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segunda-feira, 29 de junho de 2020

A ESTIMULAÇÃO COGNITIVA E A ARTETERAPIA PELO OLHAR DO TELE ATENDIMENTO COM IDOSOS



Por Juliana Ohy - SP

Site: http://www.julianaohy.com.br


A internet vem sendo protagonista no contexto profissional e pessoal do ser humano há muitos anos. Mas nunca utilizamos tanto nossos aparelhos celulares, tablets ou computadores como agora. Atualmente, a necessidade de aprender mais sobre tecnologia e o mundo virtual cresceu.

O tele atendimento virou, rapidamente, a nossa realidade em tempos de COVID-19. Essa nova forma de abordagem terapêutica nos reaproximou dos pacientes distanciados do mundo social. Enquanto antes pensávamos que o virtual era frio e impessoal, agora virou o meio de fazer com que as pessoas sintam-se mais próximas umas das outras, mesmo que cada uma em sua casa. E, apesar de ser algo novo para eles, os idosos vem surpreendendo a cada dia com suas habilidades tecnológicas.

A proposta de fazer um tele atendimento com pacientes idosos nem sempre é aceita logo de início, afinal tudo que é desconhecido nos provoca inseguranças e resistência. É preciso deixar que o idoso experimente e perceba que aquilo é possível. Assim, o papel do terapeuta deve ser facilitar ao máximo essa adesão a nova abordagem. Quanto menos o idoso precisar fazer, nesse momento relacionado a aprendizagem da tecnologia, melhor. Isso porque devemos inserir uma nova aprendizagem a cada vez. Ou seja, primeiro o idoso deve aderir ao tratamento. Assim, inicie convidando-o para uma conversa de vídeo ou telefone de poucos minutos e deixe-o se sentir a vontade com aquela forma de se comunicarem.

Uma vez que o idoso percebeu que a tecnologia não é um impedimento para que ele possa encontrar seu terapeuta, conversar com seus filhos e ver seus netos, ele estará mais apto e disponível para aceitar os próximos passos do tele atendimento.

Outro ponto importante quando falamos em tele atendimento é saber que a atenção exigida do terapeuta e do paciente é muito maior, pois ambos estão visualizando apenas uma parte do corpo, o que dificulta a compreensão através das expressões corporais. Alguns tele atendimentos ainda estão sendo feitos apenas por telefone, o que diminui ainda mais as chaves de comunicação.

Segundo os especialistas Gianpiero Petriglieri, professor do Insead, e Marissa Shuffler, professora da Universidade Clemson, algumas chaves de comunicação se perdem em uma videoconferência, como o tom de voz, parte das expressões faciais e gestos físicos. Isso nos força a prestarmos mais atenção ao que está sendo comunicado, causando maior esgotamento mental.
Diante disso, o tempo no tele atendimento deve ser analisado. Uma sessão presencial de duração de 60 minutos com um paciente, talvez deva ser reduzida para 45 minutos com esse mesmo paciente. Essa foi uma constatação que ficou evidente em meus próprios tele atendimentos.

Outra observação importante é para o tipo de aplicativo que será utilizado. Alguns deles permitem que a tela do computador seja compartilhada, assim, ambos (terapeuta e paciente) conseguem visualizar um exercício de estimulação cognitiva, por exemplo. Outros, não permitem esse compartilhamento. Nesse caso, é preciso trabalhar com o celular e o computador concomitantemente, mostrando o exercício na tela do computador pela câmera do celular. Isso vale para exercícios cognitivos, mas também para imagens, por exemplo, quando queremos trabalhar através da arteterapia.

Os materiais que podem ser utilizados como recursos terapêuticos e de estimulação também são de suma importância. Materiais coloridos, com fácil visualização são melhores para trabalhar. Na arteterapia, em especial, trabalhar com imagens, palavras, metáforas e músicas tem dado ótimos resultados quando o assunto é tele atendimento.



Assim como no setting terapêutico, o fazer junto pode aumentar o vínculo positivo. Pintar uma mandala junto com o paciente, tomar um café ao mesmo tempo durante o atendimento, ouvirem a mesma música ou lerem uma poesia, pode trazer de volta a sensação de proximidade e calor humano em tempos de quarentena.

            De fato, o tele atendimento veio para ficar e devemos nos especializar e transformar essa abordagem em algo simples e acessível para todos. Nosso trabalho como terapeutas é criar possibilidades diante do caos, mesmo que o caos seja o simples fato de não estarmos adaptadas ao Novo Normal.

Referências Bibliográficas



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Sobre a autora: Juliana Ohy





Formação: Psicóloga, Arteterapeuta, Psicopedagoga, Especializada em Psicogeriatria e Neuropsicologia, Mestre em Saúde Mental e Doutoranda em Ciências da Saúde.

Área de atuação/projetos/trabalhos:

Sócia-diretora da Clínica Synapse: Geriatria e Estimulação Cognitiva (Jundiaí – SP), autora do Livro: Jogos Cognitivos: Um olhar multidisciplinar, pela editora WAK, pesquisadora na área de Neurocirurgia pelo Hospital Sírio-Libanês – SP. Membro da equipe e professora do curso Neurociências da Educação do CBI of Miami, palestrante na área de Neurociências, Gerontologia e Arteterapia, professora dos cursos Arte e Cognição: Estimulando o cérebro através da arte e Jogos Cognitivos.

segunda-feira, 22 de junho de 2020

UM OLHAR MAIS AMPLIADO SOBRE A CRIATIVIDADE (PARTE 1)


Por Selma Lessa RJ-PE
slessa.rj@terra.com.br

Este texto é um fragmento da minha monografia da Pós Graduação em Psicologia Junguiana intitulada “INTERFACES ENTRE CRIATIVIDADE E OPUS ALQUÍMICO SOB O VIÉS DA PSICOLOGIA ANALÍTICA”. Este fragmento será dividido em duas partes para publicação no blog.

A palavra criatividade vem do latim Creatus, significando criar, do verbo infinito CREARE. E, de acordo com o dicionário Houaiss, criatividade pode ser definida como "a qualidade ou característica de quem [...] é criativo; inventividade; inteligência e talento, natos ou adquiridos, para criar, inventar, inovar". O dicionário Aurélio define criatividade como "capacidade criadora, engenho, inventividade; capacidade que tem um falante nativo de criar e compreender um número ilimitado de sentenças em sua língua." Portanto, podemos entender que ser criativo é encontrar novas soluções para novos e velhos problemas.

Todo o processo de criação tem em sua origem, tentativas de estruturação, de experimentação e controle, processos produtivos onde o homem se descobre, onde ele próprio se articula a medida que passa a identificar-se com a matéria. São transferências simbólicas do homem à materialidade das coisas, e que novamente são transferidas para si. (OSTROWER, 1991, p. 53)

A criatividade sempre despertou meu interesse desde a infância: nos cursinhos de pintar, mais tarde nas aulas de artesanato, restauração de móveis, na formação em Arteterapia, na faculdade de Artes Visuais, nos atendimentos psicológicos e arteterapêuticos, como também na pós em psicologia Junguiana, “A criatividade e o Opus Alquímico” foi o tema do TCC e continua sendo tema da minha paixão no dia-a-dia.
Na curiosa pesquisa sobre a morada da criatividade, e percebendo o porquê da facilidade de alguns e frustração de outros (me sentindo por muitos anos incluída nessa categoria) em criar, se ela não vinha até mim (criatividade), decidi ir buscá-la porque meu processo criativo dependia dela, em todos seguimentos da minha vida profissional e pessoal.
De onde vem a criatividade, o ato criativo? Esta é a pergunta que sempre me instigou na descoberta profissional e de vida.
Erich Neumann, (2014, p.26) Na História da Origem da Consciência, fala sobre a questão do princípio que é também a questão: ”de onde?”:
... trata-se da pergunta original e fatídica, que tanto a cosmologia e os mitos da criação sempre tentaram dar novas e diferentes respostas. Essa pergunta original acerca da origem do mundo é, ao mesmo tempo, uma pergunta sobre a origem do homem, da consciência e do ego; é a pergunta fatal: “de onde vim”? , que desafia o ser humano assim que este atinge o limiar da autoconsciência. (NEUMANN, 2014 p.26/27)
O percurso do processo de individuação requer superar desafios, e a criatividade é uma ferramenta essencial. O ato criativo traz o novo para a vida cotidiana, pois provoca um transitar de conteúdos entre a consciência e o inconsciente, e dinamiza as transformações necessárias para que o homem atinja seus potenciais.

Segundo Fayga (1991):

Nessa busca de ordenações e de significados reside a profunda motivação humana de criar; trata-se de possibilidades do homem que correspondem a necessidades existenciais. Impelido a compreender, o homem é impelido a criar. Ele precisa ordenar os fenômenos e a avaliar o sentido das formas ordenadas, precisa comunicá-lo à outros seres humanos através de novas formas ordenadas. (OSTROWER, 1991, p. 11)

Para Jung (1988) a criatividade faz parte dos instintos, portanto, ela (a criatividade), não está fora do ser, mas, dentro dele. Quando relatei que decidi ir buscar a criatividade, estava tão voltada para fora que me esqueci de olhar para dentro, para meus instintos.
Jung (1988) relata os cinco grupos de fatores instintivos básicos do homem: a fome, a sexualidade, a atividade, a reflexão e a criatividade.

Sobre a criatividade, Jung (1988) relata ser o homem dotado com a capacidade de criar coisas novas e capaz também de reprimir seus instintos, mesmo sendo o instinto, um sistema organizado de forma estável e inclinado à repetição. Assim como os outros instintos, o instinto criativo urge ser satisfeito.

Ele faz uma observação importante no que ele chama de criatividade sendo um instinto, dizendo não estar certo ao usar a palavra “instinto” e o “aspecto criativo” do homem juntos, mas o faz por achar que a criatividade se assemelha ao instinto (JUNG, 1988, § 245).
Sobre a criatividade, diz Jung:

É compulsivo, como o instinto, mas não é universalmente difundido nem é uma organização fixa e herdada invariavelmente. Prefiro designar a força criativa como sendo um fator psíquico de natureza semelhante à do instinto. Na realidade, há íntima e profunda relação com os outros instintos, mas não é idêntico a nenhum deles. Suas relações com a sexualidade são um problema muito discutido, e sem muita coisa em comum com o impulso a agir e com o instinto de reflexão. Mas pode também reprimir todos estes instintos e colocá-los a seu serviço até a autodestruição do indivíduo. A criação é ao mesmo tempo destruição e construção. (JUNG, 1988 § 245).

Ao analisarmos atendimentos terapêuticos que se utilizam de técnicas expressivas, verificamos a criatividade sendo de fato exercida, cujo objetivo é colocar a psique para recriar a si próprio, sendo uma narrativa do que acontece ao indivíduo. Entre esses pacientes, alguns fazem arte, outros fazem o criativo (instinto).

As técnicas expressivas em psicoterapia visam recuperar e recolocar o instinto criativo no seu devido lugar que é o de gerar formas e aí se encontra a criatividade.
De acordo com Fayga (1991), ela cita:

Nós nos movemos entre formas. Caminhar pela rua e observar as casas e as pessoas, notar a claridade do dia, o calor, reflexos, cores, sons, cheiros, lembrar-se do que se tencionava fazer, de compromissos a cumprir, gostando ou detestando o preciso instante e ainda associando-o a outro – são formas em que as coisas se configuram para nós. De inúmeros estímulos que recebemos a cada momento, de estados e sensações que ocasionam, relacionamos alguns e, nesses relacionamentos, nós os percebemos. (OSTROWER, 1991, p. 11)

Mircea Eliade (2000), relata que a psique tende naturalmente a criar caminhos para si próprio, ela é auto-reguladora, auto criadora.

Para o alquimista, o homem é um criador: ele regenera a natureza e domina o tempo e aperfeiçoa a criação divina. Poder-se-á comparar esta <<escatologia natural>> à teologia evolucionista, redemptória e cósmica de Teilhard de Chardin, que é geralmente aceite como uma das raras teologias cristãs otimistas. Será certamente esta concepção do homem e como ser criador de uma imaginação inesgotável que explicará a sobrevivência dos ideais alquimistas na ideologia do século XIX; ...(ELÍADE, 2000)

O ato criativo está enraizado nesta imensidão que é o inconsciente e qualquer forma de entendimento a respeito dele, estará fadada ao fracasso.

Jung (1985) afirma que muito pouco pode ser falado sobre o artista, por ele reconhecer que uma obra de arte é um produto complexo da atividade psíquica. Seria leviano fazê-lo, pois tenderia ao achismo. Considerando que a criatividade é originária de uma área onde a verdadeira vida psíquica tem a sua origem, que é no inconsciente coletivo.

A totalidade dos processos psíquicos que se dão no quadro do consciente, pode ser explicada de maneira causal; no entanto, o momento criador, cujas raízes mergulham na imensidão do inconsciente, permanecerá permanentemente fechado ao conhecimento humano. (JUNG, 1985 § 135)

Em seu livro “O Mito da análise”, Hillman (1984) devota um capítulo inteiro sobre dimensões da criatividade, expressões criativas, investiga em sua escrita, as noções que temos sobre criatividade e sobre as pessoas criativas, os símbolos, metáforas, fantasias criadas acerca do assunto.

Hillman (1984) compreende a criatividade estando fora do domínio do psíquico e corrobora com a idéia Junguiana de um instinto criativo. O autor também reforça ser a criatividade um tema complexo e que nossa consciência não é capaz de absorver e analisar toda aura que a envolve.

Converte o mistério criativo num problema a ser solucionado não é somente indecente, é impossível. Analisar a criatividade significaria desnudar a natureza do homem e a natureza da criação. Esses são mistérios que dizem respeito a questões de onde viemos, do que vivemos e para onde retornamos. Não se sujeitam a análise, a uma psicologia explicativa. Podemos especular e fantasiar e com nosso logos contar uma história, isto é, confabular um pouco, apresentando um mitologema como contribuição à criatividade, para celebrá-la, comungar com ela; mas não nos encarregaremos de seu sacrifício (mesmo se isso fosse possível), nem de seu desmembramento ritual, por meio da análise psicológica. Portanto não haverá definição, que limita e corta, mas uma ampliação, que estende e relaciona. (HILLMAN, 1984, p. 37)

Justifica que a criatividade está para além da alma, todavia é intrínseco ao homem. “A força instintiva ectopsíquica[1], porque vem de além da psique, é mais que humana e mais potente que seu possuidor.” (HILLMAN, 1984, p. 41)

Hillman (1984) comunga com Jung quando, ao falar sobre o criativo como instinto, não se restringir a poucos, sendo eles gênios ou artistas, seria novamente confundir o artístico com ao criativo e em sendo instinto básico, assim como fome, sexualidade, atividade e reflexão, é dado a todos.

Sobre a criatividade psicológica, Hillman (1984)

Mesmo sem talento artístico, mesmo sem a força egóica da vontade, mesmo sem fortuna, uma forma do criativo está continuamente aberta para cada um de nós: a criatividade psicológica. Fazer alma: nós podemos engendrar a alma. Ou, como diz Jung, “Mas o que pode um homem ‘criar’ se por acaso não for um poeta? (...) Se você não tiver absolutamente nada para criar, então talvez crie a si próprio.” (HILLMAN 1984, p. 44)



As necessidades alcançam a maturidade quando chega a sua hora. Em outras palavras, é então que o espírito criador (que se pode chamar de espírito abstrato) tem acesso à alma e depois às almas, provocando uma inspiração, um impulso íntimo. (KANDINSKY, 2015, p. 140)

Sobre a necessidade da criatividade em gerar formas:

Quando as condições necessárias à maturação de uma forma específica estão preenchidas, essa aspiração, esse impulso íntimo recebem o poder de criar no espírito humano um novo valor, que começa a viver consciente ou inconscientemente no homem. A partir desse momento, o homem busca consciente ou inconscientemente um forma material para o valor novo que vive nele sob uma forma espiritual. (KANDINSKY, 2015, p. 140//141)
No próximo texto será dada a continuidade desse fragmento de minha monografia, com o título “A Criatividade e o Mito”.




[1] A ectopsique é um sistema de relacionamento dos conteúdos da consciência com os fatos e dados originários do meio ambiente, um sistema de orientação que concerne à minha manipulação dos fatos exteriores com os quais entro em contato através das funções sensoriais. (Jung, 1998, p.9).

REFERÊNCIAS

Dicionário Houaiss.
ELIADE, Mircea – O Mito da Alquimia. Rio de Janeiro. Editora Fim do Século, 2000.
HILLMAN, James. O Mito da Análise: três ensaios de psicologia arquetípica; tradução de Norma Abreu Telles. – Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1984. (Coleção Psiquê; v.1)
JUNG, C. G. Determinantes psicológicas do comportamento humano. In: ______. Obras Completas de C. G. Jung. Volume VIII: a dinâmica do inconsciente. Tradução de Pe. Dom Mateus Ramalho Rocha. 3ª edição. Petrópolis, RJ: Vozes, 1988.
_______. Mysterium Coniunctionis: Pesquisas sobre a separação e a Composição dos Opostos Psíquicos na alquimia / C.G. Jung., com a colaboração de Marie-Louise von Franz; tradução Valdemar do Amaral; revisão literária Orlando dos Reis; revisão técnica Jette Bonaventure. - Petrópolis. RJ: Vozes .2015.
JUNG, C.G. Psicologia e Alquimia, vol. 12, Vozes: Petrópolis, 1994.
JUNG, C. G. Psicologia e poesia. Tradução de Dora Ferreira da Silva e Ruben Siqueira Bianchi. In: ______. Obras Completas de C. G. Jung. Volume XV: O espírito na arte e na ciência. Tradução de Maria de Moraes Barros. Petrópolis, RJ: Vozes, 1985.
KANDINSKY, Wassily Do Espiritual na Arte; tradução Àlvaro Cabral, Antonio e Pádua Danesi. – 3. Ed. – São Paulo: Martins fontes – Selo Martins, 2015.
NEUMANN, Erich – História da Origem da consciência. Ed. São Paulo: Cultrix, 2014.
OSTROWER, Fayga. Criatividade e processos de criação. 13. Ed. Petropólis: Vozes,1991.


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Sobre a autora: Selma Lessa





Psicóloga/ Arteterapeuta/Artista visual/ Instrutora de Yoga Integral
Pós-Graduada em Arteterapia
Pós-Graduanda em Psicologia Analítica
Colaboradora e professora do Ateliê de Artes e Terapias Eveline Carrano.

segunda-feira, 15 de junho de 2020

UM ENCONTRO COM BEATRIZ MILHAZES EM MEIO A QUARENTENA



Por Laila Alves de Souza - Curitiba/Rio de Janeiro
lai_ajt@hotmail.com

Já vamos para mais de 2 meses de quarentena. A rotina e a convivência (para aqueles que moram com outras pessoas) tornaram-se um emaranhado de diversas sensações e instabilidade. De repente nos deparamos com uma enxurrada de lives, cursos, notícias, entrevistas e textos disponibilizados pela internet. O nosso alcance do mundo lá fora foi ofertado pelo contexto virtual, agora mais do que nunca. De um lado, temos essa grande vantagem em relação aos nossos ancestrais que passaram por outras epidemias. Mas por outro, vejo uma poluição e excesso de informações. São muitos estímulos e objetos chamando e seduzindo nosso investimento de energia, em um lugar que não existe fronteiras. A internet é um lugar que, paradoxalmente, não é um lugar. Pois se formos pesquisar o significado da palavra “lugar” no google aparecerá a seguinte definição: parte delimitada de um espaço; local, sítio, região.”. Não existe delimitação nessa parte, ou seja, o mundo virtual não tem limite.

Mas nossa energia psíquica tem. Ao nos defrontarmos com essa enxurrada de informações, nós ansiamos em absorver o máximo de coisas interessantes que nos aparecem, mas nossa energia psíquica não dá conta disso. Em outras palavras, queremos investi-la da melhor maneira possível, mas o mergulho nesse “lugar” virtual a desmembra. Nós nos exaurimos ou, o que acontece muitas vezes, nós nos distraímos. Quantas vezes esse “lugar” serviu mais de distração do que de ter gerado conteúdo satisfatório?

Em meio a essas reflexões resolvi sair um pouco do virtual e ir pra matéria. Fui arrumar gavetas desorganizadas, “pôr a mão na massa”. Nesse exercício, achei um caderninho. E nele vi anotações de uma palestra sobre Beatriz Milhazes realizada pela Eliana Moraes. E as palavras que anotei me chamaram atenção.                  

QUEM É BEATRIZ MILHAZES?

Beatriz Milhazes é uma artista plástica contemporânea nascida no Rio de Janeiro. Ingressou na Escola de Artes Visuais do Parque Lage em 1980 e hoje é considerada uma das mais renomadas artistas brasileiras, destacando-se em mostras internacionais nos Estados Unidos e Europa.

Seu trabalho é composto por pintura, gravura e ilustração e suas obras contemplam uma composição de diversos elementos diferentes, que abrange a abstração geométrica, a colagem, a utilização de materiais como rendas, bordados e até papéis de balas.  De acordo com MORAES (2019):

Beatriz mistura abstração, geometria, modernismo, pop art, concreto e neoconcretismo brasileiros. Mas a cor é um elemento estrutural na obra da artista. São cores intensas e padronagens que atraem o olhar, intensificam sensações. A manufatura é muito importante nos trabalhos da artista, que tem por característica a pesquisa de novas técnicas e materiais. Também faz colagens sobrepondo camadas de cor com materiais como embalagens de bala e chocolate, e papéis de diversas cores e texturas.” (MORAES, 2019)

No entanto, não vou me aprofundar ao que se refere ao campo artístico, mas sim ao campo psicológico, ou seja, à psicologia que há nas obras de Beatriz Milhazes.

Como descrito na citação acima “a manufatura é muito importante nos trabalhos da artista, que tem por característica a pesquisa de novas técnicas e materiais”. Uma das palavras em destaque no meu caderninho foi a manufatura. Tendo isso como base, Beatriz, em uma obra, faz desta um processo. Este processo engloba pesquisas de diferentes materiais e técnicas, onde ela vai os experimentando, sentindo, observando o diálogo das cores, formas e texturas. A composição final é um trabalho laborioso que demanda tempo, paciência e persistência. Nas palavras da artista:

“O meu trabalho é todo baseado em processo e esse processo é evolutivo sempre, (...) é um processo que introduz elementos, esses elementos criam uma reação em cadeia, essa reação em cadeia me mostra um outro lugar, esse outro lugar adiante, ele vai ser novamente alterado por uma nova inserção de novos elementos, novos processos...” (MILHAZES, 2013)


Beatriz Milhazes faz no máximo 10 quadros em um ano, passando de seis a sete horas por dia criando em seu ateliê (MORAES, 2019). Como citado anteriormente, o processo é um trabalho laborioso em que o tempo de gestação é vagaroso, permitindo demorar-se na imagem, no que ela provoca, na “reação em cadeia”. “Demorar-se” era outra palavrinha destacada no meu caderninho. Mas o que isso tem a ver com o isolamento e a quarentena?

Já estamos cansados de saber, ler e escutar que a quarentena nos cerceou de muitas maneiras e o quanto isso nos provocou e provoca angústias. Retornamos para a casa e, num ato consciente, sabemos que é na casa que devemos permanecer. Mas mesmo dentro desta, nós ainda continuamos acelerados, conectados constantemente com o “lugar” virtual como explanado no início. No entanto, se pararmos para escutar e ver as imagens correspondentes do cenário atual, ou seja, se demorarmos nessas imagens, como nos ensina a psicologia das obras de Beatriz Milhazes, assim como também temos essa máxima na psicologia arquetípica, nos depararemos com imagens relacionadas à desaceleração. Desaceleração pois não sabemos mais para onde estamos indo, não sabemos do amanhã e estamos tateando, experimentando lentamente o que poderá vir a ser. As cidades desaceleraram em seus movimentos e talvez tenhamos que desacelerar os nossos movimentos individuais também, principalmente, aqueles que vinham em uma corrida desenfreada. Aquele que se esforça por manter um ritmo constante igual ao que era antes está negando a realidade apresentada.

E foi assim que veio o insight da sincronicidade que, em meio a esse momento, felizmente, encontrei as anotações sobre Beatriz Milhazes. Penso que a construção de nós mesmo nesse momento difícil, pode vir como um processo lento, demorado, de fases (cada semana um estado de humor), de demorar-se, de digerir, de sentir, de observar coisas que não eram percebidas pela antiga agenda atribulada. Como disse Marcus Quintaes em uma de suas palestras, agora a movimentação é para dentro. E esse para dentro, na maioria das vezes, é amplamente desconfortável e angustiante. Estamos tão desenraizados desse dentro que podemos percebê-lo, de vez em quando, como a imagem de uma tela em branco. Beatriz Milhazes fala que tela em branco é um desafio e que muitas vezes a assusta. Isso também pode acontecer quando nos deparamos com esse olhar pra dentro. No entanto, sabemos que isso é apenas uma impressão equivocada. Existem muitos elementos internos embaraçados, muitos contraditórios, alguns não tão nobres, outros infantis, e por aí vai. Antes tais elementos eram projetados no mundo lá fora, escapulindo de nós e colando em diversos portadores. Agora sem achar esses portadores, os elementos se irrompem quando vemos as notícias, quando vemos os perfis de outras pessoas nas redes sociais e se irrompem pra nós mesmos quando estamos sozinhos, sem poder fugir para os lugares que costumávamos ir, desviando, dessa maneira, a atenção desses elementos. 

Portanto, se relermos a citação de Beatriz Milhazes descrita acima, constataremos que também faz sentido se pudermos transferir suas palavras para a dinâmica psicológica.                      

ATENÇÃO CONCENTRADA E SUSTENTADA

Uma outra observação no meu caderninho foi sobre a experiência da atenção. Como já vimos, Beatriz passa muitas horas debruçada na composição de uma obra, e para isso, é exigido uma atenção concentrada e sustentada no seu fazer. Voltando ao início do texto, já foi mencionado que nos encontramos enredados numa pluralidade de informações oferecida pela revolução tecnológica. E uma das características mais notória disso é a instantaneidade. No entanto já podemos perceber que pagamos um preço alto por isso. Ou seja, esta pluralidade de informações vai se atualizando (e até mesmo desatualizando) instantaneamente. Dessa forma, nada se fixa, pelo contrário, se dispersa facilmente, não cria vínculo e nem condição para se construir e permanecer em um processo. Nos distraímos facilmente com a quantidade e a velocidade de estímulos.

A respeito do nosso atual “apetite por informação”, cito Hillman, em seu texto “Intoxicação Hermética”, onde ele diz vivermos uma hipertrofia de Hermes, sendo este o deus mensageiro, e que por isso gera uma troca interminável de informações:

 “A palavra 'informação' tornou-se tão inflacionada que carrega o código da identidade e o destino do DNA de um indivíduo. Não a sabedoria, não o conhecimento, nem inspiração, aprendizado, conforto, verdade, profecia, valor moral ou beleza estética. Em vez de mensageiro dos deuses, Hermes tornou-se servo da Internet. (...)” (HILLMAN, 2007, P. 3)

O que Hillman quer dizer é que existe, atualmente, uma supremacia do deus Hermes. Além de ser o mensageiro (psicopompo) dos deuses, ele também é o deus dos viajantes, e por isso uma de suas caraterísticas é não ter morada, ou seja, ele sempre está em movimento, não se fixando em nenhum lugar.  É fugaz, assim como a natureza do campo virtual.

Voltando a Beatriz Milhazes, quando nos referimos ao construir e permanecer em um processo, é importante termos a questão da atenção concentrada e sustentada. Isso exige muito de nós e podemos perceber o quanto isso se atesta uma dificuldade contemporânea, em que fica mais evidenciada nessa situação de ter que ficar em casa. Assim, nos percebemos ansiosos, alguns entediados e outros tentando se manter ocupados com o que está em sua frente. No entanto, a atenção concentrada e sustentada nos impele ao “ficar”, seja ficar num desconforto, seja numa sensação, seja num processo criativo, ou até mesmo e talvez o mais importante, ficar no silêncio da nós mesmos.   

No mesmo texto de Hillman citado acima, ele afirma que o que pode amenizar essa hipertrofia de Hermes é a deusa Héstia, que traz como um dos seus elementos o foco:

“Em outras palavras, primeiro devemos ter foco, em casa com nós mesmos, no presente aqui e agora. O foco, nossa palavra em inglês para a atenção concentrada, o interesse que aquece toda vida que vem para dentro do seu perímetro, origina-se da palavra latina para lareira. E a lareira era Héstia. O lugar onde o fogo doméstico brilhava era Héstia. Este Foco não era seu símbolo, era a própria Héstia.” (HILLMAN, 2007, P. 6)

“Se Hermes traz possibilidades à mente, Héstia as centraliza e fornece foco.” (p. 7). Aqui podemos vislumbrar a arte de Beatriz Milhazes em uma perspectiva mitológica. Ou seja, Hermes traz todos os elementos materiais e técnicas, mas isso só se concretiza e se realiza com o foco de Héstia.

Héstia nos permite um foco na interioridade, na nossa lareira interior, dentro das nossas casas: a exterior e a interior. A quarentena, portanto, também dialoga com Héstia.

Dessa maneira, a partir desses três pontos principais que vislumbrei no belo das obras de Beatriz Milhazes: a manufatura/o processo, o demorar-se e a atenção sustentada e concentrada, pude dar um significado mais profundo a essa experiência de incertezas, tristezas e angústias. A quarentena e a pandemia estão longe de ser uma experiência agradável, porém a Arte sempre está nos espreitando quando estamos no escuro. Ela sempre se mostrará como um bálsamo para os males do mundo.
  

Referências:

MORAES, E. Grandes artistas na prática da arteterapia: Beatriz Milhazes. Blog Não Palavra. Rio de Janeiro, 29/07/2019. https://nao-palavra.blogspot.com/se/arch?q=beatriz . Acesso 04/06/2020

 Beatriz Milhazes no MNBA. Rio de Janeiro, 15/05/2018. https://www.youtube.com/watch?v=uX9Jacuubbw&t=2262s Acesso 01/06/2020

HILLMAN, James. Intoxicação Hermética. In.:_________. Mythic figures: Uniform edition of the writings of James Hillman. 1st ed. Spring publications, 2007.


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Sobre a autora: Laila Alves de Souza


Psicóloga
Pós- graduada em psicologia clínica na abordagem da Psicologia Analítica.

Atendimentos clínicos pela abordagem da Psicologia Analítica no Rio de Janeiro.

segunda-feira, 8 de junho de 2020

VIVENCIANDO NOSSOS LIMITES COM ARTE, NA ARTE DE VIVER


Por Lidia Lacava - SP
lidialacava@gmail.com


Ao participar da palestra de Eliana Moraes – OS LIMITES E A CRIATIVIDADE – abri uma janela em minha memória que me fez recordar momentos em que ouvi ressoar palavras como: SIM... NÃO... PODE... NÃO PODE...! Essas palavras são apresentadas ao ser humano desde o momento de seu nascimento. A infância deixa marcas de várias situações em que tais mensagens nos eram ditas de maneira ríspida, doce, assertiva ou duvidosa. Sim, porque o limite pode vir de maneira duvidosa: “Será que realmente não poderá fazer? Mas... e se...?” O perfil daquele que dá o limite e do outro que o recebe varia muito, conforme as circunstâncias e os sujeitos.

Nesse passeio pelas fases da vida, deparo-me com uma leitura feita há tempos que falava sobre as três dimensões educacionais do “limite”, em uma obra de Yves de La Taille (2000), emérito professor do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo. Um dos significados da palavra “limite”, conforme explana esse professor, situa-se nas questões normativas onde se coloca o que é permitido e o que é proibido para o bem coletivo, como o direito à vida, à educação, à saúde, ao trabalho. O princípio da isonomia é que caracteriza esse limite (embora saibamos que não é bem assim...).

Outro significado dado à palavra consiste na expressão “impor limites” quando se tem como alvo preservar a própria vida ou a intimidade da pessoa. Toca-se, neste caso, nas fronteiras daquilo que o sujeito deseja preservar: sua vida física, íntima, sua privacidade, seus valores, acertos ou desacertos.

Já o terceiro está relacionado à expressão “transpor limites” – esta carrega, junto a si, a ideia de maturidade e excelência. Busca-se ser melhor do que se é! Busca-se ir além, inovar, exercitar todo o potencial criador existente no sujeito, que se realiza por meio dos processos criativos que, nas próprias palavras de Fayga Ostrower, “está vinculado a uma série de ordenações e compromissos internos e externos” (2002, p.26).

É exatamente com este último sentido que percebo como a Arteterapia pode contribuir para que, neste momento repleto de desafios e de incertezas que estamos vivendo, consigamos ir além... muito além no sentido de buscar algo de novo, novas possibilidades em um tempo que se apresenta “estranho” e em um espaço externo/físico pequeno (nossa casa), que ampliou nosso espaço interno/existencial (nossas moradas internas).

Estamos aprendendo a viver polaridades, a viver o diferente, o que Edgar Morin (2000) traz, como uma das bases de sua pesquisa, o pensamento “complexo” – este termo, originário do latim complectere = significa aquilo que é tecido em conjunto. Assim, todas as características que atuam no ser humano, sentimentos e posturas, embora contraditórios e opostos, convivem não de maneira excludente, mas integradora. Homem sábio e louco; trabalhador e lúdico; prosaico e poético; aquele que experencia concretamente ou por meio do imaginário.

É dialogando essas polaridades que o homem deve fazer uso de sua imaginação, liberdade, criticidade e criatividade para se reinventar, para resgatar de dentro de si recursos internos de fé, coragem, destemor vivenciando a impermanência, isto é, a certeza de que tudo está em constante mudança.

Neste sentido, o arteterapeuta, ao entrar em contato com seus limites, exercita a característica do “transpor seus próprios limites” – transpor aquilo que permitirá que ele se renove, se reinvente, busque novas possibilidades para sua atuação profissional clínica e institucional. E, além disso, ele atua em muitas outras paragens, ao trazer para a realidade tudo o que alimenta o lado sensível, poético, lúdico e imaginativo do ser humano. Ele é o grande artista na arte do viver e reverbera todo seu conhecimento, sua sensibilidade, seu fazer aliado à criatividade para todos aqueles que estão à sua volta.

Convido Fayga Ostrower para, com sua reflexão, ampliar nosso pensar:

O potencial criador elabora-se nos múltiplos níveis do ser sensívelcultural-consciente do homem e se faz presente nos múltiplos caminhos em que o homem procura captar e configurar as realidades da vida. Os caminhos podem cristalizar-se e as vivências podem integrar-se em formas de comunicação, em ordenações concluídas, mas a criatividade como potência se refaz sempre. A produtividade do homem, em vez de se esgotar, liberando-se, se amplia (2002, p. 27).

É exatamente essa potência do criar que traz uma das marcas do ser arteterapeuta. Criar para ser, liberdade para existir de maneira mais coerente, integradora e realizadora. Criar raízes e asas – rever o passado para impulsionar o presente e poder voar, livremente, para aquilo que faz sentido no seu existir, sem deixar ficar no vazio as características do pertencimento que o enraíza em seu mundo pessoal e particular.

Quando falo em processos de criatividade, compartilho com vocês um dos conceitos da Gestalt-terapia que é o de “ajustamento criativo”. Para defini-lo trago as palavras de Beatriz Cardella em um de seus artigos da coleção Gestaltterapia (vol.2, 2014):

Ajustamento criativo é então a capacidade de pessoalizar, subjetivar e se apropriar das experiências que acontecem no encontro com a alteridade, processo contínuo no campo organismo/meio (2014, p.114).

Considero esse conceito uma das propostas da Gestalt-terapia que traz, em seu cerne, a possibilidade incessante de o ser humano tornar-se efetivamente “quem ele é” – a busca constante do “ser-si-mesmo” mediada pelo poder de criação. Neste sentido, a transposição de limites para exercitar a criatividade surge como algo que é urgente, que exige ser anunciado. Quando se fala em “ajustamento criativo” em um processo terapêutico, pontua-se a grande transformação daquilo que deverá ser transformado, desvelado como algo inovador e integrador na existência do sujeito.

Trazer esse conceito para a Arteterapia enriquece-a de maneira significativa, pois somente a Arte, em suas enormes variáveis, conseguirá evocar e desvelar no Homem a sua verdadeira essência. Somente ela dará coragem e fé para que o impulso da transformação aconteça.

Entendo que quando se fala de relação – “eu x tu / eu x isso” (Martin Bubber), deve-se pensar também no aqui-e-agora como um continuum, isto é, como um perdurar-se no momento presente, podendo “dar um tempo” para que o sentido maior da experiência aflore. Saber ajustar, discriminar o “para quê” de determinada situação, para depois poder ressignificá-la e integrá-la criativamente na própria existência.

O “ajustar”, como “ação de integrar(-se)”, traz a ideia de duas ou mais coisas que se amoldam, de sentimentos opostos que poderão fazer parte do sujeito, mas de maneira que se completem, conferindo e dando autoria a toda capacidade de subjetivar o “existir”. Busca-se um todo mais coerente e consciente, não deixando de validar medos e desafios que possam acontecer sempre.

Vivenciamos momentos de abertura, de ultrapassar limites, de entrega e aceitação que podem conferir ao “aqui-agora” das nossas relações, uma outra qualidade de vida, nos permitindo vislumbrar novas possibilidades de transformar-a-ação.

E a Arteterapia, nesse sentido, é generosa, pois ela chega devagarinho, aceitando o outro como é possível ele vir, buscando sempre, através de experimentos mediados pela tinta, colagem, argila, escrita poética, música e outros recursos facilitar o mergulho e o diálogo com os personagens que habitam as várias moradas interna de cada ser humano.

Encerro essa reflexão trazendo um pensamento de Ponciano Ribeiro, um dos grandes representantes da Gestalt-terapia atual, que enfatiza:

A pessoa humana é uma manifestação, é uma explicitação do mistério e da força do mundo presentes nele e, ao mesmo tempo, em que estar incluído no mundo limita sua liberdade, torna-o partícipe dessa força gigantesca que movimenta o Universo, fazendo a liberdade humana, ainda que limitada, infinitamente grande, como uma potencialidade eternamente disponível para entrar em ação (RIBEIRO, 2011 apud CARDELLA, 2014, p. 86).

Assim... quando o arteterapeuta se compromete a entrar em contato com seus próprios limites, certamente irá transpô-los com Arte na majestosa e desafiadora Arte de Viver.

REFERÊNCIAS:
CARDELLA, B.H.P. Artigo - Ajustamento criativo e hierarquia de valores ou necessidades, in FRAZÃO,L.M. & FUKUMITSU, K.O. Gestalt-terapia – conceitos fundamentais. Vol. 02. São Paulo: Editora Summus, 2014.
LA TAILLE, Y. DE. Limites: três dimensões educacionais. São Paulo: Ed. Ática 2000.
MORIN, E. Os sete saberes necessários à educação do futuro. São Paulo: Ed. Cortez, 2000.
OSTROWER, F. Criatividade e Processos de Criação. Petrópolis: Ed. Vozes, 2002.

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Sobre a autora: Lidia Lacava



Caminho pelas trilhas da saúde e educação buscando o “ser criativo” e “transformador” que existe dentro de cada um de nós! Desafiador e valioso!!!


Com formação em Letras (Usp) e Direito (Puc) percebo que dar aulas em cursos de Pós-graduação em Psicopedagogia e Arteterapia é dar vez e voz ao que minha alma pede!

Várias formações me guiam nessa caminhada: Especialização em Psicopedagogia e Arteterapia (Instituto Sedes Sapientiae); Psicomotricidade (Instituto Pieron); Arte-reabilitação (AACD). Psicologia Analítica (Unicamp). Gestalt-terapia (Instituto de Gestalt).

Fiz Mestrado em Educação, Arte e História da Cultura (Mackenzie) buscando integrar Educação e Arte – esses estudos se transformaram em um livro: “Eros e Psiquê – um caminho possível para pensar a docência.” Tenho artigos publicados em outros livros e revistas. A palavra falada ou escrita aliada à arte, organiza meu pensar!

Amplio esses fazeres no AION - Espaço do Encontro, situado em Itu, e é nele que acontecem os “grandes encontros”!

Individualmente ou em grupo, os atendimentos e oficinas com grupos diversificados, se propõem a ser um lugar/espaço para alimentarmos nosso ser-criança, nosso ser-adulto, nosso ser em constante vir-a-ser... atemporal!!!

Você sempre será bem-vindo... aguardo sua presença!