segunda-feira, 19 de junho de 2017

NEM SÓ DE LEMBRANÇAS DEVE VIVER UM IDOSO



Por Juliana Ohy
Site: www.julianaohy.com.br
Email: julianaohy@gmail.com



            Muitas vezes as decepções e tristezas da historia de vida de um idoso não permitem que o diálogo surja. A arte vem para preencher essa lacuna.

            Quando pintamos uma mandala, nos acalmamos, nos centramos e desviamos a energia vital para algo produtivo e não somente para lembranças e amarguras passadas. A pintura é como um mantra de cores, em que movimentos são repetidos com alternância de tons e ritmos.

            Quando pedimos a um idoso que nos ensine a cozinhar, a dirigir, a costurar, a ler, a ter paciência, estamos tirando-o do lugar comum do passado e trazendo-o para o presente, dando função, fazendo-o enxergar que vale a pena viver agora e não só de lembranças passadas.

            É preciso flexibilizar o terapêutico. Nem sempre a melhora vem através da fala, do resgate do antigo, muitas vezes vem do silêncio e do movimento.

            Em um dos trabalhos que faço em uma casa de repouso para idosos, acredito que meu atendimento, muitas vezes silencioso, possa causar curiosidade em quem observa. Quando necessário, minha sessão se limita ao toque, ao olhar e a proposta arteterapêutica. A transformação emocional é imediata.

            Quantos de nós passamos um dia inteiro sem silenciar e tampouco voltar a consciência para dentro. Uma sessão de arteterapia em que o silêncio impera e o fazer transforma, a fala torna-se complemento apenas. A arte transforma aquele que se entrega a ela, sem resistência. Posso dizer que a ‘fala’ é o elo entre o passado e o presente, entre o fato e a lembrança: Falo daquilo que vivi! A arte é elo entre o Eu e o presente: Faço o que sou!

O que percebo é que construímos estigmas e marcas ao longo da nossa história e, muitas vezes, estes se dão pela linguagem verbal. Muitas discussões, conflitos e incômodos da história podem ser pautados por palavras e ter outro instrumento que não seja a fala, para trabalharmos o emocional, é crucial nessas ocasiões.

“Há tesouros imensos ocultos no seio de todas as montanhas e no ventre de todos os rios; porém, nenhum tão valioso quanto o que se oculta no âmago de cada criatura humana. Todavia é mais fácil remover as montanhas e desviar os rios do que garimpar no próprio ser” (HENRIQUE MATTEUCCI, apud GODOY, 2015).

Através da arte é possível aterrissar no ‘aqui e agora’ e fazer o que se pode. A terapia com idosos nem sempre deve se basear apenas nas suas lembranças. A velhice tem um vasto potencial para criar o novo, porém dificilmente essa habilidade é estimulada, baseado na premissa de que aqueles que já viveram muitos anos têm mais a contar do que a criar.

Estimulem os idosos a criarem, criarem textos, palavras, imagens e por que não, alternativas, possibilidades, soluções. A rigidez não é condição "sine qua non" do envelhecimento.

A psicoterapia e a arteterapia estão cada vez mais atuantes para a população idosa, pois entende-se que a capacidade de autoconhecimento e transformação é ilimitada e a criatividade preenche a lacuna que aumenta com o passar dos anos, se a pessoa permanecer vivendo apenas de lembranças.

“O que passou fugiu, o que você espera está ausente, mas o presente é seu” (Provérbio árabe).


             
 Caso você tenha se identificado com a proposta do “Não palavra abre as portas” e se sinta motivado a aceitar o nosso convite, escreva para naopalavra@gmail.com
Assim poderemos iniciar nosso contato para maiores esclarecimentos quanto à proposta, ao formato do texto e quem sabe para um amadurecimento da sua ideia.

A Equipe Não Palavra te aguarda!
Referências Bibliográficas

GODOY, Lucy. Terceira idade... Que idade é essa? Buscando qualidade de vida. Rio de Janeiro: Wak Editora, 2015.

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Sobre a autora: Juliana Ohy



Formação:
Psicóloga, Arteterapeuta, Psicopedagoga, Especializada em Psicogeriatria e Mestre em Saúde Mental (IPUB-UFRJ)

Área de atuação/projetos/trabalhos:
Sócia-diretora do Instituto da Mente, Pesquisadora do núcleo de Depressão em idosos da UFRJ, Professora dos cursos Arte e Cognição: Estimulando o cérebro
através da arte e Jogos Cognitivos, Membro da equipe e professora do curso Neurociências da Educação do CBI of Miami e Palestrante na área de Neurociências, Gerontologia e Arteterapia.

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Este é o segundo texto de Juliana para o Não Palavra.
Para ler o primeiro CLIQUE AQUI

Um comentário:

  1. Parabéns, Juliana! É sempre um prazer, uma delicia ler seus textos!Por favor, nos presenteie com outros! Eliana, parabéns pela seleção de profissionais e pela generosidade em compartilhar conhecimentos. Essa ideia do Blog de "Abrir as portas" está sendo sensacional!

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