Palmeiras é uma instituição sem fins lucrativos criada pela Dra. Nise da Silveira, em 1956, que utiliza as atividades expressivas como meio de reorganização do mundo interno. Segundo ela, as imagens são o meio mais direto para acessar o inconsciente e, também, o meio pelo qual o inconsciente consegue se expressar da maneira menos propensa a equívocos."

Olhares conta com a curadoria do Dr. Jean Pierre Hargreaves, psiquiatra e atual presidente interino da Casa das Palmeiras, e marca o início de uma série de iniciativas com o objetivo de divulgar os trabalhos desenvolvidos nos ateliês, além de incentivar o aprofundamento do estudo de imagens na área de saúde mental, através de palestras, cursos e grupos de estudo.

No dia 7 de junho às 16h, Martha Pires, coordenadora de artes plásticas da Casa das Palmeiras, apresenta a performance "Alegoria a Jaime". 

A exposição ficará aberta a visitação até dia 7 de junho, somente aos sábados.

Palestras

DIA 31 de maio - sábado às 17h
- Carlos Bernardi - analista junguiano, supervisor da Casa das Palmeiras - "Jung e o método Nise da Silveira"
- Patrícia Casqueiro Gois - artista teatral, especialista em Psicologia Junguiana - Arte e Imaginário, e coordenadora de teatro na Casa das Palmeiras - "A teatralidade do inconsciente"
- Flavia Hargreaves - arteterapeuta e professora de artes visuais - "Olhares possíveis"
Mediadora: Maria Teresa Martins - psicanalista e diretora técnica da Casa das Palmeiras.
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DIA 7 de junho - sábado às 17h
- Luiz Fernando Lobo - diretor teatral.
- Clara de Góes - psicanalista da Escola de Psicanálise Letra Freudiana; professora da UFRJ; e dramaturga  - "A poesia de lalingua"
Mediador : Jean Pierre Hargreaves - psiquiatra e presidente interino da Casa das Palmeiras.


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Local: Casa das Palmeiras
Rua Sorocaba 800 - Botafogo - Rio de Janeiro

Visitação: Sábados das 14h às 20h
Palestras: Sábados às 17h.

Tel.: 21 2266 6465
https://www.facebook.com/events/230029783854529/

segunda-feira, 19 de maio de 2014

"ARTETERAPIA: HISTÓRIA DA ARTE PARA QUÊ?" NO CONTEXTO ESCOLAR

  Henri Matisse. A Dança. 1909-10. Acervo Leningrado. Ermitage.

             O texto de hoje foi escrito por Mariana Cunha, aluna do curso "Arteterapia- História da arte para quê?" Módulo I: Pré-História e Primitivismo. Nele, Mariana articula ideias sobre a aplicabilidade do que vivenciou no curso em sua prática como professora de Artes Plásticas no contexto escolar, especificamente no ensino público, dando ênfase a dois pontos abordados no curso: Invasão e proteção / Domínio e identidade.
Bem-vinda Mari!


           Como professora de Artes Plásticas do Ensino Básico, considero a importância do aprendizado e da aplicação da Arteterapia em minhas aulas. Especialmente por lidar com crianças e adolescentes da rede municipal do Rio de Janeiro; indivíduos extremamente carentes. Meus alunos sofrem abusos psicológicos, físicos e até mesmo sexuais; além de um forte descaso familiar no que pertence ao afeto, ao cuidado da mente e do corpo.
O “primitivismo” traz consigo questões básicas e essenciais próprias de indivíduos que conviviam (convivem?) em grupos pequenos, em codependência e cooperação, e distantes das complexidades sociais que foram criadas conforme as tribos viraram povos e depois se transformaram em nações. Questões essas que foram sendo praticamente escorraçadas de nossas vidas, em uma tentativa de fugir ao máximo da animalidade, da emoção, do instinto e do desejo. Percebo uma fuga do tempo, quando tudo precisa ocorrer como se não houvesse um amanhã e o paradoxo de se viver para o futuro; a fuga da conexão entre tudo e todos, onde a individualidade é confundida com o individualismo; a fuga do olhar e do cuidar do outro.
Percebo diariamente a carência do primitivo em meus alunos e em suas famílias. Muitos confundem o termo com o sujo, com a falta de racionalidade e com a emoção pura. Porém, observando-se os indivíduos tribais ou “pré-históricos” noto o cuidado e defesa da prole até a independência e o encorajamento da mesma (hoje vejo o descaso quase que total na educação dos filhos), o respeito ao líder e o líder que respeita (hoje vejo pais e filhos se tratando à base de xingamentos e violência), dentre outros problemas. Isso tudo reflete diretamente dentro da escola nas relações aluno-professor e aluno-aluno. A seguir, considerações de pontos vistos no curso que mais despertaram minha atenção.

Invasão e proteção / Domínio e identidade
Percebo a invasão dos dois lados. Preciso estar atenta o tempo todo para não invadir ou ser invadida. Como os meus alunos são carentes e às vezes parecem enxergar em nós professores os seus tutores exigem atenção constante.
Essa questão deve ser vista dos dois lados: ao mesmo tempo que sinto a necessidade de também ensinar “por favores”, “obrigados” e “desculpas”, entendo que o resultado jamais será imediato. A paciência precisa ser exercitada o tempo todo e é importante cuidar para não invadir o outro com uma puxada de braço para entrar na fila, uma ameaça constante de castigo, uma humilhação e uma exposição pública. Entretanto, tais autoritarismos são frequentes na escola, ainda que de forma velada e negada pelos professores. E a invasão em mim acontece de duas formas: através da contaminação desses comportamentos “educacionais”, fazendo com que eu acabe agindo da forma que eu discordo; e através dos próprios alunos que me exigem sempre e me “contaminam” com suas carências afetivas, fazendo com que eu me envolva emocionalmente.

Por fim, relato brevemente uma aula experimental que acabou sendo pertinente às discussões sobre o círculo de proteção. Era uma turma de 1º ano do Ensino Fundamental do Ciep Almir Bonfim de Andrade, SME-RJ, com crianças entre 6 e 7 anos de idade. A aula foi simples: modelo vivo. A cada vez, um aluno faria uma pose simples para o restante da turma desenhar. Poderia ter deixado os alunos sentados em suas cadeiras mas optei por levá-los ao pátio e sentá-los em roda. Isso implicaria corridas e brincadeiras do tipo pega-pega e fugidas ao parquinho. Para evitar isso e não ter a necessidade de gritar, transformei a roda em algo lúdico. Quando consegui fazer com que todos sentassem em círculo, desenhei uma linha com giz em volta deles e disse: “quem sair do círculo vai pagar um mico no meio da roda”. Mesmo sendo “micos” muito leves, a introdução de uma regra com uma consequência para a desobediência os manteve dentro do círculo. Os tímidos evitaram sair. Os que queriam pagar o tal mico, jamais saíram correndo para fora do círculo: simplesmente levantavam um pouquinho para sentarem fora da linha e esperavam eu flagrar para enfim mandá-los ao centro e pagar a prenda. O círculo, enfim, serviu como uma proteção da própria aula. O ambiente ao redor deixou de ser sedutor, e todos ficaram atentos ao que estava sendo passado. O meu papel foi simplesmente ficar do lado de fora do círculo de giz, circundando os aluno, observando e incentivando os desenhos. Dessa forma, criei um segundo círculo de proteção.

Abaixo dois links de vídeos sugeridos por Mariana.

segunda-feira, 12 de maio de 2014

AS PRIMEIRAS IMAGENS - Pré- História e Primitivismo

                                                                 Trabalho de aluna do Módulo I (com sua autorização)

Por Eliana Moraes e Flávia Hargreaves

“... a arte pouco tinha a ver com ‘beleza’ e nada tinha a ver com contemplação estética ... : era um instrumento mágico, uma arma da coletividade humana em sua luta pela sobrevivência.” (FISHER, 1981. P.45)


Em maio de 2014, com muito orgulho, concluímos a primeira e iniciamos a segunda turma do curso:  “Arteterapia, História da Arte para quê? Módulo I”, que trata da arte pré-histórica e primitiva articuladas à prática da Arteterapia. Mais uma vez tivemos a oportunidade de constatar a riqueza deste material como disparador de processos terapêuticos tanto individuais como em grupo, percebendo claramente a identificação com nossos ancestrais mais remotos em padrões de comportamento, angústias e temores contemporâneos.


“[... ] ao recriar as formas em nossa percepção, nós as modificamos subjetivamente, com nosso enfoque vivencial, projetando nossas experiências e nossos valores para a época e mentalidades diferentes das nossas. Apesar de todas essas distorções inevitáveis, entretanto, ainda resta um núcleo central de significados. É justamente no sentido mais essencial da arte, no sentido de valores e da ampliação de estados de consciência, que os desenhos pré-históricos nos enriquecem e nos comovem, a ponto de parecer-nos atuais para nossos problemas existenciais hoje. Encontramos, nessas imagens, o ser humano que desde o início se defronta com a dimensão de sua consciência. Ele se percebe e sabe da própria condição humana.” (OSTROWER, 1983. p.298. grifo nosso)

A História da Arte nos oferece recursos para amplificar ideias, conceitos, afetos e imagens ao ampliar as questões e as demandas do cliente à uma dimensão para além da história individual e familiar, relacionando-as ao Humano. Esta humanidade que se revela ao longo dos milênios através de imagens. Entrar em contato com este homem pré-histórico significa entrar em contato com o momento em que o homem se percebe no mundo, capaz de transformar a natureza em algo que lhe é útil, criando novas formas, funções e significados. São os primeiros passos em direção à civilização, à cultura e à arte.

“Essa magia encontrada na própria raiz da existência humana, criando simultaneamente um senso de fraqueza e uma consciência de força, um medo da natureza e uma habilidade para controlá-la, essa magia é a verdadeira essência de toda a arte. O primeiro a fazer um instrumento, dando nova forma a uma pedra para fazê-la servir ao homem, foi o primeiro artista. O primeiro a dar um nome a um objeto, a individualizá-lo em meio a vastidão indiferenciada da natureza, a marcá-lo com um signo e, pela criação linguística, a inventar um novo instrumento de poder para os outros homens, foi também um grande artista. O primeiro a organizar uma sincronização para o processo de trabalho por meio de um canto rítmico e a aumentar, assim, a força coletiva do homem, foi um profeta na arte. O primeiro caçador a se disfarçar, assumindo a aparência de um animal para aumentar a eficácia da técnica da caça, o primeiro homem da idade da pedra que assinalou um instrumento ou uma arma com uma marca ou um ornamento, o primeiro a cobrir o tronco de uma árvore ou uma pedra grande com uma pele de animal para atrair outros animais da mesma espécie – todos esses primeiros foram os pioneiros, os pais da arte.” (FISCHER, 1981. p.42)

Em breve estaremos iniciando o segundo módulo: Antiguidade Clássica e Classicismo, seguindo a jornada deste homem no caminho da civilização.


“Ao se afastar, mais do que os outros animais, das condutas determinadas pela espécie, ao quebrar laços instintivos que determinam sua conduta, o homem passou a estar condenado a própria liberdade: ele deve agora limitar a si mesmo, deve construir para si mesmo as determinações antes impostas pela natureza. Era este o sentido da palavra liberdade quando surgiu na Grécia antiga. [...] O homem é um ser que cria limitações para si mesmo. Sua grande liberdade é dizer não a si mesmo.” (MOSÉ, 2012. P.28).


Curso:
Arterapia: História da Arte para quê?
Módulo 1: Pré-história e primitivismo
Módulo 2: Antiguidade clássica e classicismo

Informações e inscrições: elianapsiarte@gmail.com


Referências Bibliográficas:
FISCHER, Ernst. A Necessidade da Arte. 8ª ed. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1981.
MOSÉ, Viviane. O Homem que sabe. 4ªed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2012.

OSTROWER, Fayga. Universos da Arte. Rio da Janeiro: Editora Campus, 1983.