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segunda-feira, 10 de julho de 2017

ATENDIMENTO INFANTIL: UMA PONTE ENTRE A ARTETERAPIA E A PEDAGOGIA



Por Renata Fajoli - SP
email: fajolirenata@gmail.com
facebook: www.facebook.com/refajoli


Há um tempo decidi mudar meu foco de atuação e me vi diante de um grande desafio: ressignificar a Pedagogia (minha área de graduação) e uni-la a Arteterapia, buscando um novo propósito de trabalho nesses dois campos tão fecundos de ricas experiências.
Animada, me deparei com a possibilidade da transdisciplinaridade, ideia que foi clareando a partir de Rodrigues (2015 p. 91).

[...] O chamado do nosso tempo é para cuidar da vida e transdisciplinar e colaborativo, para além das individualidades, de cercas, muros, fronteiras ou divisas, por via do respeito, do amor e da soma dos conhecimentos e experiências e essencialmente acompanhando as pessoas na vida, e não os seus diagnósticos.  

A necessidade de um novo olhar sobre infância e tudo o que envolve essa fase da vida logo surgiu: a beleza de perceber e conceber o indivíduo como um ser integral que no processo de aprendizagem e desenvolvimento está por inteiro, corpo, alma e mente.
            E foi justamente nesse ponto, que para mim, essas duas áreas de conhecimento conversaram e se complementaram, permitindo que eu encontrasse a linha que norteou a reflexão acerca da minha atuação.
            A Arteterapia considera a integralidade do ser e através das diversas experiências com os materiais expressivos, o indivíduo vai tomando contato com partes suas, integrando em si aspectos muitas vezes presentes (mas até então desconhecidos), conforme cita Urrutigaray (2011, p.20) “A experiência do trabalho com Arteterapia proporciona a possibilidade de reconstrução e de integração de uma personalidade...”
Nesse caminho para a ponte com a Pedagogia, encontrei Céline Lorthiois que traz contribuições significativas para essa área do conhecimento. Ela concebe a Pedagogia Profunda, que se apoia na Teoria de Carl Gustav Jung, fundador da Psicologia Profunda ou Psicologia Analítica.
            Lorthiois define assim sua visão pedagógica:

A Pedagogia Profunda/Pedagogia Junguiana abrange a criança na sua totalidade, considerando seu corpo, sua mente, sua capacidade criadora, seus sonhos, sua alma: no âmbito desta Pedagogia, o currículo é a vida.” (http://www.pedagogiaprofunda.com/projects/pedagogia-profunda-–-cursos/). 

            A proposta da Pedagogia Profunda inclui “... técnicas artesanais, trabalhos manuais, técnicas de relaxamento, danças circulares, histórias, sonhos, e a natureza com seus quatro elementos, sobre o pano de fundo da teoria junguiana...” (Lorthiois, 2016 p. 225)
Identificada com essa proposta e junto as múltiplas possibilidades da Arteterapia, volto-me para o atendimento infantil.

O trabalho arteterapêutico considera os anseios e expectativas que a criança traz para a sessão e os materiais tornam-se potências que ajudam a aflorar aquilo que ela já possui, a criatividade.
No setting, a criança é livre para escolher o material e a expressão artística que deseja trabalhar, conhecer e explorar. Nessa escolha, há uma entrega de um desejo íntimo, uma espécie de entusiasmo pelo novo e emoção de tomar parte com o desconhecido.
Percebe-se então, uma união quase íntima da criança x material x desejo, que são ingredientes para uma alquimia à olhos vistos. Não há receio de uma experimentação, está aberta ao novo, àquilo que emergirá, encontra-se totalmente envolvida no processo e com ele se identifica, se emociona e se transforma.
Observa-se de uma maneira interessante e deslumbrante o desenrolar desse trabalho, a forma como ela é capaz de, através da escolha do material, atender internamente suas próprias exigências e necessidades, gerando impactos de uma experiência e aprendizado integral, que envolve o cognitivo mas também o corpo, a alma e a mente.
A criança passeia entre as possibilidades oferecidas e ela mesma vai classificando a importância de cada atividade, significando o que quer fazer, sugerindo transformações, modificando e invertendo o sentido e até mesmo a funcionalidade de cada material ou objeto que toma contato.
Como se olhasse mesmo para dentro de si, verificando o que lá acontece e escolhendo aquilo que pra ela, naquele determinado momento irá caber, preencher, fazer sentido, organizar, trazer uma reflexão interna e assim produzir uma fecunda elaboração.
É portanto, nessa dança e nesse envolvimento, na observação do fazer e das produções, no processo e ao longo de um período, que é possível a elaboração/síntese simbólica e lúdica de quem a acompanha.
Nesse processo arteterapêutico pedagógico, a criança simplesmente faz sem a pretensão de significar objetivamente a sua produção, a não ser por ela mesma, porque muitas vezes o significado está contido no processo.
Interessante perceber que muitas vezes ao finalizar um trabalho, ela quer a impermanência do mesmo, ou seja, destruir, rabiscar, colar, jogar fora, desmanchar ou simplesmente abandonar e descartar sua produção e quando isso acontece, o que fez sentido foi o processo, o momento, a construção, o fazer ou seja, a experimentação.
Além disso, muitas vezes essas atividades não tem um desfecho final, é um projeto inacabado, um desenho incompleto que basta por si só. Esse inacabado para nós, pode ser uma obra completa para ela.
Faço então um elo ou uma ponte com a Pedagogia, pois que o aprender, o fluir da aprendizagem é esse processo que não está acabado, que permite possibilidades e experimentações, até que se encontre internamente onde essa nova experiência caiba, se assente e faça sentido.
Por isso é importante esse olhar de compreensão nesse universo infantil do inacabado, de construção e desconstrução constante, pois reflete o mundo interno, reflete o universo da criança.
Esse ambiente de experimentação da Arteterapia, também é o universo da Pedagogia que leva em conta o ser integral, onde há espaço para o surgimento de novas potencialidades, novos saberes até então inexplorados e descobertas de habilidades fantásticas desconhecidas ou não exploradas pela própria criança.
Desse modo, não é incomum que queixas escolares como dificuldade aprendizagem, relacionamento e comportamento não se apresentem durante as sessões, além de contradizê-las, e isso é possível porque foi permitido a ela adentrar num universo de possibilidades, revelar a sua alma.
E assim, se sentindo acolhida e identificada num lugar seguro de realizações sem julgamentos, mas sim das possibilidades, podendo ser quem realmente é e acessando a sua essência genuína, consegue lidar com as dificuldades apresentadas no dia-a-dia, melhorando sua autoestima, se autoconhecendo, se alegrando com suas conquistas e fazeres.
... Ao ser possível integrar, pela atuação consciente, o resultado do criado com a temática emocional oculta na representação apresentada, o sujeito adquire a condição de transcender suas vivências imediatas, experimentando novos sentimentos e disponibilizando-se para novas oportunidades. (URRUTIGARAY, 2011 p. 20) 

Lorthiois (2016 p. 225) poeticamente vai dizer que:

Numa época em que a criança e a educação estão cada vez mais cercadas e amparadas pelos recursos da tecnologia [...] a criança afirma a sua infância em parceria com uma natureza que a alimenta e que sabe compensar o estilo de vida, geralmente esgotante, que lhe é imposto hoje. E mesmo em meio à cidade grande, conseguimos descobrir seus numerosos esconderijos. 

            E para isso, é preciso do profissional que a acompanha um olhar atento, sensível e acolhedor.
... ser capaz de apreciar um toque de criança ou a elaboração de um trabalho espontâneo com a matéria; significa também ser capaz de atentar para a história de que um aluno está representado por intermédio de suas atividades, quiçá de compreendê-la como se fosse um sonho. (LORTHIOIS, 2016 p. 226)


Caso você tenha se identificado com a proposta do “Não palavra abre as portas” e se sinta motivado a aceitar o nosso convite, escreva para naopalavra@gmail.com

Assim poderemos iniciar nosso contato para maiores esclarecimentos quanto à proposta, ao formato do texto e quem sabe para um amadurecimento da sua ideia.


A Equipe Não Palavra te aguarda!            

Referências bibliográficas:
LORTHIOIS, Marie Céline G. R. F. Exercícios de Pedagogia Profunda: Uma inclusão da alma na educação. São Paulo: [s.n.], 2016.

RODRIGUES, Valéria Elisabete. Imagens e História em Arte Terapia: Experiências nas interfaces da psicologia, da educação e da arte. 2015. 174 p. Dissertação de Mestrado de Pós-Graduação em Artes – Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista – UNESP. São Paulo, 2015
URRUTIGARAY, Maria Cristina. Arteterapia: A transformação pessoal pelas imagens. 5. ed. Rio de Janeiro: Wak Editora, 2011
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Sobre a autora: Renata Fajoli


Formação: Pedagogia pela PUC/SP e pós-graduada em Arteterapia e Expressões Criativas pelo IJEP.     

Área de atuação/projetos e trabalhos:

Arteterapeuta e Pedagoga, realiza atendimentos individuais de crianças, jovens e adultos. É facilitadora de oficinas e workshops para grupos de pais, professores e demais interessados. Atuou por mais de 10 anos na Educação da rede pública da Prefeitura de São Paulo com crianças e adolescentes. Artista mandaleira e entusiasta de práticas integrativas aplicada à educação formal e não formal.                                                   

5 comentários:

  1. Parabéns, Renata Fajoli! Que belo texto; articulado e conectando com a pedagogia, arteterapia e ate a psicopedagogia de maneira tão harmoniosa e organizada. QUe a arte nos possibilite ampliar nossa visão do universo infantil e perceber que na Arteterapia a multiplicidade é muito bem vinda e sempre fará parte da essência da profissão.

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  2. Parabéns, essa proposta me tocou profundamente.Sou pedagoga e no momento estou com planos de mudar a minha prática, o meu foco...Tenho TAG( transtorno de ansiedade generalizada) e encontrei no tear, no tecer uma nova alegria de viver, porém quero muito mais, então comecei a ler sobre arteterapia ...e lendo sobre a pedagogia profunda citada no texto e a arteterapia, me encontrei. Existe cursos a distância? Como proceder? Grata!

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