segunda-feira, 18 de novembro de 2024

ENTRE FIOS, HISTÓRIAS E MEMÓRIAS: Inspirações nas obras da artista Victoria Villasana

 Por Débora de Castro - RJ

@deborarteterapia

Na arteterapia, a metáfora do "tecer" assume um papel poderoso e transformador, especialmente quando inspirada pelas vibrantes e inovadoras obras da artista Victoria Villasana. Conhecida por suas intervenções urbanas e retratos bordados, Villasana usa fios e cores para dar novas camadas de significado às imagens, criando um diálogo entre o tradicional e o contemporâneo, o pessoal e o coletivo.


    

O tecer histórias é um processo profundo de autodescoberta , onde cada fio e cada ponto carregam memórias e emoções que nos ajudam a compreender melhor a nossa jornada. A artista Victoria Villasana, com suas intervenções têxteis em fotografias, nos inspira a explorar essa arte de maneira significativa e transformadora.

Na arteterapia, podemos nos inspirar nas obras de Villasana para explorar nossas próprias histórias. Ao utilizar técnicas de bordado, costura e intervenção têxtil, temos a oportunidade de dar vida às nossas memórias e emoções de maneira tangível. Cada linha bordada é um gesto de cuidado, uma tentativa de conectar os fragmentos do nosso ser e encontrar sentido em nossa trajetória.

A prática de tecer histórias promove a introspecção e a conexão com a nossa essência. À medida que trabalhamos com agulhas e linhas, somos convidados a refletir sobre nossas vivências, ressignificar experiências ao longo da nossa jornada. O processo de bordar se torna uma meditação ativa, onde cada ponto e cada cor escolhida são um reflexo do nosso estado interior.

Durante uma sessão de arteterapia com um grupo de mulheres que atendo na modalidade continuada, trouxe como fonte  inspiração criativa o trabalho da artista  Villasana, as participantes são convidadas a escolher imagens pessoais que ressoem com suas jornadas. Podem ser fotografias de infância, retratos de família ou autorretratos, que serão enriquecidos com bordados, adicionando camadas de significado e emoção. Ao inserir fios coloridos e texturas, as participantes tecem suas histórias de forma literal e figurativa, transformando memórias em arte tangível. A técnica utilizada nesse processo criativo foi a fotografia e colagem de fios e objetos pessoais.

 

Registro de uma participante do grupo.

            


              Participante . D

A imagem escolhida para minha sessão de arteterapia foi  uma fotografia da paisagem que eu vejo a partir da minha janela “MEU RIO DE JANEIRO”, repleto de memórias da minha infância que transborda muitas emoções e um saudosismo de um lugar que ainda faz parte do meu cotidiano. Sou uma pessoa privilegiada , pois, vejo essa vista todos os dias e me sinto perto de Deus. Eu adorei fazer essa plástica, me despertou parte da minha história que não pode ser esquecida. Adorei tecer na fotografia, foi uma costura leve, e cada objeto colado me trouxe um sentimento de afeto e amor pela minha história de vida.

Através da arteterapia, encontramos um espaço seguro para compartilhar nossas histórias, fortalecer nossa autoestima e construir um senso de pertencimento e identidade.

Concluo meu texto com a seguinte reflexão:

Tecer e costurar nossa história de vida é, sem dúvida, um ato de amor. Cada ponto e cada linha são gestos de carinho e autocompaixão, que unem memórias, experiências e emoções em uma tapeçaria única e significativa. É através desse processo cuidadoso e intencional que encontramos nossa essência e construímos uma narrativa de aceitação e crescimento.

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Sobre a autora: Débora Castro



Sou Débora de Castro, graduada em Pedagogia, Educação Artística, com pós-graduação em Psicopedagogia e Pós-Graduação em Educação Especial e Inclusiva. Com formação em Arteterapia, AARJ/1411. Atuo na área de Educação há mais de 28 anos, como professora de Artes Visuais e História da Arte. Atualmente coordeno um grupo de Arteterapia para Mulheres e ministro oficinas Arte terapêuticas no online e presencial.

segunda-feira, 4 de novembro de 2024

REFLEXÕES FEMININAS: GEORGIA O'KEEFFE E A ARTETERAPIA

 


Por Débora de Castro - RJ

@deborarteterapia


Convido você a mergulhar na essência do feminino através das obras de Georgia O'Keeffe e da arteterapia. O'Keeffe, com suas flores ampliadas e paisagens suaves, captura a beleza, a força e a complexidade da feminilidade.

As obras de Georgia O'Keeffe possuem uma feminilidade intrigante e poderosa que transcende o simples ato de contemplação visual. Seus quadros, especialmente aqueles que retratam flores ampliadas, evocam uma profunda conexão com a essência feminina, revelando uma beleza que é ao mesmo tempo delicada e robusta.

 


"Linhas Cinzentadas com Preto, Azul e Amarelo". (1923)

O'Keeffe capturava a feminilidade através das formas orgânicas e sensuais de suas flores, que frequentemente se assemelham a formas femininas. Essa analogia não é apenas uma coincidência visual, mas uma representação simbólica do ciclo da vida, da fertilidade e da força inerente às mulheres.

Suas pinturas não são meras representações da natureza, mas expressões de sua própria experiência e visão como mulher.  Além disso, O'Keeffe usava as cores de maneira emocionalmente expressiva, transmitindo uma gama de sentimentos que vão desde a serenidade até a paixão intensa. A paleta vibrante e as composições audaciosas de suas obras revelam uma força vital que ressoa com a experiência feminina em todas as suas nuances.

No setting arteterapêutico, as obras de Georgia O'Keeffe podem servir como um ponto de partida poderoso para a exploração da identidade feminina. Através da arte, os participantes podem refletir sobre suas próprias experiências, expressar suas emoções e encontrar uma forma de se reconectar com sua essência. A feminilidade nas obras de O'Keeffe é uma celebração da beleza, da complexidade e da força das mulheres, proporcionando uma rica fonte de inspiração e introspecção.

Explorar a feminilidade através das obras de O'Keeffe na arteterapia é um convite para mergulhar nas profundezas do ser, onde a arte se torna um espelho da alma e uma ferramenta para processo de  autoconhecimento e busca do equilíbrio emocional.

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Sobre a autora: Débora Castro



Sou Débora de Castro, graduada em Pedagogia, Educação Artística, com pós-graduação em Psicopedagogia e Pós-Graduação em Educação Especial e Inclusiva. Com formação em Arteterapia, AARJ/1411. Atuo na área de Educação há mais de 28 anos, como professora de Artes Visuais e História da Arte. Atualmente coordeno um grupo de Arteterapia para Mulheres e ministro oficinas Arte terapêuticas no online e presencial.

segunda-feira, 28 de outubro de 2024

AS BANDEIRINHAS DE VOLPI



                                                                                Bandeirinhas


Por Claudia Maria Orfei Abe - São Paulo/SP

Instagram: @claudia_abe_

 

A arte não é, como dizem os metafísicos, a manifestação de uma ideia misteriosa, ou beleza, ou Deus; não é, como os esteto-fisiologistas dizem, uma forma de brincar em que o homem libera um excedente de energia estocada; não é a manifestação de emoções por meio de sinais exteriores; não é a produção de objetos agradáveis; não é, acima de tudo, o prazer; é, sim, um meio de intercâmbio humano, necessário para a vida e para o movimento em direção ao bem de cada homem e da humanidade, unindo-os em um mesmo sentimento. (TOLSTOI, 2002)

 

Quando falamos em Arteterapia, gosto de voltar meu olhar para as Artes. Neste texto, resolvi trabalhar com um artista ítalo-brasileiro – Alfredo Volpi, muito conhecido por suas “bandeirinhas”.

Volpi nasceu em Lucca, Itália, em 14 de abril de 1896. Iniciou sua pintura em 1911, executando murais decorativos e trabalhou também como pintor decorador em residências da sociedade paulista da época. Evoluiu para o abstracionismo geométrico, a exemplo a sua série de bandeirinhas e mastros de festas juninas. Recebeu o prêmio de melhor pintor nacional na 2ª. Bienal de São Paulo, em 1953. (Wikipédia) 

 


Lucca, Itália - 2024

Em 31 de janeiro de 2020, ocorreu a 74ª sessão arteterapêutica com meu pai (aos 85 anos) e minha tia materna (aos 93 anos), em domicílio.

Iniciei a escrita desta sessão no dia 23 de novembro de 2020. E ela ficou guardada na memória do computador. Hoje, 19 de outubro de 2024, ao escrever uma nova versão deste texto, meu pai já havia completado 90 anos e minha tia acabara de completar 98 anos... pasmem !!!

 


 Sessão Arteterapêutica

 

Iniciei a sessão mostrando pelo celular Alfredo Volpi e suas obras, falando da disposição das bandeirinhas e do fundo colorido que ele pintava.

Pai e tia escolheram fundo branco para trabalhar e as cores das bandeirinhas.

Fizemos algumas experiências para o corte das bandeirinhas, sem muito sucesso ao usar a guilhotina. Acabei eu mesma ajudando a cortar os papeis com a tesoura.

Essa foi uma atividade na qual utilizaram vários materiais de apoio como réguas, lápis e borracha. Minha tia usou régua para calcular e riscar linhas de apoio no papel e meu pai usou-a para ajudar no alinhamento das bandeirinhas, além da sua usual pinça. Orientei-os a usarem a cola em bastão para não enrugar o papel, apesar de o meu pai pedir a cola líquida. Segundo Carrano e Requião, a cola em bastão tem como uma de suas características, o controle total, e oferece uma série de vantagens como não causar incômodo para as pessoas que não gostam de se “sujar”, não escorre, não suja o entorno e nem sequer os outros materiais usados nas colagens.

Durante a confecção, meu pai mudou a configuração das bandeiras algumas vezes. Falei para ele que estava tudo super alinhado e perguntei se podíamos colar as peças.

Pai: Calma, não dá para colar correndo. Tem que ser simétrico. Você aprovou aqui, vou colar (e eu digo: pode colar!). Olha, eu cheguei à perfeição da divisão do espaço, da harmonia espacial. Isso significa que posso começar a colar. E então ele colou a primeira bandeirinha.

Quero que elas, minhas amigas, admirem a divisão e o espaço de montagem. Olha, estou com falta de inspiração. Continuarei amanhã porque já estou colando meio assim... Ele estava cansado. Durante a sessão perguntei se estava enxergando melhor e ele disse que não – ainda apresentava um problema na visão nesta sessão. Acabou não efetuando a colagem das bandeirinhas no papel.

Colar é um percurso, um processo, um ato criativo que deve ser estimulado e acompanhado pelo arteterapeuta. O resultado, a forma, a imagem e a composição devem ser valorizados, e o paciente convidado a “dialogar” com a sua produção, dando novos significados para a mesma. Percebendo-se como ser criativo, melhorando a sua autoestima por meio do fazer e do lidar com o resultado da sua criação, que, se produzida durante o processo arteterápico, vai favorecer o seu autoconhecimento. (CARRANO E REQUIÃO, 2013)

 

Compartilhamento

 


 Pai: “Losango muito harmônico”

Palavra final: Adorei

Pai: “Losango é um dos traços mais harmônicos da arte do desenho”.

 

 


Tia: “Bandeirinhas Coloridas”

Palavra final: Fácil

Tia: “São bandeirinhas multicores. Não (não se lembra de nada). Não (não quer falar nada). Não estou inspirada”.

 

Esta atividade acabou por me trazer memórias afetivas: quando eu era criança, me lembro de produzir vários cordões de bandeirinhas para enfeitar a casa na época das festas juninas. Sob o comando do meu pai, eu e meus irmãos produzíamos em série. Sim, como se fosse uma produção em larga escala, cortávamos os papéis de seda em formato de bandeirinhas, depois dobrávamos a parte superior, passávamos a cola branca para unir bandeiras ao longo do barbante, com a atenção para intercalar as cores dos papeis e na sequência, finalizando com as dobras do cordão pronto para deixar tudo organizado. “Eita tempo bão”.

 

Nota 1: Meu pai colocou um detalhe no centro do trabalho e disse que parecia a bandeira do Brasil (foto inicial).

Nota 2: deixo aqui uma homenagem a minha tia materna Luciana Orfei, protagonista deste texto e aniversariante !

 

 

Bibliografia:

CARRANO, Eveline e REQUIÃO, Maria Helena – Materiais de arte: sua linguagem subjetiva para o trabalho terapêutico e pedagógico. – Rio de Janeiro: Wak Editora, 2013.

TOLSTOI, Leon. O que é arte? A polêmica visão do autor de Guerra e Paz /Leon Tolstoi; tradução Bete Torii – São Paulo: Ediouro, 2002 – (Clássicos de Ouro Ilustrados).

Internet:

https://pt.wikipedia.org/wiki/Alfredo_Volpi Acessada em 15/10/2024. Alfredo Volpi.

 

Se você quiser ler meus textos anteriores neste blog, são eles:

22- Café com Arte – A Arte do Encontro – 13/05/2024

21- Vivência: Uma Experiência de Encantamento – 06/11/2023

20- O Uso do Giz Pastel Seco na Art Nouveau de Mucha – 26/09/22

19- Tô Vivo! – 22/08/22

18- A Massa Caseira como Recurso Arteterapêutico – 18/07/22

17- As Bailarinas de Degas – 16/05/22

16- Degas e as Mulheres – 21/03/22

15- Ah, o Tempo... – 14/02/22

14- As Cores em Marilyn Monroe – 13/12/21

13- Um Desafio – 11/10/21

12- O Branco no Branco – 23/08/21

11- Tudo Começa em Pizza – 28/06/21

10- Um Material Inusitado – O Carimbo de Placenta – 10/05/21

9- As Vistas do Monte Fuji – 22/03/21

8- É Pitanga! – 07/12/20

7- O que é que a Baiana tem? – 26/10/20

6- Escrita prá lá de criativa – 27/09/20

5- Fazer o Máximo com o Mínimo – 01/06/20

4- Tempo de Corona Vírus, Tempo de se reinventar – 13/04/20

3- Minha Origem: Itália e Japão – 17/02/20

2- Salvador Dalí e “As Minhas Gavetas Internas” – 11/11/19

1- “’O olhar que não se perdeu’: diálogos arteterapêuticos entre pai e filha” – 19/08/19


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Sobre a autora: Claudia Maria Orfei Abe


 
 

Arteterapeuta e Farmacêutica-Bioquímica

Adoro a Itália, sempre jogo uma moedinha na Fontana di Trevi, em Roma, assim, sempre retorno! Estive em Lucca, a cidade das torres, apelidada de “a cidade das cem igrejas”. Fiquei muito emocionada quando conheci Perugia, cidade do meu nonno e da minha nonna e que produz o famoso chocolate Baci Perugina! Mamma Mia!!

Ops, eu sou ítalo-brasileira com essa cara de japa...kkkkk

Meu contato pelo Instagram: @claudia_abe_

segunda-feira, 21 de outubro de 2024

MEMÓRIAS OLFATIVAS: CHEIROS QUE CONTAM HISTÓRIAS



Por Jeany Amorim - RJ

@jeanysamorim.arteterapia

Tem cheiros que acalentam a alma, que aquecem o coração...outros que simplesmente apetecem, que agradam ou deixam o estômago embrulhado. Você já parou para pensar quais são os “cheiros” da sua vida? O que estava presente na infância, o que marcou a adolescência, o que traz aconchego...ou aquele cheiro que anunciava a presença de alguém especial? O que os cheiros têm a ver com as nossas construções afetivas? O que eles podem contar?

A casa vizinha ao setting arteterapêutico estava limpando a fossa séptica. Por mais que as janelas estivessem vedadas, o cheiro – mesmo que leve – se fazia presente. Me desculpei. Ela imediatamente disse: não me incomoda. E, acreditem, a limpeza da fossa séptica foi o disparador da sessão. Do cheiro da fossa, partimos para as memórias da infância, onde uma vala poluída era parte do cenário da casa da avó, seu lugar de predileção: “preciso contar isso a alguém...mas amo sentir o cheiro do lixo queimado! Essa era a forma de descarte na casa da vó Maria, meu lugar mágico!”

Os cheiros penetram lugares de memórias, afetos e sensações com muita fluidez. E existe uma explicação científica para o despertar dessas memórias provocadas pelos aromas, que está diretamente ligada ao bulbo olfativo (decodificação dos odores), à amígdala (processamento da emoção) e o hipocampo (memória e cognição) – vasto campo para nossa atuação, como Arteterapeutas!

Não existe idade para trabalhar com as memórias olfativas. Claro que as crianças ainda as estão construindo, mas a potência imaginativa e criativa dos pequenos acessa as emoções - e dão formas - através dos cheiros, com muita facilidade. Já os adolescentes e adultos trazem um baú de memórias, pronto para ser acessado, degustado e (re)vivido com o cuidado que toda “volta ao passado” merece.

Quando trabalho presencialmente, escolho entre ervas, alimentos e aromas geralmente agradáveis: hortelã, pipoca, bolo, chocolate, alecrim, lavanda, tangerina, café... Esses cheiros são escolhidos e sentidos às cegas – já que a visão seria um entrave à livre associação. É delicioso acompanhar o desvelar das memórias! Em seguida, vêm as cores e as formas, dando início a um oráculo de afetos. Claro que temos o momento degustação, afinal, celebrar os afetos que nos constituem e ressignificar os que nos encontram em nossa vulnerabilidade, também faz parte do processo!

E você? Tem algum cheiro “estranho” que te desperta aconchego ou alegria? Que histórias ele conta? Que cores e formas ele tem?

Termino compartilhando o meu: cheiro de gasolina! Ele tem a cor creme, a forma de uma brasília, carrega sorrisos de crianças e cantigas e celebra férias em família!   

Obs: Imagens advindas do setting arteterapêutico com autorização dos participantes. 

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Sobre a autora: Jeany Amorim




Jeany Amorim é Arteterapeuta, Psicopedagoga, professora de Arte na Rede Estadual de Educação do Rio de Janeiro, Mediadora de Conflitos - e de pessoas! - ilustradora de livros infantis, contadora de histórias e de estrelas. Mora em meio a Mata Atlântica, na região serrana do Rio, e vem se dedicando ao estudo "das coisas naturais", trazendo ao setting - e expandindo - o ser orgânico e a natureza que somos.

segunda-feira, 14 de outubro de 2024

SEMPRE É TEMPO DE SE DESPERTAR

 

Por Débora de Castro - AARJ/1411

@deborarteterapia

Quanto tempo o tempo tem? Por que não falar do tempo numa sessão de Arteterapia? Tudo que vivenciamos na nossa vida é importante para nosso processo de autoconhecimento, portanto, tudo se conecta também com o tempo.

Em um dos encontros que atendo como Arteterapeuta com um grupo de mulheres, na modalidade continuada, o tema abordado foi sobre o  TEMPO  elemento importante que faz parte da nossa jornada. O tempo pode ser visto como um grande Despertador dos Sentidos e das nossas  transformações.

 


O tempo é precioso, portanto, ele precisa ser refletido como:

Tempo de Suavidade
Tempo de Descoberta
Tempo de Construção e reconstrução
Tempo de coragem
Tempo de renovação
Tempo de ressignificar nossa história.

O tempo é algo curioso de se olhar, tanto pra frente, quanto para trás. O tempo revela história, memória e carrega muita ancestralidade. O tempo é uma variável preciosa na vida de um indivíduo. É singular, constante, perecível. É também intransferível não temos como “emprestar” parte do nosso dia para um amigo ou familiar é insubstituível tempo perdido, não se recupera.

Vivemos um tempo diferente. Parece que o relógio acelera, tudo passa rápido aos nossos olhos. É urgente a necessidade de refletirmos sobre o tempo presente, o Aqui e o Agora... Precisamos exercitar a pausa, o respirar com significado, com leveza, para que possamos expandir o nosso olhar e dar mais sentido a tudo aquilo que buscamos para nos transformarmos e vivermos uma vida mais leve.

Durante o encontro Arteterapêutico, fizemos algumas reflexões sobre a importância de nutrir bons momentos, sozinho ou ao lado de alguém especial, também é uma boa forma de lidar com a passagem do tempo. Dessa forma, torna-se possível criar memórias e momentos de qualidade.  Depois de algumas reflexões sobre o Tempo, perguntei ao grupo:

·         Que direção o ponteiro do seu relógio está apontando?

·         Como você tem aproveitado seu tempo?

A sessão foi bastante profunda, as participantes, perceberam o quanto precisam olhar e valorizar mais o tempo presente, viver e sentir com mais leveza cada experiência. Foi bastante interessante que ao iniciar a plástica, o grupo materializou simbolicamente TEMPO, o  material expressivo foi livre, e todas conseguiram na sua individualidade expressar o significado do Tempo trazendo suas reflexões e questionamento sobre como encaram a passagem do Tempo.

A paciente H, relatou na escrita criativa:  O meu relógio viaja no tempo do meu EU interior, onde passado e futuro se conversam e resgatam momentos adormecidos. Resgatar esses momentos no tempo de hoje ressalta ainda mais a potência que tenho no meu novo EU. Perguntas surgem no meio das dúvidas já vividas nesse tempo que não volta. Meu passado caminha e meu futuro floresce cada vez mais. Obrigado tempo, sem você eu não estaria aqui hoje."

 


Plástica – participante H

Falar do tempo numa sessão de Arteterapia é muito potente, tempo é o senhor da experiência, o catalisador da impressão sensorialÉ ele que determina os acontecimentos de nossa existência. Se não administramos nosso tempo, ele pode se tornar nosso maior inimigo. Precisamos expandir o nosso olhar e aprender a pausar, respirar e entender que cada segundo, minuto da nossa vida é importante.

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Sobre a autora: Débora Castro



Sou Débora de Castro, graduada em Pedagogia, Educação Artística, com pós-graduação em Psicopedagogia e Pós-Graduação em Educação Especial e Inclusiva. Com formação em Arteterapia. Atuo na área de Educação há mais de 28 anos, como professora de Artes Visuais e História da Arte. Atualmente coordeno um grupo de Arteterapia para Mulheres e ministro oficinas Arte terapêuticas no online e presencial.

segunda-feira, 30 de setembro de 2024

“NOVA YORK É MUITO TUDO.”: RELATO DE UM PROCESSO CRIATIVO

 


Por Vera de Freitas - RJ

                Em junho de 2024 visitei uma exposição de colagem no Parque Lage, Nno Rio de Janeiro, e saí super inspirada. Queria criar algo muito grande, como já havia sido orientada, e enfim era hora de criar algo realmente de grandes dimensões, mas não tive coragem de iniciar. Era uma proposta, uma ideia desafiadora, exigindo dedicação, trabalho e muita criatividade.

Saí da exposição inspirada e desafiada. Precisava pensar rapidamente e fazer, produzir, realizar, criar. Grandiosamente.

                Resolvi trabalhar com papel Paraná, de 1m x 80cm. Seriam 3 placas desse tamanho. Ou seja, 2,40m x 1m de altura. Pensei no vínculo, numa sequência, na junção de uma placa na outra e na outra, para parecer uma única obra, a unidade, o todo.

                Todas as etapas foram deliciosas de pensar, de planejar e de fazer.  Muitas não foram fáceis nem simples e algumas desafiadoras. O tema, não tinha ideia. Fui criando e acreditando que alguma hora eu o definiria. Fui produzindo com muita liberdade e por isso, brincando com a criatividade, simplesmente fazendo.

                Comecei o processo fazendo essa união entre as 3 partes, depois coloquei cor nos papéis, por indicação do meu arteterapeuta, e realmente ficou bem melhor. Pintei flores que eu amo, mas depois de prontas não gostei. Ainda assim, deixei e continuei, fazendo uma parte e outra, depois mais uma e assim fui indo, simplesmente criando, fazendo, juntando, compondo. Ainda insatisfeita com as flores, pensando em como refazer, achei uma alternativa, cobri de papéis, fiz outras flores, recortei, colei e adorei. Resolvido. Satisfeita.

                A partir daí comecei a amar o trabalho. A cada movimento, cada imagem, símbolo ou qualquer coisa eu o amava mais. Mas ainda não sabia o que ele me dizia, nem aonde chegaria. Do mesmo jeito que simplesmente só criava, também simplesmente o amava, e por tudo isso, estava super feliz. Foram dias e meses de criações, transformações e composições. Até que agosto chegou, ele ainda não estava pronto, guardei e fui viajar. Ainda não sabia como ele terminaria, não tinha título, nem mensagem, nem história, nada. Faltava alguma coisa importante e eu não tinha ideia do que era.

                Deixei o trabalho guardado e fui para Nova York, um lugar ao qual eu nada sabia ou conhecia. Fiz uma viagem maravilhosa, completa, repleta de passeios, pontos turísticos, muita arte e beleza, lugar de muita riqueza, luzes, cores, novidades, intensidade, muita grandeza. Nova York é muito tudo. Muito mesmo. Eu me surpreendi e me encantei. Foi muito melhor do que eu podia imaginar. Voltei lotada de estímulos, de vontade, de energia e com vontade de todo tipo de arte. Era muito tudo.  Precisei escrever para registrar, relembrar, para fixar e não esquecer, sobre muitas coisas vistas, experimentadas e vividas. Produzi, com sacolas e embalagens que trouxe de lá, um caderno para esses registros. Escrevi sem parar, precisava organizar e também esvaziar. Escrevi muito.

                Alguns dias se passaram e ainda com a cabeça, o coração e a alma cheios de ideias e vontades, lembrei do meu grande trabalho. E, para minha surpresa percebi que tudo que havia visto e vivido, estava representado naquele trabalho, guardado atrás da porta do quarto, aguardando o meu retorno. Mesmo sem estar finalizado, ele já representava a minha viagem. Era Nova York com muito de tudo. Tudo se encaixou. Das imensas flores que me encantaram no primeiro momento, de passeios por lugares lindos, de tantas pessoas diferentes, pessoas com estilos próprios de simples a exuberantes, dos mosaicos e todo tipo de arte nas diversas estações do metrô, de arte em todo lugar, dos muitos tênis, sapatos e andanças durante toda a viagem, e todo meu deslumbramento. Tudo muito. Maravilhoso, grandioso, estimulante, inspirador e acima de tudo surpreendente. E agora, era fácil finalizar com algumas coisas que eu trouxe exatamente para fazer arte.

                Comecei esse trabalho grande antes de conhecer o que ali representei. Antecipei, não sei como aconteceu. “Só se que foi assim...” como diria Ariano Suassuna. Trabalhei com a minha subjetividade, com a minha alma, com liberdade e criatividade, com a minha intuição mais profunda.

Sincronicidade e transcendência são conceitos da psicologia analítica de Jung, que estudo há anos e agora consegui vivenciar e realizar. Quando revejo meu processo criativo percebo que fui além. Ultrapassei meus limites conscientes para trabalhar, expressar, representar coisas muito internas da minha alma, da minha psique. Foram inshigts criativos e livres a partir da intuição, de uma percepção inconsciente. E foi isso que aconteceu. Foi disso que esse trabalho grande nasceu. Muito além de mim. Ultrapassei, transcendi, criei.

                Nova York fez isso comigo. É muito tudo.

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Sobre a autora: Vera de Freitas



Advogada, Fomação e Pós Graduação em Arteterapia e Envelhecimento Ativo,  Subjetividade e Arte(POMAR).

Administradora do Instituto VENHA CONOSCO - Tijuca, RJ

Professora de Iniciação Artística - Instituto ZECA PAGODINHO 

Professora de Ateliê Terapêutico/Curso de Formação - POMAR

Diretora Administrativa  da AARJ 

Facilitadora de Grupo de Arteterapia  para adultos e Grupo de Desenho Livre.

Ateliê  de PAPEL MACHÊ e Diário Criativo.

segunda-feira, 23 de setembro de 2024

A BUSCA PELO PERTENCIMENTO - REFLEXÕES NA ARTETERAPIA

 


Por Sarita Elias 

@sarita_arteterapeuta


O tema do pertencimento tem sido uma constante na minha trajetória como Arteterapeuta. Já escrevi um artigo sobre este assunto no contexto de idosos residentes em uma Instituição de Longa Permanência e atendo uma cliente que mora fora do Brasil há 12 anos, estando sempre em diálogo com essa temática, ainda que de forma inconsciente. Recentemente, recebi uma nova cliente que expressou a seguinte inquietação: “Não me sinto bem neste lugar, não me sinto pertencente”. Pertencimento! Palavra que tem o mesmo significado de pertença, que significa "aquilo que faz parte de; pertence, propriedade; atribuição". Como seres sociais, faz parte da nossa natureza humana a necessidade de pertencer, de fazer parte de algo. De acordo com Cardella (2015): 

"A vida humana é sempre vida de alguém, que acontece em meio aos outros. O outro, o diferente, o estranho, nos limita, desafia, contesta, desaloja, desarruma e também confirma, testemunha, acolhe e se deixa transformar pelo nosso modo de ser. Paradoxalmente, nos faz outros para nós mesmos e possibilita que nos apropriemos do próprio" (CARDELLA, 2015, p. 181). 

Sendo o pertencimento uma necessidade humana fundamental, naturalmente, essa questão chega à clínica arteterapêutica. Isso me faz refletir sobre a importância de estarmos preparados para acolher essa busca, o que implica, entre outras coisas, compreender o que significa pertencer para cada cliente. No entanto, é igualmente crucial diferenciar entre um desejo autêntico e legítimo de pertencer e o anseio por "encaixar-se" em um contexto de forma irrefletida. 

Esse desejo irrefletido de "se encaixar" pode estar fortemente ligado à perda de identidade, causada por uma variedade de fatores. Um caminho terapêutico pode ser criar propostas que fortaleçam a autoestima e o senso de identidade. Ao perceber-se como único e singular, o indivíduo tende, naturalmente, a descobrir a sua pertença nos espaços que lhe são dignos, afastando-se dos lugares que não lhe cabem.

 Além disso, o pertencimento é apenas uma das várias dimensões que constituem a dignidade humana. Observar como o cliente se relaciona com essas diferentes dimensões – como a sua criatividade, senso de responsabilidade, hospitalidade, reconhecimento de si e do outro, entre outros aspectos – é essencial. Isso nos permite compreender melhor as razões pelas quais essa necessidade de pertencimento emerge nas sessões. 

Compreender as necessidades do cliente requer uma abordagem cuidadosa, uma vez que é o próprio cliente quem sabe o que precisa ser trabalhado em terapia. Como afirma Cardella (2015): "Só quando aceitamos que não conhecemos o outro é que podemos, de fato, reconhecê-lo" (CARDELLA, 2015, p. 51). 

Com esses pontos em mente, o acolhimento, as propostas e os materiais selecionados na arteterapia devem funcionar como uma ponte entre a dor inicial que a ausência de pertencimento provoca e a descoberta do lugar do cliente no mundo. Isso, por sua vez, permite que o pertencimento seja vivido como uma consequência natural do "ser". 

Bobliografia CARDELLA, B e a t riz. D e v olt a p a r a c a s a. 2. e d. A m p a r o: G r á fic a F o c a, 2 0 2 0. 2 9 6 p.


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Sobre a autora: Sarita Elias - AATESP 1104/0923 


Formação: Graduação em Pedagogia e Artes Visuais e pós graduação em Arteterapia pelo instituto Faces 

Área de atuação/projetos/trabalhos: Sou Sarita Elias, Arteterapeuta, Arte-Educadora e Artesã. Atuo como Arte-Educadora com crianças de escola pública e Arteterapeuta com atendimentos individuais e em grupo no formato online e presencial. Atualmente faço parte do projeto de Atendimento Social do Não Palavra como Arteterapeuta e coordeno o grupo de Arteterapia online “Criar, cuidar e ser!”. 

Contato: @sarita_arteterapeuta (instagram); sarita.arteterapeuta@gmail.com (email)