Por Rosangela Nery - RJ
Sigo
compartilhando o relato sobre o projeto que participo, onde a proposta é atender as
comunidades ribeirinhas na Região do médio Rio Negro (Manaus-AM). (Para ler o primeiro texto CLIQUE AQUI). Entendendo a
integralidade do cuidado oferecida pelo SUS, esse grupo também estende o
cuidado espiritual para as comunidades, compartilhando um dos maiores e
melhores instrumentos de cuidado: O AMOR. O Amor que torna possível olhar de
forma singular para o sujeito e todas as suas limitações.
Hoje
trago para dividir com vocês, o encontro com A.S, uma jovem adolescente de 17
anos, estudante do 2º ano do ensino médio, e que segundo, sua família, não saía
do quarto há pelo menos dois anos, a não ser para ir até a escola. Várias
opiniões acerca do que A.S tinha apareceram, mas, a fala de que ela estava com
“depressão” era unânime.
Que
desafio!!! O que será possível fazer durante tão pouco tempo, afinal, só
estaria por ali nos próximos dez dias. Pensando na singularidade de cada
sujeito e o pouco que sabia da história de A.S, decidi marcar um primeiro
encontro com seus pais e uma das grandes preocupações deles era a tristezas e a
introspecção de A.S, que a mantinha dentro do quarto por muito tempo, sem que eles
tivessem acesso ao que poderia ser a causa de tal postura. No momento que
estava me despedindo dos pais, A.S. chegou da escola e com a voz quase
inaudível me cumprimentou com um boa noite. Nesse momento me apresento e
pergunto se poderia vir em outra hora para conversarmos um pouco. A.S aceita e sugere o dia seguinte às quatorze
horas e é nesse horário que chego com meus materiais de arte, incluindo a pequenina
caixinha de som. Ela me recebe na mesa da sua sala e nesse momento peço licença
para dispor os materiais.
Uma das linguagens da arte:
A MÚSICA
A
música tem sido facilitadora no processo de formação de vínculo quando
associada à recordações, mensagens contidas que podem ser associadas ao
cotidiano e muitas vezes esquecidas ou apagadas pelo sofrimento psíquico.
Inicialmente
A.S não conseguia falar muito, as perguntas eram respondidas pontualmente sem
mais outras informações. Após quinze minutos com ela, perguntei se gostava de
música e foi impressionante perceber a mudança no seu olhar, nos gestos... Outras
linguagens foram ativadas e a partir de então, A.S pôde falar a mim através da sua
playlist.
Compartilhamos
nossas playlists e assim ela foi produzindo uma colagem de apresentação
com imagens e ao som de suas escolhas musicais. Quanta potência!!! Quantas
conexões foram possíveis através da música. A.S está passando por sofrimentos
próprios do “adolescer” e a falta de vinculação, de relação e interação com
outros pares corrobora para trazer mais sofrimento durante o processo de “adultificação”,
afinal, A.S está perto de fazer 18 anos.
Com
relação a potencialidade terapêutica, verificou-se que a música colabora na
constituição de vínculos e no desenvolvimento de mudanças pessoais e coletivas.
Conclui-se que a música promove a expressão de emoções, percepção da realidade
e sua utilização no contexto terapêutico favorece o equilíbrio interno e
facilita espaços de troca. (BATISTA, RIBEIRO, 2016, p. 336-341)
Atendi
A.S por mais dois dias durante o período que estive na comunidade, trocamos
telefone e deixei o canal aberto caso A.S quisesse continuar os atendimentos on-line.
Finalizo essa partilha dividindo um pouco da minha alegria e gratidão, pois, há
pouco mais de um mês recebi um mensagem sua perguntando se eu poderia ouvi-la. Desde
então seguimos juntas, na modalidade online, construindo e reconstruindo
possibilidades para seguir em frente.
Psicóloga, especialista em Ciência, Arte e Cultura na saúde pelo IOC - Instituto Oswaldo Cruz - FIOCRUZ e em Saúde Mental e atenção Psicossocial pela ENSP - Escola Nacional de saúde pública - FIOCRUZ.
Estudante de Arteterapia no Instituto Faces.
Atendimento individual à adolescentes e adultos no Espaço Recriar-se, RJ.
Diretora do Núcleo de desinstitucionalizacão Franco da Rocha no Instituto Municipal de Assistência a saúde Juliano Moreira/RJ.
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