Há duas semanas escrevi um texto
chamado “Repetição Criativa”, ao qual abordava a repetição verbal, quando um
paciente se percebia falando repetidamente sobre sua questão. Mas hoje eu
gostaria de falar do “Repetir” de outra forma.
Estive estudando o texto de Freud “Repetir, Recordar e Elaborar” de 1914. Meu
interesse se deu pelo fato de estar intrigada com os conceitos de atuação e repetição, ao observar alguns pacientes. Nas palavras de Freud:
“... podemos dizer que o paciente
não recorda coisa alguma do que esqueceu e reprimiu, mas expressa-o pela atuação
ou atua-o (acts it out). Ele reproduz não como lembrança, mas como ação;
repete-o, sem, naturalmente, saber o que está repetindo.”
“Enquanto o paciente se acha em
tratamento, não pode fugir a esta compulsão à repetição; e. no final,
compreendemos que esta é a sua maneira de recordar.”
“Podemos perguntar o que ele de fato
repete ou atua (acts out). A resposta é que repete tudo o que já avançou a
partir das fontes do reprimido para sua personalidade manifesta – suas
inibições, suas atitudes inúteis e seus traços patológicos de caráter. Repete
também todos seus sintomas, no percurso do tratamento.”
Ao longo do processo terapêutico ou em cada sessão
podemos observar pequenas atitudes – atuações
– de pacientes que, estando o terapeuta atento pode entender como repetições de suas dinâmicas, que ele
não se percebe, ou não recorda senão apenas em forma de ações. Exemplos
clássicos como sua forma de lidar com o compromisso na terapia (pontualidade,
assiduidade, pagamento), como se posiciona perante o terapeuta... Ou ainda as
repetições em sua história de vida, seus sintomas físicos, episódios
repetitivos, sensações frequentes, e muitas outros.
Freud continua o texto defendendo
pela teoria da psicanálise, que o instrumento principal do processo analítico
para trabalhar este fenômeno reside no manejo da transferência. Entretanto, me
motivei a escrever este texto ao perceber na minha prática como arteterapeuta,
que vejo o Ato Criativo também como uma atuação
e consequentemente é por definição uma repetição
dos padrões de comportamento.
Quando o paciente tem dificuldade de
iniciar um trabalho, quando este trabalho fica vazio ou cheio, demasiadamente
organizado ou desorganizado, com cores intensas ou cores pastéis, se se debruça
sobre ele ou o executa de forma rasa, seus movimentos corporais, ou até mesmo
quando projeta em mim como terapeuta alguma sensação em meio à sua criação (ver
texto “A transferência e Arteterapia”), são apenas algumas das maneiras do
paciente atuar no ato criativo.
Enfim tenho visto que a arteterapia é uma técnica
bastante propícia para que estas repetições se presentifiquem durante o
processo terapêutico. A arteterapeuta Maria Cristina Urrutigaray também defende
esta ideia em seu livro*. Em suas palavras:
“... atuação autônoma atualizada em
comportamentos... encontram na arteterapia um continente adequado à sua
manifestação.” (pag 79)
“A materialização, proporcionada pelas
formas surgidas, propicia o confronto com realidades subjetivas não
conscientizadas, apesar de atuadas nos comportamentos emitidos.” (pag 83)
* "Arteterapia - A transformação pessoal pelas imagens"
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