Por Claudia Maria Orfei Abe -
São Paulo/SP
Instagram: @claudia_abe_
A arte não é, como dizem os metafísicos, a
manifestação de uma ideia misteriosa, ou beleza, ou Deus; não é, como os
esteto-fisiologistas dizem, uma forma de brincar em que o homem libera um
excedente de energia estocada; não é a manifestação de emoções por meio de sinais
exteriores; não é a produção de objetos agradáveis; não é, acima de tudo, o
prazer; é, sim, um meio de intercâmbio humano, necessário para a vida e para o
movimento em direção ao bem de cada homem e da humanidade, unindo-os em um
mesmo sentimento. (TOLSTOI, 2002)
Quando falamos em Arteterapia,
gosto de voltar meu olhar para as Artes. Neste texto, resolvi trabalhar com um
artista ítalo-brasileiro – Alfredo Volpi, muito conhecido por suas
“bandeirinhas”.
Volpi nasceu em Lucca, Itália, em 14 de abril de 1896. Iniciou sua pintura em 1911, executando murais decorativos e trabalhou também como pintor decorador em residências da sociedade paulista da época. Evoluiu para o abstracionismo geométrico, a exemplo a sua série de bandeirinhas e mastros de festas juninas. Recebeu o prêmio de melhor pintor nacional na 2ª. Bienal de São Paulo, em 1953. (Wikipédia)
Lucca,
Itália - 2024
Em 31 de janeiro de 2020,
ocorreu a 74ª sessão arteterapêutica com meu pai (aos 85 anos) e minha tia
materna (aos 93 anos), em domicílio.
Iniciei a escrita desta sessão
no dia 23 de novembro de 2020. E ela ficou guardada na memória do computador. Hoje,
19 de outubro de 2024, ao escrever uma nova versão deste texto, meu pai já havia
completado 90 anos e minha tia acabara de completar 98 anos... pasmem !!!
Iniciei a sessão mostrando pelo
celular Alfredo Volpi e suas obras, falando da disposição das bandeirinhas e do
fundo colorido que ele pintava.
Pai e tia escolheram fundo
branco para trabalhar e as cores das bandeirinhas.
Fizemos algumas experiências
para o corte das bandeirinhas, sem muito sucesso ao usar a guilhotina. Acabei
eu mesma ajudando a cortar os papeis com a tesoura.
Essa foi uma atividade na qual
utilizaram vários materiais de apoio como réguas, lápis e borracha. Minha tia
usou régua para calcular e riscar linhas de apoio no papel e meu pai usou-a
para ajudar no alinhamento das bandeirinhas, além da sua usual pinça.
Orientei-os a usarem a cola em bastão para não enrugar o papel, apesar de o meu
pai pedir a cola líquida. Segundo Carrano e Requião, a cola em bastão tem como
uma de suas características, o controle total, e oferece uma série de vantagens
como não causar incômodo para as pessoas que não gostam de se “sujar”, não
escorre, não suja o entorno e nem sequer os outros materiais usados nas
colagens.
Durante a confecção, meu pai
mudou a configuração das bandeiras algumas vezes. Falei para ele que estava
tudo super alinhado e perguntei se podíamos colar as peças.
Pai: Calma, não dá para
colar correndo. Tem que ser simétrico. Você aprovou aqui, vou colar (e eu
digo: pode colar!). Olha, eu cheguei à perfeição da divisão do espaço, da
harmonia espacial. Isso significa que posso começar a colar. E então ele
colou a primeira bandeirinha.
Quero que elas, minhas amigas,
admirem a divisão e o espaço de montagem. Olha, estou com
falta de inspiração. Continuarei amanhã porque já estou colando meio assim...
Ele estava cansado. Durante a sessão perguntei se estava enxergando melhor e
ele disse que não – ainda apresentava um problema na visão nesta sessão. Acabou
não efetuando a colagem das bandeirinhas no papel.
Colar é um percurso, um processo, um ato
criativo que deve ser estimulado e acompanhado pelo arteterapeuta. O resultado,
a forma, a imagem e a composição devem ser valorizados, e o paciente convidado
a “dialogar” com a sua produção, dando novos significados para a mesma.
Percebendo-se como ser criativo, melhorando a sua autoestima por meio do fazer
e do lidar com o resultado da sua criação, que, se produzida durante o processo
arteterápico, vai favorecer o seu autoconhecimento. (CARRANO E REQUIÃO, 2013)
Compartilhamento
Palavra
final: Adorei
Pai: “Losango é um dos traços
mais harmônicos da arte do desenho”.
Tia: “Bandeirinhas
Coloridas”
Palavra
final: Fácil
Tia: “São bandeirinhas
multicores. Não (não se lembra de nada). Não (não quer
falar nada). Não estou inspirada”.
Esta
atividade acabou por me trazer memórias afetivas: quando eu era criança, me
lembro de produzir vários cordões de bandeirinhas para enfeitar a casa na época
das festas juninas. Sob o comando do meu pai, eu e meus irmãos produzíamos em
série. Sim, como se fosse uma produção em larga escala, cortávamos os papéis de
seda em formato de bandeirinhas, depois dobrávamos a parte superior, passávamos
a cola branca para unir bandeiras ao longo do barbante, com a atenção para
intercalar as cores dos papeis e na sequência, finalizando com as dobras do
cordão pronto para deixar tudo organizado. “Eita tempo bão”.
Nota
1:
Meu pai colocou um detalhe no centro do trabalho e disse que parecia a bandeira
do Brasil (foto inicial).
Nota
2:
deixo aqui uma homenagem a minha tia materna Luciana Orfei, protagonista deste
texto e aniversariante !
Bibliografia:
CARRANO, Eveline e REQUIÃO,
Maria Helena – Materiais de arte: sua linguagem subjetiva para o
trabalho terapêutico e pedagógico. – Rio de Janeiro: Wak Editora, 2013.
TOLSTOI, Leon. O que é arte? A polêmica visão do autor
de Guerra e Paz /Leon Tolstoi; tradução Bete Torii – São Paulo: Ediouro, 2002 –
(Clássicos de Ouro Ilustrados).
Internet:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Alfredo_Volpi Acessada em 15/10/2024. Alfredo Volpi.
Se você quiser ler meus textos
anteriores neste blog, são eles:
22- Café com Arte – A Arte do
Encontro – 13/05/2024
21- Vivência: Uma Experiência
de Encantamento – 06/11/2023
20- O Uso do Giz Pastel Seco
na Art Nouveau de Mucha – 26/09/22
19- Tô Vivo! – 22/08/22
18- A Massa Caseira como
Recurso Arteterapêutico – 18/07/22
17- As Bailarinas de Degas –
16/05/22
16- Degas e as Mulheres –
21/03/22
15- Ah, o Tempo... – 14/02/22
14- As Cores em Marilyn Monroe
– 13/12/21
13- Um Desafio – 11/10/21
12- O Branco no Branco –
23/08/21
11- Tudo Começa em Pizza –
28/06/21
10- Um Material Inusitado – O
Carimbo de Placenta – 10/05/21
9- As Vistas do Monte Fuji –
22/03/21
8- É Pitanga! – 07/12/20
7- O que é que a Baiana tem? –
26/10/20
6- Escrita prá lá de criativa
– 27/09/20
5- Fazer o Máximo com o Mínimo
– 01/06/20
4- Tempo de Corona Vírus,
Tempo de se reinventar – 13/04/20
3- Minha Origem: Itália e
Japão – 17/02/20
2- Salvador Dalí e “As Minhas
Gavetas Internas” – 11/11/19
1- “’O olhar que não se
perdeu’: diálogos arteterapêuticos entre pai e filha” – 19/08/19
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Sobre a autora: Claudia Maria
Orfei Abe
Arteterapeuta e
Farmacêutica-Bioquímica
Adoro a Itália, sempre jogo
uma moedinha na Fontana di Trevi, em Roma, assim, sempre retorno! Estive em
Lucca, a cidade das torres, apelidada de “a cidade das cem igrejas”. Fiquei
muito emocionada quando conheci Perugia, cidade do meu nonno e da minha nonna e
que produz o famoso chocolate Baci Perugina! Mamma Mia!!
Ops, eu sou ítalo-brasileira
com essa cara de japa...kkkkk
Meu contato pelo Instagram:
@claudia_abe_
Claudia, como sempre, apresentando um texto convite: É um texto que nos introduz como expectadores das sessões com "pai e a tia". Sinto-me sentada no canto da sala, só observado as atividades deles. O "pai" como sempre simétrico e cauteloso com seu trabalho. Mesmo apresentando algum cansaço na sessão, fez uma entrega linda. Ele disse que adorou e eu repito a exclamação: "Adorei também!". E a tia, mesmo se dizendo não inspirada, presenteia os leitores com um trabalho lindo, harmonioso. A Arteterapia como sempre faz bem à todos: quem pratica e quem aplica, porque pelo visto, voce não deixou de ser afetada e finalizou com um recorte de suas próprias memórias. Parabéns aos seus pacientes: pai e tia, como sempre, maravilhosos. Parabéns à tia pelo aniversário. E amei a foto na Fontana di Trevi... Lindissima... kkkkkk Obrigada pelo texto refrescante. Tania Moreira - @Caminhartes.arteterapia
ResponderExcluirMuito bom!
ResponderExcluirParabéns Cláudia por todo o seu trabalho de arteterapia 👏
ResponderExcluirO texto está excelente ❤️
Os trabalhos do Pai e da Tia fantásticos!
Continue a ser como é!
Abraço muito apertado 🤗
Parabéns, Claudia, tia e pai que puderam interagir de maneira lúdica, criando o resultado terapêutico,! Três vidas em constante construção criativa.
ResponderExcluirSuas palavras como sempre me ensinam e me encantam!Que trabalho caprichoso você tem realizado. Fico imaginando o quanto deve ser necessário ter paciência e dedicação da sua parte. E sinto que esta arte feita por eles tambem liberou boas recordações e sentimentos de paz. Parabéns mais uma vez minha amiga querida!
ResponderExcluirMas que trabalho lindo! Parabéns!
ResponderExcluirQuerida Claudia, você é uma das arteterapeutas mais autênticas e dedicadas que conheço. Aquela que realmente abeaça a causa. Muito bom!! Beijo Zília
ResponderExcluirClaudia, parabéns muito gostoso de ler e ver. Linda arte de seu pai e tia! Muito legal seu trabalho com eles! Adoro você!
ResponderExcluirParabéns Cláudia! Seu trabalho e seus textos são inspiradores sobretudo a sua vontade de interagir e carinho com eles dois. Assim se chega aos 💯!
ResponderExcluirParabéns Cláudia seu trabalho é impar e merece mesmo ser visto e admirado por todos. 👏👏👏
ResponderExcluirParabéns Claudia você está fazendo um excelente trabalho com seu pai e sua tia você está no caminho certo.
ResponderExcluirMe sentido curiosa pela tal arte terapia
ResponderExcluirParabéns pelo trabalho com seu pai e sua tia. Linda sua amorosidade e dedicação.
ResponderExcluirIncrível!
ResponderExcluirOtimo
ResponderExcluirParabéns Claudinha pela maravilhosa descrição que você fez da atividade realizada com seu pai e sua tia.
ResponderExcluirAo ler cada linha, me veio na cabeça cada cena descrita, muito embora eu não conheça nem sei pai e nem sua tia. É notório a magnitude dessa sua dedicação não apenas para entretê-los momentaneamente, mas, para resgatar neles lembranças, criatividade e o seu próprio conhecimento de época se utilizando de pesquisas e técnicas diferenciadas.
Fora isso, a sua habilidade de condução não de um, mas, de duas pessoas com idade avançada e com seus probleminhas de memória.
Parabéns mesmo pelo seu exemplo.
Como sempre, sua criatividade está presente juntamente com sua alegria de viver!!!
ResponderExcluirOi, Cláudia! Parabéns pelo trabalho lindo que efetua com seu pai e sua tia, que nos confirma que dá certo e surte efeito, haja vista a idade deles.
ResponderExcluirO resultado que mostraram, depois de criarem com as bandeirinhas , achei ótimo.
Continue postando os trabalhos que desenvolve com eles, acho muito bons.
Abraço pra você!
Clau , suas linhas me fazem viajar e imaginar esses momentos q vc tão bem descreve
ResponderExcluirParabéns pelo excelente trabalho e por generosamente dividir conosco
Em tempo: os projetos ficaram lindos
Bjo