Por
Suzane Guedes – RJ
Ser uma recém-formada em arteterapia quase veterana em
psicologia após 10 anos de formação tem suas vantagens e desvantagens. Como
tudo na vida, ok. Porém há que se tomar cuidado com as paralisações e os
excessos, em ambos os caminhos, as escolhas, os estudos e criações.
Já há algum tempo tenho refletido sobre o caminho do
equilíbrio e o quanto este me deu um suporte na vida. Sim, este equilíbrio é
totalmente subjetivo, faz sentido para mim, e faz sentir também.
E é nesse caminho do sentir, do sentido, que gosto de
caminhar com a arteterapia e a psicologia. Então sejamos francos, este caminho
está sim mais próximo da primeira função, do sentir. A arteterapia aponta-se
como uma necessidade na alma, e no campo dos sentidos, na pele. Não é por acaso
que Jung foi além das questões cientificamente comprovadas e deu tanto espaço
para o sentir e para arte para o entendimento e cuidados humanos.
Quem
está interligado e entrelaçado pela arte sente sua falta em seu organismo, como
uma abstinência mesmo. Vocês não sentem assim? Eu sinto. Por exemplo, estou
angustiada pois sei que preciso fazer um trabalho de colagem, tem alguma
resposta que preciso ter e intuitivamente sei que virá de lá. E a escrita? Como
ela liberta, como é fascinante. E quando preciso fluir em algo de meus
sentimentos, necessito logo de uma aquarela. Foi uma comunicação desenvolvida e
aprendida que hoje percebo sua falta e fala quando me é distanciada.
E em
um desses momentos de falta, da tão singular falta que nos move, fui ao cinema
assistir Com amor, Van Gogh. O filme
polonês de 2017 conta um pouco da trajetória do pintor Vincent Van Gogh, suas relações pessoais e familiares, sua obra, seus
estados de angústia, melancolia e sua morte.
Na
minha visão de psicóloga-arteterapeuta não pude deixar de me tocar por dois
mundos apresentados belamente nesta história. O mundo das artes, visto que o
filme é todo feito em animação a partir de pinturas a óleo por 125 pintores,
seguindo o mesmo estilo do próprio pintor homenageado. Incrível.
Por
outro lado, características da personalidade do autor permeiam a trama
mostrando os caminhos que o levaram às suas produções, suas formas de se
relacionar e sua própria forma de ser e estar no mundo.
O pai
da arte moderna sentia muito. Sua sensibilidade o levou a criar genialidades
artísticas que talvez tenham o salvado por algum tempo. Mas sua dor e talvez
não-entendimentos de si mesmo e do mundo o tenham levado à melancolia. Em suas
cartas, escritas em um período de sua vida que viveu em Arles na França, Van
Gogh se descreve com um estado de espírito melancólico.
O
pintor se vê como um artista atormentado, mas com caminhos que oscilam entre a
ansiedade e a calma, podendo estes estados serem vistos em suas obras, como o
próprio artista relata em um período em que estava internado: “Esta combinação, de ocre vermelho, de verde
entristecido pelo cinza, de traços negros que cercam os contornos, produz um
pouco a mesma sensação de angústia de que frequentemente sofrem alguns de
nossos companheiros de infortúnio, e que chamamos de ‘negro-vermelho’. E em
outra: “Uma outra tela representa um sol
nascendo sobre um campo de trigo novo; linhas fugidias, sulcos subindo ao alto
da tela, contra uma muralha e uma fileira de colinas lilás. O campo é violeta e
amarelo-esverdeado. O sol branco é cercado por uma grande auréola amarela.
Nisto tudo eu tentei, por contraste com a outra tela, exprimir a calma, uma
grande paz...”
As
cores, traços, luzes e contornos foram companheiras de Van Gogh, infelizmente
não foram suficientes para amparar suas profundas angústias existenciais, mas o
proporcionam auxílio e identidade no mundo. E como sua fala é trazido no filme:
“Talvez a morte de um artista não seja a
parte mais triste”. E ainda assim, mesmo pós morte, conseguiu realizar seu
propósito: “Quero comover as pessoas com
a minha arte”.
E o
que é a arte afinal, senão uma forma de comunicação, rebeldia, aproximação aos
nossos próprios sentimentos e emoções. Amparo e transformações de dores,
fortalecimento pessoal e autoconhecimento.
E que
“a arte nos aponte uma resposta mesmo que
ela não saiba”, mas muitas vezes a Arteterapia promove sim este saber.
Com
carinho e gratidão, Suzane.
Caso você tenha se identificado com a proposta do “Não palavra abre as portas” e se sinta motivado a aceitar o nosso convite, escreva para naopalavra@gmail.com
Assim poderemos iniciar nosso contato para maiores esclarecimentos quanto à proposta, ao formato do texto e quem sabe para um amadurecimento da sua ideia.
A Equipe Não Palavra te aguarda!
Referências:
VAN GOGH, Vicent. Cartas a Theo. Edição ampliada, anotada e ilustrada. São
Paulo: Coleção L&PM Pocket, 2002.
COM
amor, Van Gogh. Direção: Dorota Kobiela e Hugh Welchman. Polônia,
2017. 1 filme (1h 35min). Título original: Loving Vicent. Distribuidor: Europa
filmes.
Sobre a autora: Suzane Guedes
Suzane
Guedes é Psicóloga (CES-JF), Especialista em Psicologia e Desenvolvimento
Humano (UFJF) e Arteterapeuta (POMAR).
Colunista
no blog O psicólogo Online, no qual escreve sobre Autoestima.
Atua
nas cidades do Rio de Janeiro e Três Rios-RJ com atendimento clínico presencial
a crianças, jovens, adultos e idosos; ministra grupos e oficinas terapêuticas.
Também trabalha como orientação psicológica online.
Suzane
acredita na psicoterapia e arteterapia como grande ferramenta de auxílio à
transformação e desenvolvimento pessoal e social.
Facebook: https://www.facebook.com/olharparasi/Atendimento online: http://www.atendimento.opsicologoonline.com.br/suzane-guedes
Instagram: @olharparasi
"Caminhos que oscilam entre a ansiedade e a calma..." Van Gogh sabia das coisas! Êta vida que é mesmo uma obra de arte em permanente construção, com suas cores, nuances, sons e timbres que nos revelam para o outro!
ResponderExcluirConcordo, a vida é uma obra de arte com muitas tonalidades e possibilidades. Grata pelo comentário! Suzane.
ExcluirGostei muito de sua fala Suzane, tenho em mim um desejo imenso de fazer uma especialização em Arteterapua(sou pedagoga), temos um grupo de mulheres aqui em Ourinhos, Bordado e Prosa, que na funciona como terapia grupal, biirdamos e proseamos muito. Mas sinto falta de ferramentas adequadas para a condução de alguns encontros. Muito bom o seu texto, de alguma forma nos libertarmos nos emaranhados das linhas e tecidos, cada uma com sua história.
ResponderExcluirUm grande abraço.
Tânia
Olá Tânia, fico feliz que tenha gostado!
ExcluirO bordado permite grandes construções e desconstruções pessoais. Imagino a riqueza do seu grupo!
Outro abraço! Suzane