Por Eliana Moraes – MG
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Em meu repertório de estímulos projetivos a partir de grandes artistas para práticas em Arteterapia, um dos artistas mais antigos é Alexander Calder. Honestamente não me lembro quando exatamente ocorreu meu primeiro encontro com Calder, só sei dizer que ele sempre esteve presente no meu pensar arteterapêutico, mas também imprimindo sua marca em minha experiência criativa pessoal.
Recentemente me dei conta de meu lapso por nunca ter escrito ou criado uma palestra específica sobre este artista que tanto me encanta. E antes tarde do que nunca, hoje dedico este texto a Alexander Calder, o “poeta do arame” segundo Juan Miró.
Alexander Calder (1898-1976)
Também conhecido por Sandy, Calder era americano, filho de pais artistas: seu pai era escultor e sua mãe pintora. Convivendo com esse universo, foi incentivado desde cedo a criar. Formou-se em Engenharia Mecânica em 1919 e teve vários trabalhos como engenheiro hidráulico e engenheiro de automóveis.
Em 1926, mudou-se para Paris, onde conheceu os dadaístas, os surrealistas, e os componentes do grupo De Stijl, experiência que influenciou toda sua arte posterior. Em 1933 Calder voltou aos Estados Unidos. Em 1948 e 49 viajou à América do Sul.
Calder participou de algumas exposições no Brasil, tendo vindo pessoalmente ao país por três vezes. Era apaixonado pelo samba e adaptou os passos de nosso ritmo aos seus trabalhos. Morou no Rio de Janeiro por um pequeno período, no bairro de Botafogo, e fez inúmeros amigos. Entre eles, o crítico de arte Mário Pedrosa que, durante 30 anos, escreveu sobre o escultor. Em gratidão à sua relação com os brasileiros, Calder doou um de seus móbiles que hoje se encontra no Instituto Moreira Sales em São Paulo.
Calder influenciou toda uma geração de artistas brasileiros como Hélio Oiticica, Lygia Pape, Willys de Castro e Abraham Palatnik. Em 2016 ocorreu em São Paulo a exposição “Calder e a arte brasileira”, com registros no youtube. Outra forma de conhecer mais sobre o artista é através do documentário “Sculptor o air” também disponível no youtube.
As fases da obra de Calder
Antes de alcançar seu ápice, a obra de Calder passou por algumas fases, como por exemplo, o “Circo Calder”, que consistia em miniaturas de artistas, objetos circenses e animais, feitos com arames, madeira, couro, tecido, entre outros. Suas esculturas foram projetadas para serem por ele manipuladas, de uma forma que pudesse levá-las por onde ele quisesse. A sua primeira apresentação foi para um grupo de amigos e colegas, para posteriormente apresentar em Paris e Nova York, fazendo com que sua performance fosse executada durante quarenta anos. O Circo Calder ainda era figurativo, mas o movimento já se fazia presente.
A partir desse trabalho com o Circo Calder, o escultor percebeu que gostava de trabalhar com fios e arames, fazendo várias outras esculturas, até que em 1928 Calder fez sua primeira exposição na Nova York. Vale notar que esta é uma primeira inspiração que o artista nos fornece à Arteterapia, ao propormos que o experienciador experimente em sua produção de imagens, a passagem do bi para o tridimensional, do desenho para a escultura, ou ainda o “desenhar com o arame”.
Nesta fase ainda observamos um Calder figurativo. Até que o artista teve a oportunidade de visitar o ateliê de Piet Mondrian, o que lhe abriu a percepção para a arte abstrata, estimulando assim a grande virada de sua produção artística.
Os móbiles
Atravessado por suas referências, Calder alcança seu ápice ao criar uma
forma de escultura em arame que Marcel Duchamp denominou como
móbile, que, em suas palavras, “é a sublimação de uma árvore ao vento”.
Calder tornou-se o primeiro a explorar o movimento na escultura,
utilizando placas e discos metálicos unidos entre si por fios que se
agitam e entram em movimento tocados
pelo vento ou uma corrente de ar, assumindo as formas mais imprevistas, com um
jogo de peso e contrapeso. Calder retrata a leveza, o equilíbrio e o movimento através de seus
móbiles. A partir destes, Cader é considerado o precursor da Arte Cinética:
O
movimento da Arte Cinética, conforme hoje é conhecido, pode ser considerado
como datando [a
partir de] Alexander Calder... [Ele]
resolveu o problema da força motriz de
um modo que era simultaneamente simples, elegante e óbvio. Calder usou o
movimento do ar. Assim, não tinha necessidade de esconder sua fonte de energia
ou de tentar fazer dela uma parte integrante da obra. No começo da década de
1930, começou produzindo o que denominou móbiles [que] consistiam em chapas de metal, pintadas de
preto-e-branco ou nas cores primárias... As chapas eram suspensas em varetas e
articuladas de tal maneira que podiam movimentar-se livremente em qualquer
direção. Quando postos em movimento por uma corrente de ar, os móbiles giram
suavemente, em velocidades variáveis, e estabelecem uma espécie de contraponto
de movimento...
Durante
largo tempo, Calder foi o único artista de importância que trabalhou com
escultura cinética... Mas depois da Segunda Guerra Mundial e, sobretudo, desde
os anos 1950, a Arte Cinética passou a atrair cada vez mais a atenção de
artistas sérios. (BARRET in STANGOS, p 187-188)
Outra grande referência para Calder estava em sua longa amizade com Juan Miró. Os artistas se conheceram em 1928 e por cinquenta anos brincaram com a amizade entre a pintura e a escultura. Podemos observar inclusive alguma relação pictórica entre as obras de Miró e Calder.
Os stábiles
Formado em Engenharia Mecânica, Calder também ficou conhecido por suas esculturas de grande porte, uma última fase das mais conhecidas do artista. Jean Arp denominou esta forma de escultura como “stábiles”, que, ao contrário dos móbiles que têm uma estrutura leve, eram esculturas mais pesadas e densas, feitas com o intuito de serem grandiosas, imponentes.
O diálogo entre os móbiles e os stábiles, eis uma riquíssima proposta arteterapêutica inspirada em Alexander Calder.
Práticas
arteterapêuticas
Esta é uma proposta feita em dois tempos. No primeiro momento, experimentaremos o móbile, produção de uma escultura que estimula as propriedades de uma construção tridimensional, com as características do movimento, leveza e equilíbrio. Os materiais utilizados serão arame, EVAs ou papéis coloridos e opcionalmente fio de nylon e palitos de churrasco.
Em um segundo momento experimentaremos o stábile, produção de uma escultura que estimula as propriedades de uma construção tridimensional, com as características da estabilidade, consistência, solidez e imponência. Os materiais utilizados serão papéis de gramatura grossa, como cartão kraft grosso, Duplex ou Triplex, ou papelão reaproveitado, além de tesoura, cola cascorez, grampeador, opcionalmente fita adesiva, clips, grampo, tachinha tipo bailarina. Caso o experienciador deseje trazer cor para seu stábile, poderá fazer através da colagem com papéis coloridos ou com pastel oleoso.
Em um diálogo final,
o arteterapeuta irá propor a observação atenta entre as duas esculturas em suas
especificidades. É interessante observar o que elas têm em comum e em
diferenciais. Qual delas foi mais confortável, de fácil manejo ou desconfortável,
de difícil execução ao longo da experiência. Contudo, a reflexão mais
importante se dá através da pergunta: como estas características espelham sua
maneira de fazer construções de vida, de
forma “móbile” ou “stábile”?
Referências Bibliográficas:
BARRET, Cyril in
STANGOS, Nikos (org) Conceitos de Arte Moderna
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Sobre a autora: Eliana Moraes
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