segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

SOBRE UMA OBSERVAÇÃO INTUITIVA


Por Eliana Moraes


Dentro dos meus estudos em psicanálise, tenho me dedicado ao texto “À guisa de Introdução ao Narcisismo” escrito por Freud em 1914. Durante esta leitura tenho exercitado duas escutas: a primeira para o conteúdo teórico em si, mas paralelamente ao manejo de Freud em sua articulação teórica e escrita.
Este texto é um dos pilares da teoria psicanalítica e ponto de partida para tantas linhas de raciocínio posteriores na Psicanálise. Mas ao longo do texto Freud deixa claro que  enquanto escreve, está construindo suposições a partir de sua observação clínica. Nele encontramos expressões como “é provável” ou “é possível”, “tal hipótese é útil”, “podemos considerar”...
Freud esclarece seu procedimento ao se ver  diante da inexistência de alguma teoria sobre as pulsões, afirmando que assim sendo:
“... nos é permitido, ou mesmo necessário, elaborar alguma suposição inicial e aplicá-la de modo coerente até que ela fracasse ou se confirme.”
Mas reconhecedor da possibilidade do equívoco ao longo deste processo, afirma:
“Contudo, também serei coerente o bastante para abandonar esta hipótese se, a partir do próprio trabalho psicanalítico, surgir outra premissa sobre as pulsões que se mostre mais apropriada.”
Naturalmente o exercício do levantamento de hipóteses não se dava gratuitamente, mas absolutamente a partir da observação clínica de Freud, ao qual ressalta a importância da prática de “uma ciência construída sobre a interpretação de dados empíricos.”
Assim, sobre a o devido valor da observação e da formação de ideias, Freud conclui:
“... a ciência se dará por satisfeita com ideias básicas, nebulosas e ainda difíceis de visualizar, sempre, porém, com a esperança de mais adiante, no decorrer de seu desenvolvimento, vir a apreender tais ideias com mais clareza, mostrando-se ainda disposta a eventualmente trocá-las por outras. Afinal, o fundamento da ciência não são as ideias, mas sim a observação pura sobre a qual tudo repousa. Elas [as ideias] não são a base mas o topo do edifício, e podem, sem prejuízo, ser substituídas e removidas.” 

Por que citar Freud e seu texto “A guisa de Introdução ao Narcisismo”?

No texto que escrevo hoje, não cabe o aprofundamento dos conceitos da teoria psicanalítica. Mas trata-se de um teórico ao qual escolhi estudar, e que sua disponibilidade me inspira quanto à flexibilidade do pensar e ao autorizar-se a articular, a partir de sua observação clínica.

Ler sobre as articulações de Freud me fez lembrar meu percurso na Arteterapia e no blog Não Palavra. Esta empreitada só deu seus primeiros passos quando decidi estudar e observar intuitivamente cada momento da minha prática na Arteterapia, seja na clínica individual ou grupal, no Hospital Adventista Silvestre ou na clínica particular, nos cursos, palestras e supervisões.  Em paralelo me propus a registrar minhas percepções e a compartilhar com aqueles interessados em dialogar.

Para manter-me consciente do meu propósito, inseri como subtítulo do blog o “Pensando a Arteterapia”. A palavra “pensando” colocada no gerúndio, deixa clara a premissa a partir da qual me autorizei a iniciar este ousado projeto: este é um caminho de reflexão, um processo ao qual se faz necessário abrir mão da (falsa) segurança do “está pronto”. Esta proposta inclusive me permite escrever e mais à frente me retificar caso seja necessário.

E este é o convite ao qual desejo estender aos amigos do blog Não Palavra. Que neste ano se lancem à prática da Arteterapia em suas diversas modalidades e que em paralelo exercitem sua observação intuitiva. Que para sedimentar suas articulações, escrevam sobre suas percepções, intuições, hipóteses, teorizações, sem a preocupação excessiva de chegar ao “pronto” - não existe “o pronto”, existe o caminho trilhado até hoje. Que tentem dialogar suas ideias com teóricos que já estiveram em algum lugar similar. E que por fim, compartilhem seus escritos com seus pares, pois o outro é peça fundamental neste percurso ao fazer espelhamento e devolutivas que nos mostrem pontos cegos, fure nossas certezas e nos motive a continuar buscando.

Na última semana lançamos o “Não Palavra abre as portas”, convidando aos arteterapeutas, estudantes e demais interessados pela arte e seus desdobramentos, para que sejam parceiros coautores do blog escrevendo textos e compartilhando suas articulações. (Ver texto anterior)

Que em 2017 o blog Não Palavra seja um espaço de registros de estudos e práticas em Arteterapia. E que os que acreditam nela, possam se lançar à sua prática com a mais aguçada e intuitiva observação.

Caso você tenha se identificado com a proposta do “Não palavra abre as portas” e se sinta motivado a aceitar o nosso convite, escreva para naopalavra@gmail.com
Assim poderemos iniciar nosso contato para maiores esclarecimentos quanto à proposta, ao formato do texto e quem sabe para um amadurecimento da sua ideia.

A Equipe Não Palavra te aguarda!

Referências Bibliográficas:

SIGMUND, Freud. À guisa de Introdução ao Narcisismo. Obras completas, 1914.


2 comentários:

  1. Eliana, muito bom este texto! Excelente reflexao! Um convite, desafio que aumentou meu desejo de prestar mais atençao ao meu redor e registrar tudo que for possivel ...Compartilhar conhecimento é o melhor caminho para o crescimento....

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    1. Obrigada pelo seu compartilhar Tania!
      Que 2017 seja um ano de muitas trocas!
      Um beijo!

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