segunda-feira, 6 de março de 2017

APRENDENDO A VER A ARTE COM OS BEBÊS


Por Maria Matina
matinarte@gmail.com

Eu entrei na Arteterapia em busca de uma maior compreensão sobre o poder transformador da arte. Venho de um a família de artistas e desde sempre observei que a arte era muito mais que uma representação. A arte é o resultado de um processo, armazenamento de muitas emoções, capítulo final de uma jornada para o início de outra, um ciclo contínuo e infinito como a própria vida. Ao mergulhar no universo da Arteterapia em 2009, comecei a compreender um pouco mais sobre esse processo e gradativamente fui modificando o meu olhar sobre a arte e o fazer artístico, e uma vez que ele se modifica nunca mais voltamos a ser os mesmos!

Por nascer e viver na arte acredito que naturalmente sempre tive uma certa facilidade para o sensível, invisível e não dito, e isso me conduziu ao longo dos anos nas minhas escolhas profissionais e pessoais. Tive também a sorte de ter bons mestres no meu caminho, pessoas que me apresentaram seus olhares sobre as coisas e que aos poucos foram transformando o meu. Sou muito grata pelos aprendizados e espero poder compartilhar um pouco do meu olhar multifacetado hoje para vocês e futuramente apresentar os meus mestres e seus olhares sobre o mesmo objeto: o bebê. 

Meu trabalho com bebês se deu de forma gradativa, não era algo que eu havia planejado, mas a vida foi me apresentando esse universo e eu fui engatinhando em direção a ele. Comecei trabalhando como assistente de um musicoterapeuta que tinha um espaço de desenvolvimento infantil e um dom incrível para se conectar com as crianças. Depois de alguns anos trabalhei em uma clínica de psicologia focada na estimulação precoce e foi onde me encantei pelo trabalho exclusivamente voltado para bebês e de lá fui parar no Museu de Arte Naïf (Rio de Janeiro) que precursoramente tinha um projeto de visitação ao museu voltado para os bebês e suas famílias. 

Hoje posso dizer que começo a querer dar meus primeiros passos nessa aventura que é trabalhar com bebês e tem sido um aprendizado maravilhoso pelo qual cada vez me encanto mais. Atualmente vivo entre Portugal e o Brasil e o maior desafio  tem sido compreender essa nova cultura. Realizei dois encontros para bebês em Lisboa e foi incrível constatar que apesar das diferenças os bebês são igualmente abertos e fascinados, o único contraste entre as culturas se dá na relação com os pais. Aqui os pais demoram um pouco mais a se envolver com a proposta, porém estão muito mais atentos durante a atividade (sem a presença constante do telefone tirando fotos). Ao longo do encontro vão se soltando e o resultado final têm sido o mesmo nos dois lugares: a alegria estampada no rosto. 


Os bebês são seres em total conexão com o momento, vivem e experimentam o mundo de forma muito intensa, são capazes de perceber e sentir (olfato, tato, audição, paladar e visão) o todo ao seu redor de uma forma muito mais complexa do que os adultos. O cérebro do bebê está em constante desenvolvimento e crescimento. Em 12 meses de vida o bebê chega a ter o dobro de neurônios que uma pessoas adulta e é fundamental nesses primeiros meses de vida uma estimulação correta e ampla para que se possam criar o máximo de sinapses e ligações possíveis.

Na minha prática acredito que o primeiro passo para trabalhar com os bebês foi me abrir à percepção deles, me “despir” das minhas defesas e rigores, me permitir brincar e me relacionar. Ao estarmos dispostos a nos relacionar abrimos o caminho para a troca. É importante estar consciente de que tudo é novo e fascinante para o bebê e que o aprendizado e interesse podem estar em tudo (na brisa, no olhar, na textura, no som, na sombra, no sabor, etc).

Outra coisa fundamental no trabalho com bebês é o acolhimento e atenção aos pais, pois como dizia Winnicott “Não existe um bebê sozinho, ele existe com sua mãe”. A inclusão dos pais na atividade é fundamental, é através deles que o mundo vêm sendo apresentado ao bebê e é nosso dever (terapeutas, dinamizadores e professores) cuidar dessa relação com atenção, respeitando a díade que mãe-bebê representam e facilitando breves desligamentos (momentos em que os indivíduos se descolam). 

O seguinte passo para se trabalhar com bebês é sem dúvida criar um ambiente facilitador (Winiccott), desenvolver e escolher materiais adequados para cada faixa etária. Eu particularmente gosto de criar materiais principalmente utilizando sucata pois aprendi ao longo dos anos com meus mestres que no caso de bebês “menos é mais”, o primordial é  que o material seja seguro, higiênico e interessante para o bebê.  


Ao nos abrirmos para a relação com o bebê e sua família e criarmos um ambiente facilitador, damos o primeiro passo em direção ao trabalho com bebês. Os seguintes passos se darão nas atividades. Os bebês são capazes de perceber diversos estímulos simultaneamente, então é muito importante apresentar as propostas por partes (apresentando e retirando os estímulos) e de maneira multissensorial, respeitando o ritmo do bebê e seu interesse natural. Acredito que o tempo ideal de atividade para bebês seja de 40 min a 1h.

Hoje compartilho com vocês um pouco da minha prática com bebês e dos cuidados que considero mais importantes. Minha intenção é apresentar nos próximos textos os colegas que me inseriram no maravilhoso mundo dos bebês e suas práticas na área da música, psicologia e educação. Agradeço o convite do Não Palavra para escrever sobre minha experiência, têm sido um excelente pretexto para mergulhar um pouco mais na teoria e com ela complementar meu saber.


Caso você tenha se identificado com a proposta do “Não palavra abre as portas” e se sinta motivado a aceitar o nosso convite, escreva para naopalavra@gmail.com
Assim poderemos iniciar nosso contato para maiores esclarecimentos quanto à proposta, ao formato do texto e quem sabe para um amadurecimento da sua ideia.

A Equipe Não Palavra te aguarda!


Referências Bibliográficas:
A criança e seu mundo (Winnicott). Trad. de Álvaro Cabral. Rio de Janeiro, Zahar Editores, 1985

Baby Art: os primeiros passos com a arte (Anna Marie Holm)
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Sobre a autora: 

Maria Matina é artista, educadora e arteterapeuta, nasceu no Rio de Janeiro numa família de artistas. É coordenadora e co-fundadora da Casa Benet Domingo, atualmente divide-se entre a Europa e o Brasil realizando projetos artísticos e culturais e em busca de parcerias institucionais para a Casa.

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