Por Valéria Diniz - RJ
valdiniz.td@gmail.com
Instagram @valeriadiniz50
Awareness
é uma palavra de origem inglesa, proveniente de “aware” (estado de ser
consciente), significando “consciência”.
Um
conceito central em Gestalt-Terapia é o conceito de awareness, que se
caracteriza pela consciência de si e a consciência perceptiva; é a tomada de
consciência global no momento presente, a atenção ao conjunto da percepção
pessoal, corporal e emocional, interior e ambiental (Ginger, 1995).
A Gestalt-terapia acredita em mudanças
naturais e espontâneas por meio do contato e da awareness que abrange
aceitação, escolha e responsabilidade. Essas atitudes levam a pessoa ao
crescimento. (Yontef ,1998)
Escolhi iniciar esse texto com
as referências acima para explicar o conceito de awareness. Esse pilar central
da Gestalt Terapia não pode ser definido apenas como ter consciência, no
sentido estritamente racional. É um processo “contínuo” que envolve emoção, sensação,
percepção de si e do meio.
Para simplificar o
entendimento, gosto de dizer que é um “dar-se conta com a sua totalidade:
sensação, percepção, emoção, raciocínio, corpo.”
“Eu
sei que estou aqui escrevendo um texto”- Isso é Consciência
“Eu
estou aqui escrevendo um texto,com um leve desconforto nos olhos e na coluna. Uma
dificuldade em traduzir em palavras o significado de awareness. Percebendo que
tudo flui mais leve quando escrevo referenciada em meus sentimentos e que posso
me livrar desse desconforto se voltar ao meu estilo de escrita original. O que
passo a fazer em seguida.” – Isso é Awareness.
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Um fragmento da História de Mary:
Ela entra no consultório e relata
: “Tá tudo do mesmo jeito, não consigo
fazer nada do que eu quero, nada do que desejo fazer. Sei que quero sair, ter
vida social, passear com amigos,ir ao cinema... Mas não consigo fazer. Não faço
porque tenho medo dos julgamentos ,do que vão pensar”. Esse é um relato consciente de seus desejos e
de seus impedimentos. Apenas um relato.
Como terapeuta, minha tarefa é
convidar a ir mais além. Buscar os elementos que facilitam a awareness. Minha
proposta é que ela faça contato com o que sente e reproduza em forma de cores.
Marrom para angústia e
vermelho para raiva.
“Vejo
que está tudo misturado”. ( Vê nas cores e dentro de si)
“Esse
marrom da angústia... angústia é quando não expresso minha raiva. Fica tudo
preso aqui dentro de mim. Eu engulo e fica apertado no peito.” (Percebe seu corpo e nomeia as
emoções.)
Um choro contido. Escolho não
interferir. Aguardo porque sei o poder que as cores têm quando se está em
contato com elas.
“Essa raiva... essa raiva... Me lembro de uma vez quando eu era bem
pequena e minha mãe achou que era melhor eu repetir o ano... nem sei se isso
tem a ver.. mas me lembrei agora”. (Traz uma gestalt inacabada, uma situação
que precisa ser fechada)
Mais choro genuíno e potente.
“Eu
fiquei com muita raiva porque ela não tinha esse direito... todos os meus
amiguinhos ficaram rindo de mim... só eu ia ficar para trás... era muito
pequena para dizer algo, eu engoli. E fiquei com muita vergonha dos outros... acho
que tenho essa vergonha ainda hoje”.
Agora sim temos uma awareness.
Uma compreensão mais inteira de si mesma. E uma possibilidade de atualização.
Consciente dos processos e sentimentos que emergiram através da AÇÃO de pintar,
escolher as cores, selecionar pincéis, material bloqueado por anos surge com
potência numa tela e podem finalmente ser compreendidos e ressignificados.
Fragmento da história de Lucy:
“Tô
bem ansiosa... tudo me deixa nervosa... difícil esse mundo... cansada de
gente... e ainda dizem que eu é que sou difícil!”
-
Como é sua ansiedade?
-
Ansiedade é ansiedade ué... você é a doutora aqui...
-
Não sei como é a sua ansiedade Lucy, mas posso sentir a sua agressividade.
Silêncio...
Convido a fechar os olhos e
imaginar quais as cores da sua ansiedade e agressividade. Gosto de trabalhar
com cores pela facilidade imaginativa, pela fluidez no contato com emoções e mais
ainda, pela potência que carregam em si mesmas.
O amarelo é escolhido. Apenas
uma cor.
“Queria
que as crianças fossem mais organizadas... chego do trabalho e ainda tenho que
arrumar tudo sozinha... sabe que esse amarelo me dá um nervoso só de olhar?!...
Sei lá... esse amarelo parece eu... Acho que devo ser assim né?”
O contato com a cor trouxe uma
nova percepção a respeito de si mesma. A projeção de sua ansiedade sobre
terceiros é assumida como sua responsabilidade.
“Sou
esse amarelo que deixa todo mundo nervoso... deixa meus filhos e meu marido
nervosos... não quero ser assim... tadinha das crianças.”
Com sua nova percepção pode
ampliar sua awareness a respeito de seu modo de funcionar. E poderá aprender
formas mais saudáveis de existir.
Ahhh... e a cor da agressividade?
Trabalhamos em sessão posterior.
Ela escolheu um azul. Azul
para agressividade? Surpresa minha também. Mas, como eu sei a potência das
cores ela explica:
“...é
porque fico aborrecida com você... igual eu faço com as crianças... eu achava
que ia chegar aqui e você ia me entender... me dar razão... e depois daquela
pintura amarela o ‘eu amarelo’, eu entendi que o problema é esse: querer ser a
dona da razão...(risos) então a minha agressividade hoje é azul porque estou em
paz.”
Ela adquiriu uma nova forma de
compreensão e ainda está experimentando novos jeitos de funcionar com mais
leveza, menos cobrança e mais paz.
Para finalizar os exemplos,
escolhi uma criança de 9 anos.
Fragmento da História de Lily:
Minha proposta é deixar que
ela escolha os materiais livremente. É uma forma de estimular sua criatividade
e aceitar suas escolhas, algo pertinente a sua história pessoal. Uma criança
que, como tantas outras, fica presa em jogos virtuais e está com sobrepeso.
Carimbos figurativos foram
escolhidos. E posteriormente propus que ela mesma confeccionasse seus próprios
carimbos esculpindo em isopor.¹
-
Como sou burra... eu não prestei atenção que ia ficar ao contrário!” (Exigência
e julgamento consigo mesma)
-
Eu também não. (Algumas atividades fazemos juntas).
-
Mas não dava para saber... você não tinha feito antes!”. (Compreensão e aceitação
comigo)
-
E você também não.
-
Acho que vivo fazendo isso... tô sempre
desculpando meu irmãozinho porque ele é o caçula e eu a mais velha... E
minha mãe briga e sempre fala: Lily, ele é pequeno... você já é grande.... eu
ainda sou pequena... só tenho 9 anos...”
-
E também pode errar.
-
A gente pode errar sempre... até quando tá grande... até você errou... e minha
mãe também erra... ninguém faz tudo sempre certo...
A visualização de um “erro”
numa atividade potencializou seus conflitos internos. Uma awareness surge e sua
exigência “introjetada” pode ser percebida e reconfigurada. De um modo saudável e simples inerente ao processo
de desenvolvimento infantil.
Hora de finalizar. Foi difícil
escolher quais exemplos usar no texto. Então fiquei com aqueles que livremente
surgiram.
As técnicas expressivas são
potentes “facilitadoras” do processo de awareness. Técnicas e materiais, por si
só ajudam no difícil e envolvente
caminho de conhecer a si próprio. E escolhi fazer esse caminho com uma clínica
mais leve e criativa, como pode ser na vida, para mim e meus clientes.
Agradecimentos as pessoas que
carinhosamente me convidaram a fazer parte de suas histórias e que se
permitiram como exemplos para esse texto, sem os quais a construção seria
teórica e rasa.
¹ Técnica que aprendi na
Oficina de Monotipia: Gravando emoções com Liane Esteves (arteterapeuta no Rio
de Janeiro)
_________________________________________________________________________________Sobre a autora: Valéria Diniz
Psicóloga
Gestalt terapeuta
Mestra em Saúde Mental
Atendimento individual e casal .
Oficinas de Técnicas Expressivas em Gestalt
Amei o texto Valéria. Bem esclarecedor. Vai me ajudar bastante junto aos meus clientes.
ResponderExcluirGratidão pelo carinho!
ExcluirÓtimo texto Valéria, muito esclarecedor dos processos da Gestalt!
ResponderExcluirGratidão pelos seus relatos!
MUito bom saber que está usando os processos da gravura em seus atendimentos!
Obrigada pelo carinho da nota de referência!
Vivemos de trocas e compartilhamentos, assim construiremos um mundo melhor!