Eliana Moraes (MG) RJ
naopalavra@gmail.com
Instagram @naopalavra
“Passem-se
os olhos por uma paleta coberta de cores... O olho sente a cor. Experimenta suas propriedades, é fascinado por
sua beleza... Quando penetra profundamente, desperta outras impressões cada vez
mais fortes e pode deflagrar toda uma cadeia de eventos psíquicos...” (KANDINSKY,
1990, pag 63)
Ao longo deste ano estive
envolvida com algumas pesquisas e experimentações entre teorias da arte e a
Arteterapia. Dentre elas, os elementos visuais, principalmente as cores. Desde
o início da minha vida profissional, pelo fato de trabalhar com planos de
saúde, fui desafiada ao atendimento de pessoas dos mais variados estilos,
idades, origens, escolaridades, religiosidades... O ponto em comum,
basicamente, era a falta de intimidade ou qualquer contato com a arte e a
expressão através dela. Desde cedo percebi que eu precisava buscar estímulos de
fácil acesso, compreensão e identificação de forma “democrática”, com potencial
de alcance à pluralidade humana, e assim nasceu meu namoro com as teorias e
história da arte.
Desde que conheci Kandinsky
(dentre outros elementos me apresentados por ele) tenho pensado, estudado e
utilizado as cores como um potencialíssimo estímulo sensorial e psíquico na
clínica da Arteterapia. Afinal, Kandinsky propunha algo que podemos considerar
um dos pilares para a Arteterapia:
“...
Uma evolução da arte afastadas redundâncias do materialismo para se
tornar um instrumento com o qual se comunicam emoções ‘puras’ obtidas
por meio do impacto sensorial e psíquico de formas e cores.” (ESMANHOTTO, 2011)
“Comunicar emoções puras”, este é um dos pontos orientadores quando escolho
oferecer cores aos meus pacientes. Desenvolvi o estilo de associá-las com
algumas poesias que foram me atravessando ao longo da minha caminhada, até que
há alguns meses estruturei o ciclo “Cores e Poesias” ao qual venho aplicando em
grupos arteterapêuticos que sustento. Venho também compartilhando fragmentos
desta jornada nas redes sociais do Não Palavra (Fan page, Instagram e Email).
Neste texto inicio uma
série em que compartilharei citações de três autores que têm me embasado nesta
pesquisa e construção de trabalho. Hoje, o pai de todos, Wassily Kandinsky. O
próximo, Fayga Ostrower e por fim uma autora da Arteterapia propriamente dita,
Maria Cristina Urrutigaray.
Kandinsky: Cor, alma, corpo
Em
seu livro “Do espiritual na arte” Kandinsky teoriza sobre o caminho para a
abstração e a potência expressiva das cores e das formas na pintura. Para ele,
a cor tem um acesso direto à alma:
“A
cor... é o meio de exercer sobre ela [a alma] uma influência direta. A cor é a
tecla. O olho o martelo. A alma é o piano de inúmeras cordas. Quanto ao
artista, é a mão que, com a ajuda desta ou daquela tecla, obtém da alma a
vibração certa. É evidente portanto
que, a harmonia das cores deve unicamente basear-se no princípio do contato
eficaz... Princípio da
Necessidade Interior.” (KANDINSKY, 1990, pag 66)
Kandinsky
propunha uma inversão no ato de criar: crítico de uma arte extremamente
técnica, que tinha um olhar voltado para as demandas exteriores, defendia o
resgate de uma arte em que o único princípio norteador para a criação fosse a
“necessidade interior” do artista. Para isso utilizaria a vibração psíquica
provocada por cada cor, que atingiria a alma e esta diretamente ligada ao corpo
imporia a ele uma ação. Cor, alma, corpo, este seria o fluxo do pintar. Em suas
palavras:
“A
cor provoca portanto uma vibração psíquica.
E seu efeito físico superficial é apenas... o caminho que lhe serve para
atingir a alma... Estando a alma estreitamente ligada ao corpo, uma emoção qualquer sempre pode, por
associação, provocar nele outra que lhe corresponda... A cor... desperta a
lembrança de outro agente físico que exerce sobre a alma uma ação... (KANDINSKY,
1990, pag 64)
Para Kandinsky, trazer cor estava intimamente ligado a
trazer vida. Em uma passagem de seu livro, faz referência ao pintor
impressionista Cézanne, exaltando-o sobre a potência de sua obra que ao
ressaltar a cor, dava vida aos objetos. Cézanne:
“Elevou a ‘natureza morta’ ao nível
de objeto exteriormente ‘morto’ e interiormente vivo. Tratou os objetos como
tratou o homem, pois tinha o dom de descobrir a vida interior em tudo. Captura-os e entrega-os à cor. Recebem dela
a vida – uma vida interior.” (KANDINSKY,
1990, pag 50)
“Poesias e Cores”:
Aplicabilidades para a Arteterapia
- A arte como um caminho para a expressão de “emoções puras”:
Por fim, peço que explore o espaço do papel a partir
das cores, movimentos e formas. Abre-se assim a expressão de emoções profundas,
ainda sem nome, mas que através da linguagem pictórica se constela.
- O caminho para a abstração:
“Sou
livre para o silêncio das formas e das cores” Manoel de Barros
Na prática da Arteterapia, Kandinsky me orienta quando
me deparo com pacientes extremamente esvaziados, empobrecidos, ensimesmados,
como por exemplo deprimidos graves. Este perfil de pacientes apresenta grande
resistência à expressão verbal e a arte comparece como um caminho possível. A
possibilidade de expressar-se sem o imperativo da palavra ou até mesmo da
imagem figurativa tem efeito aliviador, ou parafraseando Manoel de Barros,
abre-se a liberdade para o “silêncio” das formas e das cores. Desta maneira,
observo que nasce uma abertura no processo criativo, para maior exploração dos
materiais e do espaço disponível no papel.
Kandinsky nos ensina também que a cor tem um acesso
direto a alma e provoca uma vibração psíquica. Esta vibração atinge a dimensão
corporal, o que gera movimento em um sujeito embotado. A arte alcança assim o
ser humano de forma integral, nas dimensões psíquica, física e espiritual.
Por fim, contamos com a cor para o movimento de gerar
lampejos de vida em alguém aparentemente “morto”. No chão da clínica recebemos
sujeitos “exteriormente mortos”, mas como arteterapeutas, podemos captura-los e
entrega-los à cor. A cada criação, dela eles receberão vida, redescobrindo
assim uma vida interior.
Sigo com o estudo e a prática com cores e em breve
trarei outros dois textos desta série.
Caso você tenha se identificado com a proposta do “Não palavra abre as portas” e se sinta motivado a aceitar o nosso convite, escreva para naopalavra@gmail.com
Assim poderemos iniciar nosso contato para maiores esclarecimentos quanto à proposta, ao formato do texto e quem sabe para um amadurecimento da sua ideia.
A Equipe Não Palavra te aguarda!
Assim poderemos iniciar nosso contato para maiores esclarecimentos quanto à proposta, ao formato do texto e quem sabe para um amadurecimento da sua ideia.
A Equipe Não Palavra te aguarda!
Referências Bibliográficas:
ESMANHOTTO, Monica; ESMANHTTO Simone. Coleção Grandes Mestres: Kandinsky. Editora Abril, SP. 2011.
KANDINSKY, Wassily. Do espiritual na arte. 1990.
________________________________________________________________________________Sobre a autora: Eliana Moraes
Arteterapeuta e Psicóloga.
Especialista em Gerontologia e saúde do idoso e cursando MBA em História da Arte.
Fundadora e coordenadora do "Não Palavra Arteterapia".
Escreve e ministra cursos, palestras e supervisões sobre as teorias e práticas da Arteterapia.
Atendimentos clínicos individuais e grupais em Arteterapia.Nascida em Minas Gerais, coordena o Espaço Não Palavra no Rio de Janeiro.
Parabéns mais uma vez! Sou sua fã!
ResponderExcluir👏👏👏👏👏👏
Muito interessante o texto.
ResponderExcluirEspero ainda a oportunidade de vivenciar essa experiência no Espaço Não Palavra.
Parabéns,
Rosângela.
Parabéns.👏👏👏
ResponderExcluirRosângela.