segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

TRANSITANDO ENTRE OS SABERES – A Arteterapia no atendimento de famílias


Hoje o blog Não Palavra dá início ao projeto “Não Palavra abre as portas” recebendo Mércia Maciel, estudante de Arteterapia no Rio de Janeiro, que compartilha conosco seu estudo do livro “Arteterapia para Famílias”.
Bem vinda, Mércia!

Por Mércia Maciel
mercia.m@terra.com.br

A partir da minha experiência no atendimento de famílias em minha prática como assistente social, fui atraída pelo livro “Arteterapia Para Famílias”, da escritora norte-americana Shirley Riley, quando o vi na estante de uma livraria, alguns anos atrás. Anos antes de iniciar o curso de Arteterapia, já nutria muito interesse pelo uso da arte como forma de terapia. Na época, porém, em que o adquiri, não me dediquei muito à sua leitura, pois estava envolvida com outras atividades e fiz apenas uma “leitura dinâmica”.  Hoje, com o olhar de quem estuda a Arteterapia, resolvi relê-lo e isso realmente renovou meu entusiasmo tanto pelo atendimento de famílias quanto pela Arteterapia em si.
Apesar de ser um tema discutido há décadas nos Estados Unidos, a rica troca de saberes entre as duas áreas se mostra mais do que nunca um território fértil para a pesquisa, importante para própria produção teórica em Arteterapia - uma vez que é, ela própria, resultado de uma interseção de saberes - na discussão daquilo que lhe é específico teórica e metodologicamente, como também na identificação de novos campos de trabalho. O desafio dos arteterapeutas, mais do que isso, é fazê-lo de modo a não compartimentalizar esse saber, como convém à verdadeira Transdisciplinaridade*.
Neste texto trago a resenha do livro “Arteterapia para famílias” de Shirley Riley, lançado no Brasil pela Summus Editorial, São Paulo, 1998.
Arteterapeuta e terapeuta de família, a autora parte do objetivo de demonstrar seu entusiasmo pelo processo de Arteterapia Clínica integrada às teorias de prática familiar. Ao longo de todo o livro ela apresenta discussões de casos que ilustram sua prática, ao mesmo tempo que articula com clareza a teoria que a sustenta, numa perspectiva de caso a caso.
Outro ponto importante do livro é a preocupação da autora com a dimensão social do comprometimento profissional no tratamento com sua clientela, propondo soluções práticas para as demandas do atendimento na esfera pública.
Sendo a publicação original do livro nos Estados Unidos do ano de 1994, seu potencial de instigar trocas entre os campos de saberes continua muito atual, na medida em que propõe o exercício de uma transdisciplinaridade possível e necessária diante dos desafios diários que suas práticas profissionais apresentam.Como arteterapeuta e terapeuta de família, Shirley Riley desafia, por exemplo, a noção de que as palavras usadas em Arteterapia não são essenciais e, baseada em sua longa experiência clínica, nos convida a renunciar às velhas metodologias e ir ao encontro do que considera um modo pós-moderno de pensar e conduzir a terapia.
O livro se divide em três partes:
1-Arteterapia Familiar: integrando a teoria e a prática. Apresentando-se como adepta do Construtivismo Social, a autora reflete sobre sua prática, demonstrando como as ilustrações das histórias das famílias podem construir a essência da terapia. Assim, passeia pelos principais autores em Terapia Familiar e suas teorias, sempre na perspectiva de que, a partir das produções de arte de cada família, poderá não só fazer um diagnóstico mais rápido e efetivo, como também entender a melhor abordagem teórica e metodológica a ser utilizada com cada uma. Baseada em sua longa experiência como arteterapeuta e terapeuta de família, prefere adotar uma postura que pode ser considerada eclética, no sentido pós-moderno do termo, criando em “co-autoria” com a família, através da produção desta, o melhor caminho a ser seguido.
2- Trabalhando com populações específicas: Apresenta desafios específicos no tratamento: famílias com membros com deficiência, a terapia de grupo multifamiliar, famílias de adolescentes X pais com conflitos não resolvidos em sua própria adolescência. Discute também a importância da Arteterapia como tratamento de escolha com famílias que vivenciaram violência doméstica; as razões clínicas e práticas para o uso da Arteterapia como modalidade bem sucedida a ser incluída nos serviços ambulatoriais.
3- Arteterapia e sociedade pós-moderna: A autora discute as mudanças sociais vivenciadas nas últimas décadas que romperam com antigos modos de vida e se impuseram também sobre as famílias. Os diferentes tipos de constituição familiar dos dias atuais e a necessidade de se criar novas estratégias para responder às suas questões específicas, impondo uma conscientização sobre a “desconstrução” de antigos modos de conhecer, assim como a necessidade de construir novas concepções de Arteterapia para o futuro. Apresenta também um quadro sobre a realidade do mundo dos provedores de Saúde Mental na década de 90, nos Estados Unidos.
            Todas as seções são antecedidas por excelentes comentários da também arteterapeuta Cathy A. Malchiodi, que orienta o leitor através dos caminhos criados pela autora em sua produção teórica.
Recomendo entusiasticamente a leitura e a rica discussão que, acredito, será suscitada por ela.


Caso você tenha se identificado com a proposta do “Não palavra abre as portas” e se sinta motivado a aceitar o nosso convite, escreva para naopalavra@gmail.com

Assim poderemos iniciar nosso contato para maiores esclarecimentos quanto à proposta, ao formato do texto e quem sabe para um amadurecimento da sua ideia.

A Equipe Não Palavra te aguarda!


* A expressão citada refere-se ao conceito de transdisciplinaridade proposto pelo filósofo Edgar Morin: MORIN, E Ciência com Consciência. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1996
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Sobre a autora:
Mércia Maciel

Assistente Social pela UFF (1994), pós-graduanda em Arteterapia e Processos de Criação pela UVA.
Experiência como assistente social: atendimento de família, dependência química, e crianças em situação de abuso.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

SOBRE UMA OBSERVAÇÃO INTUITIVA


Por Eliana Moraes


Dentro dos meus estudos em psicanálise, tenho me dedicado ao texto “À guisa de Introdução ao Narcisismo” escrito por Freud em 1914. Durante esta leitura tenho exercitado duas escutas: a primeira para o conteúdo teórico em si, mas paralelamente ao manejo de Freud em sua articulação teórica e escrita.
Este texto é um dos pilares da teoria psicanalítica e ponto de partida para tantas linhas de raciocínio posteriores na Psicanálise. Mas ao longo do texto Freud deixa claro que  enquanto escreve, está construindo suposições a partir de sua observação clínica. Nele encontramos expressões como “é provável” ou “é possível”, “tal hipótese é útil”, “podemos considerar”...
Freud esclarece seu procedimento ao se ver  diante da inexistência de alguma teoria sobre as pulsões, afirmando que assim sendo:
“... nos é permitido, ou mesmo necessário, elaborar alguma suposição inicial e aplicá-la de modo coerente até que ela fracasse ou se confirme.”
Mas reconhecedor da possibilidade do equívoco ao longo deste processo, afirma:
“Contudo, também serei coerente o bastante para abandonar esta hipótese se, a partir do próprio trabalho psicanalítico, surgir outra premissa sobre as pulsões que se mostre mais apropriada.”
Naturalmente o exercício do levantamento de hipóteses não se dava gratuitamente, mas absolutamente a partir da observação clínica de Freud, ao qual ressalta a importância da prática de “uma ciência construída sobre a interpretação de dados empíricos.”
Assim, sobre a o devido valor da observação e da formação de ideias, Freud conclui:
“... a ciência se dará por satisfeita com ideias básicas, nebulosas e ainda difíceis de visualizar, sempre, porém, com a esperança de mais adiante, no decorrer de seu desenvolvimento, vir a apreender tais ideias com mais clareza, mostrando-se ainda disposta a eventualmente trocá-las por outras. Afinal, o fundamento da ciência não são as ideias, mas sim a observação pura sobre a qual tudo repousa. Elas [as ideias] não são a base mas o topo do edifício, e podem, sem prejuízo, ser substituídas e removidas.” 

Por que citar Freud e seu texto “A guisa de Introdução ao Narcisismo”?

No texto que escrevo hoje, não cabe o aprofundamento dos conceitos da teoria psicanalítica. Mas trata-se de um teórico ao qual escolhi estudar, e que sua disponibilidade me inspira quanto à flexibilidade do pensar e ao autorizar-se a articular, a partir de sua observação clínica.

Ler sobre as articulações de Freud me fez lembrar meu percurso na Arteterapia e no blog Não Palavra. Esta empreitada só deu seus primeiros passos quando decidi estudar e observar intuitivamente cada momento da minha prática na Arteterapia, seja na clínica individual ou grupal, no Hospital Adventista Silvestre ou na clínica particular, nos cursos, palestras e supervisões.  Em paralelo me propus a registrar minhas percepções e a compartilhar com aqueles interessados em dialogar.

Para manter-me consciente do meu propósito, inseri como subtítulo do blog o “Pensando a Arteterapia”. A palavra “pensando” colocada no gerúndio, deixa clara a premissa a partir da qual me autorizei a iniciar este ousado projeto: este é um caminho de reflexão, um processo ao qual se faz necessário abrir mão da (falsa) segurança do “está pronto”. Esta proposta inclusive me permite escrever e mais à frente me retificar caso seja necessário.

E este é o convite ao qual desejo estender aos amigos do blog Não Palavra. Que neste ano se lancem à prática da Arteterapia em suas diversas modalidades e que em paralelo exercitem sua observação intuitiva. Que para sedimentar suas articulações, escrevam sobre suas percepções, intuições, hipóteses, teorizações, sem a preocupação excessiva de chegar ao “pronto” - não existe “o pronto”, existe o caminho trilhado até hoje. Que tentem dialogar suas ideias com teóricos que já estiveram em algum lugar similar. E que por fim, compartilhem seus escritos com seus pares, pois o outro é peça fundamental neste percurso ao fazer espelhamento e devolutivas que nos mostrem pontos cegos, fure nossas certezas e nos motive a continuar buscando.

Na última semana lançamos o “Não Palavra abre as portas”, convidando aos arteterapeutas, estudantes e demais interessados pela arte e seus desdobramentos, para que sejam parceiros coautores do blog escrevendo textos e compartilhando suas articulações. (Ver texto anterior)

Que em 2017 o blog Não Palavra seja um espaço de registros de estudos e práticas em Arteterapia. E que os que acreditam nela, possam se lançar à sua prática com a mais aguçada e intuitiva observação.

Caso você tenha se identificado com a proposta do “Não palavra abre as portas” e se sinta motivado a aceitar o nosso convite, escreva para naopalavra@gmail.com
Assim poderemos iniciar nosso contato para maiores esclarecimentos quanto à proposta, ao formato do texto e quem sabe para um amadurecimento da sua ideia.

A Equipe Não Palavra te aguarda!

Referências Bibliográficas:

SIGMUND, Freud. À guisa de Introdução ao Narcisismo. Obras completas, 1914.


segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017

NÃO PALAVRA ABRE AS PORTAS


Por Eliana Moraes

Em 2017 o blog Não Palavra inicia seu quinto ano de atividade em produção de textos que se propõem a pensar a Arteterapia. Ao longo deste percurso podemos identificar algumas fases, de um blog que começou como um diário de bordo pessoal, até os dias de hoje em que está estabelecida uma produção semanal de textos sobre as teorias e a prática da Arteterapia. De pequenas postagens que eram acompanhadas por amigos e pessoas próximas, até hoje em que cada publicação tem atingido a média de mil visualizações por pessoas de vários lugares do Brasil!

Já há algum tempo venho pensando sobre como o exercício da escrita sobre minhas articulações na Arteterapia, que começou de forma tão despretensiosa e foi tomando proporções inesperadas, foi me construindo e constituindo como profissional, e porque não como pessoa. Em meio a esta reflexão, pensava quão interessante seria estimular que outras pessoas se propusessem a um desafio semelhante e experimentassem suas próprias surpresas e descobertas.

Sendo assim, neste ano o blog Não Palavra abre as portas para arteterapeutas, estudantes e interessados que tenham um desejo guardado e/ou ativo de se lançarem ao desafio da escrita. Hoje, o Não Palavra faz um convite aos amigos e parceiros que até aqui nos acompanharam pela leitura, para que se tornem coautores deste espaço de articulação de ideias sobre a Arteterapia.

Assim, desenvolvemos algumas linhas de pesquisa e orientações para balizar aos que aceitarem o desafio tão instigante da escrita.

LINHAS DE PESQUISA

1)    Arteterapia: aspectos teóricos e articulações em suas especificidades:
Embora a Arteterapia faça interseção com diversos outros saberes, ela possui sua identidade própria, seu corpo teórico e prático próprios. Nesta linha de pesquisa cabe a exposição e articulação de ideias quanto àquilo que é próprio da Arteterapia, contribuindo para seu fortalecimento como saber e profissão.

2)    Arteterapia e outros saberes:
Uma das maiores características da Arteterapia se dá em seu grande potencial para dialogar com diversos outros saberes, como a Psicologia, Psicanálise, Medicina, Filosofia, Educação, Terapia Ocupacional, Teoria e História da Arte e outros. Nesta linha de pesquisa cabe a articulação entre a Arteterapia e outros saberes que possam contribuir para sua articulação teórica e instrumentalização dos profissionais que nela atuam.

3)    Resenhas de literatura em Arteterapia e/ou saberes relacionados:
Para que o arteterapeuta se instrumentalize para uma atuação consistente é necessária a dedicação em um estudo aprofundado das teorias da Arteterapia e outros saberes relacionados. Esta linha de pesquisa tem como objetivo a sugestão de literaturas ou referências que possam colaborar para a formação do profissional de Arteterapia. Aqui o autor fará uma resenha apresentando um livro ou outras referências como vídeo, filme, exposição ou espetáculo que tenha contribuído para seu estudo, pesquisa e prática em Arteterapia.

4)    Práticas em Arteterapia:
Para o fortalecimento da profissão Arteterapia em nosso país, é essencial que a classe invista em sua prática propriamente dita. Sabemos que a Arteterapia pode contribuir amplamente em sua riqueza de possibilidades para o coletivo/social. Desta forma, esta linha de pesquisa tem como objetivo a visibilidade, o relato e a troca de experiências quanto às diversas práticas existentes em Arteterapia em todo o Brasil.

Meu desejo é que o blog Não Palavra se faça cada vez mais como um espaço de pesquisa em Arteterapia. Assim, acredito que o “Não Palavra abre as portas” venha para somar a todos: aos autores desafiados pela escrita, ao blog que será beneficiado com a pluralidade de articulações e à Arteterapia pelo estímulo à pesquisa e produção textual, elementos tão importantes para o fortalecimento da profissão.

Caso você tenha se identificado com esta proposta e se sinta motivado a aceitar o nosso convite, escreva para naopalavra@gmail.com
Assim poderemos iniciar nosso contato para maiores esclarecimentos quanto à proposta, ao formato do texto e quem sabe para um amadurecimento da sua ideia.


A Equipe Não Palavra te aguarda!