segunda-feira, 25 de agosto de 2025

PONTO A PONTO: HISTÓRIAS FEMININAS EM CORES NO SETTING ARTETERAPÊUTICO

 

Por Débora Castro - RJ

@deborarteterapia

 

O pontilhismo, movimento artístico caracterizado pela criação de imagens por meio de pequenos pontos de cor, revela-se uma poderosa ferramenta expressiva no setting arteterapêutico com grupos de mulheres. Sua técnica, minuciosa e repetitiva, favorece a concentração e permite o acesso à interioridade de forma suave e simbólica. Ao trabalhar com pontos, cada mulher se conecta com o ritmo do próprio corpo e mente, criando um espaço de escuta interna que favorece o autoconhecimento e a regulação emocional.

 


Tarde de domingo na Ilha de Grande Jatte (1884-1886), tela de Seraut.

A obra Tarde de Domingo na Ilha de Grande Jatte (1884–1886), de Georges Seurat, é um ícone do neoimpressionismo que se destaca pela técnica do pontilhismo, na qual pequenos pontos de cor são aplicados com precisão para formar uma imagem coesa e vibrante. A composição revela uma cena de lazer às margens do rio Sena, com figuras humanas rígidas e silenciosas, quase escultóricas, que transmitem uma sensação de ordem e contemplação. Os aspectos expressivos da tela se manifestam na harmonia cromática, na organização espacial e na atmosfera serena que convida à introspecção. Seurat transforma o cotidiano em algo quase ritualístico, onde cada elemento parece cuidadosamente calculado para provocar equilíbrio visual e emocional.

No contexto terapêutico, o pontilhismo pode refletir aspectos da vivência feminina: a construção paciente da própria identidade, os fragmentos de memórias que emergem ponto a ponto e a rede de apoio simbólica entre mulheres que compartilham seus processos criativos. Ao pintar utilizando essa técnica, o grupo pode explorar temas como pertencimento, reconstrução, delicadeza, força e resiliência.

Além disso, o aspecto não verbal da arte permite que emoções difíceis de nomear ganhem forma e cor, oferecendo a cada participante  um espaço seguro de expressão. A repetição dos pontos pode funcionar como um recurso de autorregulação, especialmente em contextos de ansiedade, traumas ou processos de cura emocional.

No grupo, as produções compartilhadas criam conexões entre as histórias individuais, favorecendo o acolhimento e o fortalecimento da identidade coletiva. Assim, o pontilhismo não é apenas uma técnica artística, mas um instrumento terapêutico potente que, em mãos femininas, pontilha caminhos de cuidado, afeto e transformação.

Algumas das produções das participantes do grupo de Arteterapia na modalidade continuada, revelam sensibilidade, expressão única e profundas narrativas visuais.

 


 Participante J

Minha vida é feita de fases, ciclos e momentos. A sessão de hoje me fez pensar que cada ponto, cada cor, revela minha história. A minha expressão plástica fala sobre quem eu sou  as cores traduzem a minha luz interna, minhas escolhas e toda a força da minha ancestralidade.

 


Participante – D

Partindo do girassol que se abre para o sol, para a luz, envolto pelo céu, onde o azul representa a emoção, eu me expando. O girassol é a expressão da minha luz e da minha sabedoria. Essa expansão acontece pelas raízes que crescem entre folhas verdes  símbolo da vida  e se conecta às cores: o amarelo da luz, o azul da emoção, e o violeta da transformação. Cada tom é um reflexo do meu caminho interior.

A pluralidade do grupo enriquece o processo: mulheres de diferentes trajetórias compartilham olhares, cores e impressões, pontilhando juntas um mural simbólico que fala de cuidado, força e transformação. A arte feita ponto a ponto torna-se símbolo da construção paciente da identidade, da reconstrução das partes fragilizadas e da celebração das potências femininas.

Esse trabalho não é apenas estético é profundamente terapêutico. Ao entrelaçar cores e histórias, as mulheres se reconhecem, se acolhem e se fortalecem. Cada pontinho é um sopro de vida, um gesto de cura, um convite à escuta de si e do outro. Assim, o pontilhismo floresce como caminho de expressão, conexão e empoderamento no universo da Arteterapia.

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Sobre a autora: Débora Castro



Sou Débora de Castro, educadora apaixonada pelo poder da arte e do conhecimento. Graduada em Pedagogia e Educação Artística, com pós-graduação em Psicopedagogia e Educação Especial e Inclusiva, sigo aprofundando minha jornada acadêmica como graduanda em Psicologia.

Com formação em Arteterapia (AARJ/1411), atuo há mais de 28 anos na área da Educação, compartilhando saberes como professora de Artes Visuais e História da Arte. Atualmente, dedico-me à coordenação de um grupo de Arteterapia para Mulheres e à condução de oficinas arte terapêuticas, tanto no formato online quanto presencial.

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