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segunda-feira, 31 de julho de 2017

A UTILIZAÇÃO DA CAIXA DE AREIA NA ARTETERAPIA



Por Janaína de Almeida Sérvulo - MG
janainaservulo@gmail.com


A suíça Dora Kalff (1904-1990) é considerada a criadora da técnica terapêutica conhecida como Sandplay, ou Terapia do Jogo de Areia.  Essa técnica foi baseada no trabalho da psiquiatra inglesa Margaret Lowenfeld (1890-1973), denominado World Technique, ou Técnica do Mundo. Para desenvolver seu método, Dora Kalff agregou a este trabalho conhecimentos da Psicologia Analítica Junguiana, aliados à sua prática clínica com crianças. 

O jogo de areia é um método não verbal, não racional e criativo, que consiste na construção de cenários em uma caixa de areia, utilizando miniaturas. No método original, a caixa é padronizada e não são realizadas modificações, interpretações ou verbalizações sobre o cenário construído. Meu objetivo, no entanto, é apresentar a caixa de areia como uma das técnicas a serem utilizadas no processo arteterapêutico, enquanto mais uma possibilidade expressiva antes da elaboração verbal. 

Esta proposta se mostra bastante adequada para auxiliar pessoas que se apresentam inicialmente inibidas diante dos materiais plásticos. Quando isso acontece, ou quando já foram utilizados vários materiais e as técnicas se mostram repetitivas, a construção de um cenário na caixa de areia pode ser um ótimo estímulo para a pessoa se expressar. Uma outra vantagem é que a caixa contendo areia (que é, por si só,  terapêutica) funciona como um limite, um espaço seguro, onde os conteúdos expressos estão protegidos. Sem falar das miniaturas, que representam objetos, pessoas e lugares do mundo real ou imaginário, facilitando a materialização de angústias, temores e conflitos internos. Na prática, são diversos os exemplos de como essa técnica pode trazer elementos importantes do inconsciente, facilitando sua integração à consciência. 

Recentemente, acompanhei um pré-adolescente com quadro de medo e insegurança. Quando o convidei a se expressar na caixa de areia, escolheu personagens como bruxas e monstros para personificar seu medo. Posicionou-os e teve dificuldade de encará-los, pois suas expressões realmente o assustavam. Então, pedi que ele criasse uma outra cena, de forma que pudesse se sentir mais seguro.  E assim foram surgindo os heróis, com sua força e coragem; o mago, com sua sabedoria; uma fada e um anjo, que, com sua delicadeza e esperteza, enfrentaram os seres assustadores. Dessa forma, conseguiu se aproximar e pôde, concretamente, derrotá-los. A expressão no seu rosto, um misto de cansaço e alívio, mostrava que a luta contra os medos não havia terminado, mas uma batalha importante fora vencida. 


Outro caso interessante é de uma criança de cinco anos com sintomas de agressividade a partir da separação dos pais. Desde o início do processo, sempre representava uma cena de casamento. Até que um dia, ela desenhou “o cabelo da noiva”, de forma que lembrava claramente um olho a observar do centro de um labirinto. Percebeu a semelhança e aceitou a proposta de materializá-lo. Construímos juntas (a seu pedido), modelando a areia e criando passagens e impedimentos. “Tem que ter flores!” E, de repente, o labirinto estava todo enfeitado... “Não vou conseguir sozinha.” E então surgiram os pais... Sentiu falta de outras pessoas conhecidas e, ainda não satisfeita, acrescentou três princesas, posicionando-as, estrategicamente, para orientar o caminho. No final, encontrou a saída e comemorou, com as outras crianças, a descoberta do grande tesouro. De repente, disse: “eu queria meus pais aqui”.  Mas logo voltou a comemorar, já começando a compreender, mesmo tão pequena, que existem desafios que precisamos enfrentar sozinhos. 


Da mesma forma, a técnica é também bastante resolutiva com adultos e idosos. Depois de algumas sessões trazendo queixas e conflitos familiares, uma idosa começou a se dar conta de um intenso sentimento de solidão. Representou uma cena no deserto, identificando-se com uma árvore deixada de lado depois de ter dado seus frutos. Algumas sessões mais tarde, e depois de ter trabalhado a sua árvore interna, o cenário já era outro: representava o desejo de uma vida simples ao lado daqueles que ama. Apesar de continuar se sentindo sozinha, as cores, os personagens e a maneira como estavam dispostos mostravam vitalidade e movimento, o que não se via na cena do deserto, quando o que mais chamava atenção era a imobilidade diante de uma ameaça.

E assim, cada uma dessas pessoas teve a oportunidade de criar cenas imaginárias onde, aos poucos, foram se apresentando, trazendo seus conflitos, angústias, identificações e medos, materializando e reconstruindo os fragmentos de um inconsciente que se tornava cada vez mais claro, palpável e possível de ser integrado à consciência. Sonhos, decepções, confrontos... saindo de dentro, do mais íntimo do ser, para uma caixa mágica que aceita tudo, mas também limita, protege e transforma!


Caso você tenha se identificado com a proposta do “Não palavra abre as portas” e se sinta motivado a aceitar o nosso convite, escreva para naopalavra@gmail.com
Assim poderemos iniciar nosso contato para maiores esclarecimentos quanto à proposta, ao formato do texto e quem sabe para um amadurecimento da sua ideia.
A Equipe Não Palavra te aguarda!


Referências Bibliográficas:


CRUZ, Maria do Carmo Cordeiro; FIALHO, Maria Teresa. A caixa de areia: técnica projectiva e método terapêutico. Análise Psicológica (1998), 2 (XVI): 231-241. Disponível em: http://www.scielo.mec.pt/pdf/aps/v16n2/v16n2a02.pdf

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Sobre a autora: Janaína de Almeida Sérvulo



Graduada em Psicologia pela UFMG, com especialização em Arteterapia pela FAVI, em convênio com o INTEGRARTE.
Atua como psicóloga e arteterapeuta em clínica particular em Belo Horizonte-MG e na rede pública da região metropolitana. Experiência de mais de 15 anos com atendimento individual e em grupo a crianças, adolescentes e adultos.
Para conhecer mais sobre seu trabalho, visite a página do facebook: @artisticamente7

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4 comentários:

  1. Ola, Janaina! Parabéns pelo trabalho! Fiquei muito animada com a "Caixa de Areia", principalmente pela sua exposição da tecnica! Muito bom mesmo! Seu relato foi enriquecedor e para mim, muito inspirador ! Sucesso !

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  2. Parabéns pela objetividade. Texto claro. Sim; a caixa de areia como uma ferramenta a mais - muito bem-vinda!

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