segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

A RESISTÊNCIA EM ARTETERAPIA


“pois fica um pouco mais difícil para alguém negar aquilo que acabou de fazer, bem como de perceber o quanto se posiciona... As possibilidades de se perceber nas suas dificuldades, dadas as imposições deferidas pelo próprio uso dos materiais plásticos, confere ao usuário as noções de limitação, aceitação e humildade diante de suas dificuldades, tornando-o mais humano, mais próximo de si mesmo e dos demais.” (URRUTIGARAY)

            Há algum tempo escrevi um texto chamado “Susto” para este blog falando sobre o potencial que a arteterapia possui de convocar conteúdos desprezados por repressão ou resistência do paciente. Na terapia verbal o terapeuta pode sinalizar ou sublinhar algum conteúdo, na tentativa de chamar a atenção do paciente para determinada questão. Mas em arteterapia, ao materializar por si mesmo sua fala em imagens, muitas vezes o paciente se vê em um confronto consigo mesmo.
            Porém, embora esta dinâmica seja muito comum, é possível que ela não ocorra. Sim, é possível que o paciente negue aquilo que acabou de criar.  E nos últimos tempos tenho refletido bastante sobre a resistência na arteterapia.
            Em minha prática tenho percebido que os pacientes podem não reconhecer algum conteúdo expressado, contradizer o que dizem por imagem e o que dizem em palavras, refutar qualquer tipo de interpretação do terapeuta... E isto não é tão raro de acontecer.
Creio que o arteterapeuta precisa pensar-se quanto a responsabilidade pelo instrumento que tem nas mãos. Que mesmo sendo um profissional apto a fazer uma leitura das imagens e capaz de levantar hipóteses para o processo terapêutico, não coloque-se em posição de poder, como aquele que pode interpretar e devolver para o paciente o seu próprio olhar. Isto significa atropelar todo o processo terapêutico, não respeitando o ritmo do paciente e “fazendo o trabalho” para ele.
            Relendo o texto “Susto”, ratifico o que escrevi na época, pois se o paciente resiste é porque ele não pode fazer diferente neste momento, ele está se defendendo de algo que o é dolorido:

“... mesmo com este confronto ‘físico’, o paciente ainda sim recusa-se a encarar os conteúdos, deixando-os permanecerem inconscientes e em uma atuação ‘irresponsável’. Se isto acontece, o terapeuta deve respeitar este limite do paciente pois se ele não o reconhece, não é por acaso, e tem direito a ter seu tempo próprio.” (MORAES)

            No final do texto Repetir, Recordar e Elaborar, Freud relata de médicos principiantes na psicanálise que vinham pedir conselhos à ele  sobre casos em que eles haviam apontado a resistência ao paciente  e mudança alguma teria acontecido. Na verdade “a resistência tornou-se ainda mais forte e toda a situação ficou mais obscura do que nunca”. Por fim ele conclui que:

“O médico nada mais tem a fazer senão esperar e deixar as coisas seguirem seu curso, que não pode ser evitado nem continuamente apressado.”
“Esta elaboração das resistências pode, na prática, revelar-se uma tarefa árdua para o sujeito em análise e uma prova de paciência para o analista. Todavia, trata-se do trabalho que efetua as maiores mudanças no paciente...” (FREUD)

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
MORAES, Eliana. Susto. Blog “Não Palavra: Pensando a Arteterapia”. Disponível em: http://nao-palavra.blogspot.com.br/2013/09/susto.html

FREUD, Sigmund. Recordar, repetir e elaborar. Obras Completas, 1914.


URRUTIGARAY, Maria Cristina. Arteterapia: a transformação pessoal pelas imagens.  Ed Wak. Rio de Janeiro, RJ. 2011. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário