Por Juliana Mello – RJ
“A alma não tem segredo
que o comportamento não revele”. (Lao-Tsé)
Desde
a nossa infância, criamos pensamentos sobre nós mesmos, sobre o mundo e sobre nosso
futuro, que vão se reforçando ao longo da vida, dando origem ao que chamamos de
crenças. Essas crenças dão origem aos
comportamentos, que nos auxiliam na adaptação ao meio em que vivemos. Criamos
assim um ciclo de funcionamento inconsciente onde pensamentos e comportamentos
se retroalimentam. Conforme Darwin, citado por Renato Caminha e Marina Caminha,
“Se o comportamento se mostra eficaz à adaptabilidade da espécie ele será
maximizado, ou seja, passará a ser generalizado no comportamento desta
espécie...” (2013)
Passamos
então a repetir padrões de comportamento, visto que, em determinada época de
nossa vida, eles nos auxiliaram em nossa relação com o meio. Porém, muitos
desses comportamentos, e pensamentos, conforme vamos nos desenvolvendo,
tornam-se disfuncionais, mas não conseguimos “eliminá-los” de nossa mente e
passamos a vida reforçando e mantendo ativos no funcionamento do dia a dia. Como
descreve a psicóloga Thaís Petroff em seu blog:
O que
os torna disfuncionais, é que são mantidos e perpetuados por toda a vida e em
situações em que não necessariamente se “encaixam”. Transformam-se em padrões
arraigados de pensamentos e crenças distorcidas. (2011)
E enquanto
não tomamos consciência desse funcionamento disfuncional, passamos pela vida
repetindo ações que nos levam a pensamentos do tipo: “não nasci para isso”; “as
coisas nunca dão certo para mim”; “eu tenho dedinho podre” e por aí vai.
Gerando sentimentos como frustração, decepção e ansiedade, nos impedindo de
alcançar nossos objetivos.
E agora você pode estar se
perguntando: E o que o mito de Sísifo tem a ver com isso?
Sísifo, da mitologia Grega, era muito inteligente e esperto.
Ele conseguiu enganar os deuses em
busca de objetivos que o beneficiasse. Ao descobrirem o comportamento de
Sísifo, os deuses lhe deram um grande castigo: Essa punição consistia em escalar uma pedra pesada pela
encosta de uma montanha íngreme. E quando ele estava prestes a chegar ao topo,
a grande rocha cairia no vale, para ele escalar novamente. Isso teria que se
repetir por toda a eternidade.
E é
isso que acontece conosco, quando temos padrões disfuncionais, quando nos
deparamos com situações que podem ser gatilhos e que nos aproximam dos nossos
objetivos, ativamos nossas crenças e nos autossabotamos, “deslizando nossa
pedra ladeira abaixo novamente”. O que antes nos beneficiava, para sobrevivermos
ao meio em que estávamos inseridos, agora nos revela como uma “pedra”
disfuncional.
Em TCC
podemos trabalhar estes padrões, através do Registro de Pensamento Disfuncional
(RPD), observando os resultados que encontramos e que comportamentos
utilizamos, através da Teoria dos Esquemas, entre outras técnicas.
E como podemos trabalhar em Arteterapia?
Trabalhamos
observando o nosso processo de criação e os conteúdos que nos são mostrados.
Como podemos ver abaixo, os trabalhos de uma paciente de 31 anos, que tem
algumas questões em sua vida relacionadas as relações interpessoais, que para
ela são difíceis de serem faladas e vivenciadas. Ela chegou à terapia com o
olhar muito voltado para o outro, em querer agradar e não magoar, acreditando
que ao expressar algo que não gostasse, o outro ficaria chateado. E com
pensamentos sobre si de que não era boa o suficiente em seu trabalho, “que era
uma fraude”, que as pessoas só a elogiavam para agradá-la. Além de “excluir” a
possibilidade de um relacionamento afetivo.
Papel preto amassado
e papel vegetal
Essas
duas imagens são um recorte do processo, em que mostram as partes desintegradas
e “esquecidas”, que só com a fala seriam difíceis em ser acessadas, pois para
ela, conscientemente, está tudo bem como está, o tempo está passando e não se
pode ter uma solução, já está acostumada, isto é, nunca irá deixar de duvidar
do seu potencial e nunca terá um relacionamento afetivo.
O
processo arteterapêutico tem permitido que ela entre em contato com novas
possibilidades, voltando seu olhar para si mesmas e sobre seus objetivos
pessoais. A proposta desta última imagem foi que ela pudesse trazer contorno aos
pontinhos que eu havia feito na folha, como forma de continuar o movimento em
que ela tem feito, buscando o equilíbrio entre ela e o outro. Além de relaxar,
pois havia sido um dia cansativo de trabalho. Ela, então, escolheu como ligar
os pontinhos e sentiu vontade de trazer cores diferentes para cada espaço. Ao
final, conversamos sobre as produções anteriores e como agora ela conseguiu
integrar as partes e trazer cores. Ela tem olhado mais para seus objetivos
pessoais e buscado meios para realizá-los. Alguns aspectos de sua vida ainda são
difíceis de vivenciar, porém estamos trabalhando com os graus de complexidade,
e as coisas mais simples estão começando a serem concretizadas.
Ligando os pontinhos em papel A4
Bibliografia
BECK, Judith S. Terapia
Cognitivo-Comportamental: teoria e prática. 2º edição. Porto Alegre: Artmed,
2013.
CAMINHA, Renato M; CAMINHA,
Marina G. Baralho dos comportamentos: efeito bumerangue. 1º edição. Curitiba:
Sinopse, 2013.
Clínica de Psicanálise. O
Mito de Sísifo: resumo em filosofia. Site: O Mito
de Sísifo: resumo em filosofia - Psicanálise Clínica (psicanaliseclinica.com)
Acesso em: 25/05/2022.
PETROFF, Thais. De onde vêm
nossas crenças negativas e comportamentos disfuncionais? Site: https://www.thaispetroff.com.br/autoconhecimento/de-onde-vem-nossas-crencas-negativas-e-comportamentos-disfuncionais/ Escrito
em 2011. Acesso em: 25/05/2022.
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Sobre a autora: Juliana Mello