segunda-feira, 18 de abril de 2016

ARTETERAPIA E PSICOLOGIA. Série: Pilares da Arteterapia

Por Maria Cristina de Resende
crisilha@hotmail.com 

Dando continuidade aos textos acerca dos saberes que contribuíram para a construção da Arteterapia, hoje abordaremos as contribuições que a Psicologia forneceu e como hoje ambas dialogam no setting e na relação paciente-terapeuta.

A psicologia enquanto cadeira científica é bem jovem, pois até o final do século XIX víamos sua atuação dentro da filosofia, da teologia e da biologia. Em 1892, Théodore Flournoy – médico e professor de Filosofia e posteriormente de psicologia – recebeu a cadeira de psicologia da Universidade de Genebra, consagrando sua liberdade dos sistemas filosóficos e ganhado status de ciência (SHAMDASANI, 2005). A partir deste ponto uma profusão de teorias começou a se desenvolver e no início do século XX podemos observar inúmeras teorias e teóricos da nova psicologia.

“Parece que hoje todo o mundo está publicando uma Psicologia”, escreveu William James em 1893 para seu amigo e colega psicólogo, Théodore Flournoy. Brotavam de todo lado manuais, princípios, esboços, introduções, compêndios e almanaques de psicologia.
Periódicos, laboratórios, cátedras, cursos, sociedades, associações e institutos de psicologia eram fundados a rodo. Uma verdadeira horda de testemunhas foi chamada e interrogada: o louco, o primitivo, o gênio, o degenerado, o imbecil, o normal, o bebê, e, por fim, mas não em último, o rato branco. Novos personagens entraram socialmente em cena: o esquizofrênico, o narcisista, o maníaco-depressivo, o anal-retentivo, o oral-sádico, e todos os “vertidos” – invertidos, pervertidos, introvertidos, extrovertidos. (SHAMDASANI, 2005) 

                
              Livro Teorias da Personalidade de Susan C. Cloninger, 
                                         Editora Martins Fontes.

Com a publicação de Freud em 1900, A Interpretação dos Sonhos, a mente humana começou a ganhar infinitas possibilidades de estudo, pois Freud traz para esse cenário o conceito de inconsciente enquanto instância, o que mudaria toda a percepção do homem sobre sua mente. Nesta nova ótica o homem deixa de ser dono de sua própria casa e se torna refém de uma instancia desconhecida e inacessível.

Jung, tempos depois nos apresenta a psicologia analítica, posteriormente chamada de psicologia complexa, hoje conhecida como psicologia Junguiana. Nela, o autor traz uma instância ainda mais profunda, o inconsciente coletivo, onde residem forças chamadas de arquétipos, termos derivado da filosofia, arché, ou aspectos primordiais, que também encontramos em Nietzsche e seus imperativos categóricos. A consciência tampouco tem acesso a essas forças e apenas recebe delas as imagens arquetípicas, ou seja, fragmentos que chegam à consciência travestidos com os aspectos pessoais de cada indivíduo.

O acesso a estes conteúdos se dá através dos sonhos, dos atos falhos, das psicopatologias e das projeções, por exemplo. 

Cena de Alice no País das Maravilhas, de Walt Disney, 1951.

Aqui podemos delinear um ponto de diálogo entre psicologia e Arteterapia, pois a expressão através da arte e dos materiais plásticos é uma das possibilidades de construir um caminho direto para tais conteúdos e abrir o diálogo com o inconsciente e suas imagens, logo, a Arteterapia é, por excelência, a abordagem terapêutica que fornece inúmeras possibilidades de acesso a aspectos anteriormente desconhecidos pelo homem. Podemos comprovar esse fenômeno quando observamos o trabalho de Nise da Silveira, seguidora da psicologia Junguiana, com pacientes psiquiátricos usando materiais expressivos como argila, pintura e desenho e possibilitando assim, a comunicação desses pacientes com seus conteúdos inconscientes.

Nesse caldeirão de “novas psicologias”, outros autores construíram seus caminhos após entrarem em contato com a Psicanálise. Frederick Perls ou Fritz Perls desenvolveu a Gestalt-Terapia desdobrando os saberes da Teoria da Gestalt, do teatro, da Fenomenologia, do Existencialismo e de sua experiência pessoal com artes. Teoria que muito acrescenta à prática da Arteterapia no que diz respeito a percepção e leitura de imagens, pois tanto aqui quanto na Teoria da Arte (próximo texto da série), observamos conceitos retirados da teoria da ótica - da física - que são utilizados  na compreensão do funcionamento da nossa capacidade perceptiva e dos seus atravessamentos nas questões emocionais. Gestalt possui como melhor tradução a palavra forma, ou seja, a teoria da forma nos revela como nossa consciência busca “boas formas” e em quais armadilhas podemos cair durante essa busca. É uma teoria que não leva em conta as forças advindas do inconsciente, visto que não se trabalha com esta instancia, apenas com a consciência, resquício da fenomenologia, entretanto é importantíssimo o seu estudo, uma vez que sempre olhamos para as imagens do inconsciente através da consciência, ou seja, é com ela e através dela que percebemos o mundo, seja o nosso mundo interno e desconhecido ou o mundo sensorial, das nossas relações.

Melanie Klein e Donald Winnicott também desenvolveram suas teorias sobre desenvolvimento infantil e suas nuances afetivas importantíssimas para aqueles que buscam especializar-se nos atendimentos infantis.

E diante desse gradiente com tantas nuances, teorias e possibilidades de abordagens teóricas surge um questionamento importante: a Arteterapia se baseia em que teoria da psicologia? O arteterapeuta precisa ser psicólogo? É preciso realizar especializações em teorias da psicologia após a formação em Arteterapia?

Antes de responder a esses questionamentos é importante destacar o território da Arteterapia no meio de tantas abordagens psicológicas. A Arteterapia enquanto outra possibilidade de abordagem e de atuação clínica e institucional de desenvolvimento mental, emocional e cognitivo e enquanto formação de profissionais que atuem com este objetivo tanto no acompanhamento clínico quanto institucional precisa se bastar enquanto teoria e prática metodológica, e para tanto precisamos observar as interseções entre Arteterapia e psicologia na sua prática, estruturar e fortalecer suas bases teóricas.

A Arteterapia é uma área do saber que considero um hibrido e sua construção deriva de muitas fontes. Da psicologia podemos destacar primordialmente a relação paciente-terapeuta, chamada de transferência, um conceito base para o entendimento de qualquer metodologia terapêutica. O estudo da mente, do comportamento, do aprendizado e das forças advindas do inconsciente ou dos fenômenos dados à consciência é importante em qualquer prática terapêutica onde se lida com o outro. Conhecer o funcionamento da mente humana a partir de qualquer teoria da personalidade ou usando qualquer área de estudo da psicologia – social, aprendizagem, organizacional, institucional, etc – é fundamental para quem deseja enveredar pelo caminho das práticas terapêuticas, porém, não podemos confundir Arteterapia com tais teorias e mais ainda, não podemos colar a prática da Arteterapia com nenhuma delas, pois é preciso construir uma identidade e uma metodologia próprias da Arteterapia que ofereça ao profissional uma formação completa, ou seja, um entendimento do homem em seus diversos contextos de atuação no mundo para que, ao lidar com a subjetividade do outro, seja um paciente individual, um grupo, uma empresa, uma escola ou uma instituição de saúde o arteterapeuta possa oferecer as ferramentas necessárias para aquela demanda.

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Referências Bibliográficas:
PAÍN, Sara. Os Fundamentos da Arteterapia. Editora Vozes, Petrópolis. 2009.
CLONINGER, Susan C. Teorias da Personalidade. Editora Martins Fontes, São Paulo.1999
SHANDASANI, Sonu. Jung e a Construção da Psicologia Moderna. Editora Idéias e Letras, São Paulo. 2011.
GINGER, Serge. Gestalt a Arte do Contato. Editora Vozes, Petrópolis. 2007.
MARCONDE, Danilo. Iniciação à História da Filsofia. Editora Zahar, Rio de Janeiro. 2007.  










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