“pois fica um pouco mais difícil para alguém negar aquilo que
acabou de fazer, bem como de perceber o quanto se posiciona... As
possibilidades de se perceber nas suas dificuldades, dadas as imposições
deferidas pelo próprio uso dos materiais plásticos, confere ao usuário as
noções de limitação, aceitação e humildade diante de suas dificuldades,
tornando-o mais humano, mais próximo de si mesmo e dos demais.” (URRUTIGARAY)
Há algum tempo escrevi um texto
chamado “Susto” para este blog falando sobre o potencial que a arteterapia
possui de convocar conteúdos desprezados por repressão ou resistência do
paciente. Na terapia verbal o terapeuta pode sinalizar ou sublinhar algum
conteúdo, na tentativa de chamar a atenção do paciente para determinada questão.
Mas em arteterapia, ao materializar por si mesmo sua fala em imagens, muitas
vezes o paciente se vê em um confronto consigo mesmo.
Porém, embora esta dinâmica seja
muito comum, é possível que ela não ocorra. Sim, é possível que o paciente
negue aquilo que acabou de criar. E nos
últimos tempos tenho refletido bastante sobre a resistência na arteterapia.
Em minha prática tenho percebido que
os pacientes podem não reconhecer algum conteúdo expressado, contradizer o que
dizem por imagem e o que dizem em palavras, refutar qualquer tipo de
interpretação do terapeuta... E isto não é tão raro de acontecer.
Creio que o arteterapeuta precisa pensar-se quanto a
responsabilidade pelo instrumento que tem nas mãos. Que mesmo sendo um
profissional apto a fazer uma leitura das imagens e capaz de levantar hipóteses
para o processo terapêutico, não coloque-se em posição de poder, como aquele
que pode interpretar e devolver para o paciente o seu próprio olhar. Isto
significa atropelar todo o processo terapêutico, não respeitando o ritmo do
paciente e “fazendo o trabalho” para ele.
Relendo o texto “Susto”, ratifico o
que escrevi na época, pois se o paciente resiste é porque ele não pode fazer
diferente neste momento, ele está se defendendo de algo que o é dolorido:
“... mesmo com este confronto
‘físico’, o paciente ainda sim recusa-se a encarar os conteúdos, deixando-os
permanecerem inconscientes e em uma atuação ‘irresponsável’. Se isto acontece,
o terapeuta deve respeitar este limite do paciente pois se ele não o reconhece,
não é por acaso, e tem direito a ter seu tempo próprio.” (MORAES)
No final do texto Repetir, Recordar
e Elaborar, Freud relata de médicos principiantes na psicanálise que vinham
pedir conselhos à ele sobre casos em que
eles haviam apontado a resistência ao paciente
e mudança alguma teria acontecido. Na verdade “a resistência tornou-se
ainda mais forte e toda a situação ficou mais obscura do que nunca”. Por fim
ele conclui que:
“O médico nada mais tem a fazer
senão esperar e deixar as coisas seguirem seu curso, que não pode ser evitado
nem continuamente apressado.”
“Esta elaboração das resistências
pode, na prática, revelar-se uma tarefa árdua para o sujeito em análise e uma
prova de paciência para o analista. Todavia, trata-se do trabalho que efetua as
maiores mudanças no paciente...” (FREUD)
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
MORAES, Eliana. Susto.
Blog “Não Palavra: Pensando a Arteterapia”. Disponível em: http://nao-palavra.blogspot.com.br/2013/09/susto.html
FREUD, Sigmund. Recordar,
repetir e elaborar. Obras Completas, 1914.
URRUTIGARAY, Maria Cristina. Arteterapia: a transformação pessoal pelas
imagens. Ed Wak. Rio de Janeiro, RJ.
2011.
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