segunda-feira, 3 de fevereiro de 2020

ORAÇÃO PARA 2020



Por Eliana Moraes
naopalavra@gmail.com
Instagram @naopalavra

O blog Não Palavra esteve de férias desde dezembro do último ano. E como de costume utilizo este tempo para um recolhimento. Este movimento de introversão me é útil para recarregar as energias, refletir sobre o caminho percorrido durante o ano e aguçar a intuição para os passos que estão por vir.
Encerramos o ano com o lançamento do livro “Pensando a Arteterapia Volume 2” e neste período de introspecção pude relê-lo alcançando um olhar mais distanciado para o que ele constelou. Nele está registrado uma etapa do meu percurso em que estive bastante instigada a pensar e estimular que o arteterapeuta se aproprie do seu lugar:

Tenho-me dedicado à conscientização do arteterapeuta como portador da sensibilidade tão singular do artista, como aquele que capta, percebe, compreende, expressa e traduz para as mais variadas linguagens da arte as questões mais profundamente humanas, mas especialmente aquele que exerce a função de oferecer a arte e sustentar um território “sagrado” para que ela aconteça. Penso que a tomada de consciência sobre a profundidade, responsabilidade e convocação que tal função nos permite seja essencial para a construção de um arteterapeuta. (MORAES, 2019, 129-130)

Já nas últimas páginas do livro reconheço a minha contribuição pessoal:

Esse caminho de desenvolvimento da sensibilidade artística é absolutamente íntimo e pessoal. E aqui reforço meu incentivo para que cada arteterapeuta participe desse esvaziamento de si e (se) ouça como pode exercer seu ofício, oferecendo os materiais e estímulos que o social nos pede. Neste texto, compartilho a minha experiência pessoal, que não é “a verdade” ou “a solução”, mas a minha contribuição: a experiência do Belo. (MORAES, 2019, 179)


Estou convencida de que através da Arteterapia, oferecemos ao social verdadeiras experiências com o Belo. Em cada encontro com a arte vivenciamos o sensível, o sublime, o poético, o profundo. Experimentamos a sensação de enlevo, de eternidade. Através desta experiência, somos positivamente contaminados com uma nova energia, que nos potencializa para enfrentarmos os mesmos desafios da vida que já nos consumiam. Mas agora os olhamos de frente, alimentados e fortalecidos.

Durante o período sabático que me levou a profundas reflexões, alguns eventos da vida me impeliram a questionar qual era o sentido do meu trabalho. Confesso que ainda não (re)encontrei respostas definitivas. Mas uma experiência vivida nos últimos dias de 2019 tem ecoado em meus pensamentos. No dia 29 de dezembro fui ao velório de uma paciente querida, que pude acompanhar por oito anos e testemunhar o poder estruturante e ressignificador da arte. Despedir-me desta mulher que tanto me ensinou como um ser humano pode atravessar toda uma vida sem se deixar derrotar pelo pior da humanidade foi uma das experiências mais marcantes dos últimos anos.



Já mergulhada em minhas reflexões, me emocionei quando a celebrante do velório me lembrou da oração de São Francisco e esta oração me ofereceu algumas respostas sobre o sentido do meu trabalho, ofício, missão. Hoje tomo a liberdade de compartilhar um fragmento desta oração com os amigos do Não Palavra que, independente da sua religiosidade, pode meditar sobre esta oração tão sincera e profunda:

Senhor, fazei-me instrumento da vossa paz
Onde houver ódio, que eu leve o amor
Onde houver ofensa, que eu leve o perdão
Onde houver discórdia, que eu leve a união
Onde houver dúvida, que eu leve a fé
Onde houver erro, que eu leve a verdade
Onde houver desespero, que eu leve a esperança
Onde houver tristeza, que eu leve a alegria
Onde houver trevas, que eu leve a luz.


E pensei: Onde houver aridez, que eu leve a arte.

Abre-se 2020 e tudo o que nele contém. Arteterapeutas, mãos a obra!


* As imagens que ilustram este texto foram tiradas no evento "Conversando com a Arte de Beatriz Milhazes", considerada por alguns críticos como "um oásis do belo na arte contemporânea". Este evento foi feito em duas turmas no dia 24/01/20 em parceria com Vera de Freitas.
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Sobre a autora: Eliana Moraes



Arteterapeuta e Psicóloga.

Pós graduada em História da Arte
Especialista em Gerontologia e saúde do idoso.
Fundadora e coordenadora do "Não Palavra Arteterapia".
Escreve e ministra cursos, palestras e supervisões sobre as teorias e práticas da Arteterapia. 
Atendimentos clínicos individuais e grupais em Arteterapia. Nascida em Minas Gerais, coordena o Espaço Não Palavra no Rio de Janeiro.
Autora do livro "Pensando a Arteterapia" Vol 1 e 2

9 comentários:

  1. Interessante que hoje te mandei uma.mensagem sobre o assunto que voce aborda.neste texto, entretanto ainda nao havia lido. Essa é voce e penso que seja seu chamado, missao e presente ao mundo! Privilégio conhecer pessoas assim! Que 2020 seja o ano que continues a despertar e desvelar a leveza,o belo e a essencia das pessoas! Lindo texto! Tania Moreira

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    1. Pois é! Das sincronicidades e comunicações inconscientes da vida! Muito obrigada!
      Um beijo!

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  2. Lindo texto, Eliana!!Com certeza você faz muita diferença nesse mundo e o seu trabalho é um oásis de acolhimento e cuidado. Feliz 2020!!!

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  3. Parabéns pela sua caminhada de força e fé. Bjsss

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  4. Por questões de saúde , estive afastada das redes sociais e só hoje retornando acessei sua página . Sou arteterapeuta e gostaria que você me indicasse ,livros ou trabalhos que contenham técnicas de atendimento para idosos . Grata

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    1. Olá Gevalda. Bem-vinda. Por favor me diga seu email para que possamos nos falar melhor. Um beijo.

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  5. Eliana,
    Já te falei mas vou colocar aqui para você não se esquecer:
    Acho que a sua grande projeção será através dos seus textos, livros, aulas, supervisões,...
    O seu conhecimento somado a sua disponibilidade em compartilhar o seu conhecimento será a sua grande marca ou a sua contribuição para o mundo.
    Um forte abraço,
    Claudia Abe

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