Por Débora Castro - RJ
@deborarteterapia
O pontilhismo, movimento artístico
caracterizado pela criação de imagens por meio de pequenos pontos de cor,
revela-se uma poderosa ferramenta expressiva no setting arteterapêutico com
grupos de mulheres. Sua técnica, minuciosa e repetitiva, favorece a concentração
e permite o acesso à interioridade de forma suave e simbólica. Ao trabalhar com
pontos, cada mulher se conecta com o ritmo do próprio corpo e mente, criando um
espaço de escuta interna que favorece o autoconhecimento e a regulação
emocional.
Tarde de domingo na Ilha de Grande Jatte (1884-1886), tela
de Seraut.
A obra Tarde de Domingo na Ilha de
Grande Jatte (1884–1886), de Georges Seurat, é um ícone do neoimpressionismo
que se destaca pela técnica do pontilhismo, na qual pequenos pontos de cor são
aplicados com precisão para formar uma imagem coesa e vibrante. A composição
revela uma cena de lazer às margens do rio Sena, com figuras humanas rígidas e
silenciosas, quase escultóricas, que transmitem uma sensação de ordem e
contemplação. Os aspectos expressivos da tela se manifestam na harmonia
cromática, na organização espacial e na atmosfera serena que convida à
introspecção. Seurat transforma o cotidiano em algo quase ritualístico, onde
cada elemento parece cuidadosamente calculado para provocar equilíbrio visual e
emocional.
No contexto terapêutico, o
pontilhismo pode refletir aspectos da vivência feminina: a construção paciente
da própria identidade, os fragmentos de memórias que emergem ponto a ponto e a
rede de apoio simbólica entre mulheres que compartilham seus processos
criativos. Ao pintar utilizando essa técnica, o grupo pode explorar temas como
pertencimento, reconstrução, delicadeza, força e resiliência.
Além disso, o aspecto não verbal da
arte permite que emoções difíceis de nomear ganhem forma e cor, oferecendo a
cada participante um espaço seguro de
expressão. A repetição dos pontos pode funcionar como um recurso de
autorregulação, especialmente em contextos de ansiedade, traumas ou processos
de cura emocional.
No grupo, as produções
compartilhadas criam conexões entre as histórias individuais, favorecendo o
acolhimento e o fortalecimento da identidade coletiva. Assim, o pontilhismo não
é apenas uma técnica artística, mas um instrumento terapêutico potente que, em
mãos femininas, pontilha caminhos de cuidado, afeto e transformação.
Algumas das
produções das participantes do grupo de Arteterapia na modalidade continuada, revelam
sensibilidade, expressão única e profundas narrativas visuais.
Participante J
Minha vida é feita de fases, ciclos
e momentos. A sessão de hoje me fez pensar que cada ponto, cada cor, revela
minha história. A minha expressão plástica fala sobre quem eu sou as cores traduzem a minha luz interna, minhas
escolhas e toda a força da minha ancestralidade.
Participante – D
Partindo do girassol que se abre
para o sol, para a luz, envolto pelo céu, onde o azul representa a emoção, eu
me expando. O girassol é a expressão da minha luz e da minha sabedoria. Essa
expansão acontece pelas raízes que crescem entre folhas verdes símbolo da vida e se conecta às cores: o amarelo da luz, o
azul da emoção, e o violeta da transformação. Cada tom é um reflexo do meu
caminho interior.
A pluralidade do grupo
enriquece o processo: mulheres de diferentes trajetórias compartilham olhares,
cores e impressões, pontilhando juntas um mural simbólico que fala de cuidado,
força e transformação. A arte feita ponto a ponto torna-se símbolo da construção
paciente da identidade, da reconstrução das partes fragilizadas e da celebração
das potências femininas.
Esse trabalho não é apenas
estético é profundamente terapêutico. Ao entrelaçar cores e histórias, as
mulheres se reconhecem, se acolhem e se fortalecem. Cada pontinho é um sopro de
vida, um gesto de cura, um convite à escuta de si e do outro. Assim, o pontilhismo
floresce como caminho de expressão, conexão e empoderamento no universo da Arteterapia.
Sobre a autora: Débora Castro
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